Na internet, desafio é furar a bolha.
(Emais, 22/02/2018 – acesse no site de origem)
Ser feminista é, a rigor, acreditar que homens e mulheres devem ter direitos iguais. Daí surgem várias derivações tão diversas quanto as mulheres, mas até onde eu sei é disso que estamos falando no fim do dia: de sermos consideradas tão cidadãs e merecedoras de direitos como os homens brancos, cisgênero e heterossexuais o são.
Lutar para ser esse o valor preponderante em uma sociedade estruturalmente desigual não é fácil. Nós, feministas, por mais diferentes que sejamos, sabemos disso desde sempre. Temos plena consciência de que tornar o mundo (o país, a cidade, o bairro) um lugar mais justo é luta, é processo, é mudança de cultura que não vem de mão beijada. E mesmo assim, seguimos lutando em nome dessa tão sonhada igualdade.
E como apanhamos por fazer isso. Literalmente, já que somos rotineiramente violentadas institucional, psicológica ou fisicamente por defendermos a igualdade entre os gêneros. Somos estupradas, ameaçadas e mortas por isso, como os números já cansaram de mostrar. E ainda assim seguimos porque temos um motivo muito claro para lutar: nossas próprias vidas e cidadanias.
A bem da verdade, estamos em um momento privilegiado da luta, já que as redes sociais fizeram multiplicar as redes de apoio, solidariedade e denúncia das violências, além de abrir muito mais espaço e alcance para se falar sobre o tema. O problema é que elas também trouxeram bolhas e, na minha opinião, uma dificuldade muito grande para transitar entre as diferentes ideias. Se parar pra pensar, é o maior paradoxo.
Adoro ter neste blog um espaço para compartilhar inquietações, dúvidas e reflexões, mas raramente recebo interações de pessoas debatendo. Em geral ou são as pessoas que concordam comigo de cabo a rabo ou as que querem me crucificar em praça pública e, como não podem fazê-lo, só me ofendem de todos os jeitos possíveis nas caixas de comentários mesmo.
Às vezes me pergunto se ainda há espaço para debate, porque ele é o único caminho para avançar o que quer que seja. A rigor, sei que ele existe (e resiste) em grupos de nicho e apoio, mas parece ser cada vez mais difícil conviver fora da bolha com opiniões e visões de mundo diferentes das nossas (lembrando sempre que discurso de ódio não é opinião).
Como eu, muitos se perguntam se vale a pena continuar falando e tentando debater. Em tempos de fake news, boatos espalhados sem o menor constrangimento e incitação ao ódio, é mesmo de se perguntar. Mas por esses mesmos motivos é que temos que seguir. Conviver com o diferente não é fácil, mas minha pouca experiência de vida já me mostra que justamente por isso é o caminho mais frutífero.
Enquanto feminista, tento sempre recorrer às raízes do movimento e imaginar quanta resistência gratuita e quanto ódio aquelas mulheres enfrentaram em nome de direitos que hoje nos parecem banais. Se hoje é difícil ser ouvida, quem dirá nos séculos anteriores. Pelo menos o mergulho no passado tem sempre um saldo positivo: elas não desistiram, não tem porque eu desistir também. Seguimos.