(CLAM) O Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos repercute com diversas especialistas a representação da imagem da mulher na mídia, tomando como exemplo a recente campanha de lingerie da Hope. Várias pessoas, entidades e a Secretaria de Políticas para as Mulheres solicitaram a interrupção da veiculação da propaganda ao Conar (Conselho de Autorregulamentação Publicitária), que julgou improcedente o pedido, alegando que “os estereótipos presentes na campanha são comuns à sociedade e facilmente identificados por ela, não desmerecendo a condição feminina”. Veja trechos selecionados:
“A campanha, observa Jacira de Melo, diretora-executiva do Instituto Patrícia Galvão, preocupa pela repercussão que pode ter, sobretudo em relação aos jovens. “É preocupante uma vez que pesquisas do próprio campo da publicidade demonstram que a televisão é um canal de informação muito forte para a juventude. Esse tipo de reforço de estereótipo entre homens e mulheres é nefasto para essa faixa da população, pois eles podem absorver e reproduzir tais representações. A publicidade da Hope atua com um grau de liberdade sem limites, oferecendo soluções de cunho sensual pra situações de conflito. Ao pedir que as mulheres exerçam o charme para resolver conflitos, a relação de respeito entre homens e mulheres é desprezada. É um caso em que a publicidade não é lúdica ou satírica, pois ela usa o imaginário e os estereótipos justamente para vender uma marca, um produto”, critica a diretora-executiva do Instituto Patrícia Galvão.”
“A propaganda da Hope não opera no vazio, aponta a socióloga e comunicadora social Angela Freitas, integrante da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB/RJ). “Faz parte de nossa cultura achar graça de publicidades como esta; faz parte valorizar a mulher pelo corpo e dentro de um padrão de beleza. O humor a que recorre a propaganda é um reflexo dessa situação. As pessoas acham graça. A desqualificação dos relacionamentos amorosos entre homem e mulher representam um valor em nossa sociedade”, afirma, completando que, em outros países, talvez esse tipo de publicidade recebesse uma reprovação muito maior do que no Brasil.”
“De acordo com Iara Beleli, socióloga e pesquisadora do Núcleo de Estudos de Gênero (Pagu/Unicamp), um dos desdobramentos mais preocupantes da polêmica foi a reação gerada na internet. “Em fóruns de discussão online, o tom foi virulento e agressivo. O alvo era a ministra e sua equipe: nos comentários, a iniciativa da SPM seria uma conseqüência do fato de elas serem mulheres feias, mal amadas e lésbicas. Isso é muito forte, sobretudo porque repercute sobre a própria história e definição do feminismo, que seria, na perspectiva sexista, um movimento de mulheres recalcadas”, comenta Iara Beleli.”
“De acordo com a doutora em Ciências da Comunicação e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Liv Sovik, a contra-acusação de cerceamento da liberdade de expressão é de praxe. “A acusação de sexismo à propaganda me parece fundamentada. A figura da mulher que seduz para obter vantagens da figura masculina é um estereótipo e, como tal, finge informar, sem efetivamente contribuir para um conhecimento sobre as pessoas nas relações cotidianas. O humor do anúncio da Hope ridiculariza a mulher através desse estereótipo”, critica.”
“Há outro aspecto de gênero a ser considerado: a representação do homem na campanha. “Se eu fosse homem, também protestaria diante desses anúncios. O que vemos é o retrato de um homem bobo, passível e manipulável. Não é uma representação positiva nem para homens, nem para mulheres. Há outras relações e outras referências existentes nas relações afetivas e conjugais”, comenta Jacira Melo.”
A representação estereotipada da mulher na mídia não é específica do Brasil. Recentemente, dois manifestos – em Portugal e na Argentina – expressaram o repúdio em relação à maneira estereotipada e discriminante pela qual as mulheres são representadas na mídia.
Em Portugal, movimentos sociais e entidades se manifestaram condenando a tendência dos meios de comunicação do país de representar as mulheres brasileiras através de estereótipos e estigmas de ordem sexual.
Na Argentina, o Observatório da Discriminação na Rádio e na Televisão expressou recentemente preocupação com os meios de comunicação diante da discriminação das mulheres, frequentemente retratadas como subordinadas aos homens, como objetos ou como consumidoras obsessivas.
Leia matéria na íntegra: O marketing da mulher (CLAM – 18/10/2011)