Taxa de 1,7 é inferior à média da América Latina e do mundo e bem abaixo dos 6 filhos da década de 1960; renda e estudo são explicação
(O Estado de S.Paulo, 17/10/2018 – acesse no site de origem)
“Se for ter outro filho, não consigo manter o padrão de sustento. Para conseguir continuar trabalhando, preciso de uma retaguarda. E o custo é alto”, diz a gerente de unidade de negócios Ariane Mayer, de 35 anos, mãe de um filho só. Aos quase 10 meses, Theo ainda não sabe, mas será filho único. A decisão segue uma tendência brasileira das últimas décadas: as mulheres têm cada vez menos filhos.
Lançado globalmente nesta quarta-feira, 17, o relatório Situação da População Mundial, do Fundo de População das Nações Unidas (Unfpa-ONU), mostra que a família brasileira tem uma média de 1,7 filho – na década de 1960, essa média era de 6 filhos. A taxa de fecundidade no Brasil é inferior à média da América Latina (2) e do mundo (2,5).
O estudo revela que o Brasil tem o menor índice de fecundidade na comparação com outros 11 países da região da América Latina e Caribe (República Dominicana, Costa Rica, El Salvador, México, Nicarágua, Argentina, Chile, Colômbia, Peru, Uruguai e Venezuela). A brasileira se torna mãe em média aos 26,4 anos.
Entre os três países com menor taxa de fecundidade, Chile e El Salvador empatam com 1,76 filho. A tendência deve se manter até 2020. “Essa taxa coloca o Brasil abaixo da taxa de reposição, que é de 2,1 filhos por mulher. Ou seja, a população deve decrescer ”, explica Jaime Nadal, representante da Unfpa.
De acordo com ele, a expectativa é de um processo de envelhecimento da população “maior e mais acelerado”. “Hoje não só as pessoas têm menos filhos, como vivem mais”, afirma. Ele nota no Brasil dois cenários: casais e mulheres que estão fazendo a escolha de ter número de filhos abaixo do que gostariam de ter – por incapacidade de conciliar vida profissional e pessoal, por exemplo – e ainda mulheres que não podem fazer essa escolha porque não têm acesso a serviços de saúde pública e métodos contraceptivos para evitar a gravidez.
Nadal destaca que as mulheres com zero a 4 anos de estudo têm uma média de 2,9 filhos. As que possuem 12 ou mais anos de estudo não ultrapassam a taxa de 1,2 filho. Para ele, o maior desafio do poder público é dar às mulheres de todas as regiões, faixas de renda e escolaridade “o poder da escolha”. “Têm muito a ver com o direito de meninas e mulheres de completarem o ciclo educativo, viverem sem violência e respeitadas.”
Um filho
Ariane planejava ter um filho aos 35 anos. E teve Theo. Mesmo assim, foi um susto. “Não tive cabeça formada para ser mãe. Fui educada para ser independente, não depender de marido e ter a minha vida profissional”, conta.
Digo para as amigas: ter filho é igual a reforma. O que você pensa que vai gastar, você na verdade vai gastar duas vezes mais.
Ariane Mayer, gerente de negócios
Segundo ela, ao chegar aos 35, viu-se em um momento de definição. “Nessa fase, somos pressionados. E às vezes você está no auge da carreira profissional.” Para conciliar a vida profissional e pessoal, a gerente de unidade de negócios colocou o filho em período integral em uma escolinha.
“Cuido o máximo que posso, mas também não com extremo. Lidando desse jeito, já sobrecarrega. Você precisa abrir mão da sua liberdade.”
Além disso, ela destaca o custo de manter um filho como impedimento principal para outra gravidez.
Três filhos
Já a analista de testes Danielly Jansen, de 32 anos, acabou engravidando três vezes: de Sophie, de 7 anos; Thales, de 3; e Benício, de 1 ano e 5 meses. “O Thales e o Benício nasceram de susto. Não tinha planejado.” E não foram gestações fáceis. Na gravidez da filha, Danielly teve descolamento de placenta e não podia se locomover. Precisou deixar o trabalho e largar os estudos. Depois engravidou de Thales. Teve depressão durante toda a gravidez. Em seguida, teve o terceiro filho: Benício. “Minhas amigas dizem que sou guerreira e corajosa por ter três filhos.”
Para lembrar: País chegará a 233 milhões
Em menos de 30 anos, a população do Brasil deve estagnar em 233,2 milhões de pessoas. A projeção de população do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que a partir de 2047 a população cairá gradualmente, até chegar aos 228,3 milhões em 2060. Um quarto da população, em 2060, deverá ter mais de 65 anos. Se a taxa de fecundidade total para 2018 é de 1,7 filho por mulher, o número médio de filhos por mulher deverá reduzir para 1,66 em 2060.
Entre os Estados, as maiores taxas de fecundidade serão em Roraima (1,95), seguido do Pará, do Amapá, do Maranhão, de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul – todos com 1,8. Já os menores índices deverão ser no Distrito Federal (1,5) e em Goiás, Rio de Janeiro e Minas Gerais, todos com 1,55. Ainda segundo a projeção do IBGE, a idade média em que as mulheres têm filhos é hoje de 27,2 anos e deverá chegar a 28,8 anos em 2060.
Por Juliana Diógenes