Em 2 semanas, 8 projetos de lei relacionados a direitos das mulheres passaram pela Câmara; 3 deles ainda precisam do aval do Senado.
(HuffPost Brasil, 09/12/2018 – acesse no site de origem)
Em fim de ano eleitoral e às vésperas do início do mandato de um número recorde de parlamentares novos, a bancada feminina fez um esforço, nas últimas 2 semanas, para aprovar propostas relacionadas a direitos das mulheres. Dentro da campanha “16 dias de ativismo pelo fim da violência contra as mulheres“, a Câmara dos Deputados aprovou, neste período, 8 projetos de lei ligados ao tema.
Desse total, 5 seguiram para sanção do presidente Michel Temer e 3 ainda precisam do aval do Senado, o que pode não ocorrer em 2018 devido ao rito de tramitação.
Os textos foram definidos após acordo entre as deputadas. Dos 9 escolhidos, apenas um foi retirado de pauta – o PL 622/2015. O projeto prevê a proibição do uso de recursos públicos para contratação de artistas que, em suas músicas, desvalorizem, incentivem a violência ou exponham as mulheres a situação de constrangimento, ou ainda contenham manifestações de homofobia, discriminação racial ou apologia ao uso de drogas ilícitas.
“Houve uma contestação de determinados setores ligados à cultura que acham que isso pode ser compreendido de maneira subjetiva e levar a uma censura. Vamos nos debruçar sobre o assunto e ver se a gente especializa o projeto”, afirmou ao HuffPost Brasil a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).
Para a parlamentar, o mutirão deve ser comemorado, mas há muito que avançar. “Estamos vivendo tempos turbulentos e as mulheres acabam ficando condicionadas a duas datas: março e o fim de ano. Isso é uma atipia do sistema legislativo brasileiro. Precisamos, além de crescer o número de mulheres, garantir a aprovação de pautas que impactem a vida de mais da metade da população brasileira”, afirmou.
Por esse motivo, Portugal defendeu que o Congresso vote uma reforma política que inclua cota de cadeiras para mulheres. A bancada não conseguiu avançar com a proposta de emenda à Constituição sobre esse tema nesta legislatura.
Entre as propostas aprovadas nas últimas 2 semanas, a maioria está ligada à violência doméstica, devido a uma facilidade de consenso sobre o tema entre as deputadas e à situação nacional nessa esfera. O Brasil é o quinto país que mais mata mulheres.
Na avaliação da deputada Maria do Rosário (PT-MS), a mobilização foi importante diante da expectativa para 2019. “Concluímos agora sem saber como será o futuro. Neste momento temos movimentos anti-feministas dentro da próxima bancada”, disse à reportagem.
A partir do próximo ano, das 77 eleitas, legendas progressistas como PT, PCdoB e PSol somam 21 integrantes. Do outro lado, 9 são do PSL, partido de Jair Bolsonaro. Aliadas do presidente eleito, já afirmaram, por exemplo, que “mulher aceita a violência porque não quer trabalhar“.
Apesar do esforço da Câmara, o caminho não é curto no Senado. Os projetos originados na Câmara só não passam pelas comissões se forem aprovados requerimentos de urgência.
“Não creio que haja disposição da maioria de votar imediatamente projetos que acabam de vir da Câmara. E o requerimento de urgência depende de uma maioria determinada pelo regimento interno. Pode iniciar a tramitação, mas dificilmente concluir neste ano”, afirmou a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM).
De acordo com a parlamentar, que comanda a Procuradoria da Mulher no Senado, não houve um acordo com as deputadas para acelerar a tramitação. “Não houve um pedido formal de atenção especial para a bancada feminina. Não recebemos nenhum pedido nesse sentido”, afirmou.
Grazziotin acredita ser possível aprovar algum texto ligado a mulheres ainda em 2018, mas admite que algumas matérias não vão avançar. Uma delas é o projeto de lei que proíbe o casamento de menores de 16 anos, aprovado pela Câmara em junho. O PLC 56/2018 chegou a entrar na pauta do plenário do Senado neste semestre, mas saiu devido à resistência de senadores.
“Ele é bastante polêmico. Chegamos a sugerir a apresentação de uma emenda para que fosse votado ainda nessa semana, que dessa forma iria para a Câmara e a Câmara dá a palavra final, mas não houve consenso para ser votado”, afirmou Grazziotin. O objetivo da proposta é evitar casos de gravidez acidental, abandono escolar e exploração sexual, muitas vezes relacionados a casamentos precoces.
Entenda o que foi aprovado sobre violência contra mulher
01) Pagamento do agressor: pendente de votação no Senado, o Projeto de Lei 9691/18 obriga o agressor a ressarcir os custos do SUS (Sistema Único de Saúde) com vítimas de violência doméstica, além de eventuais gastos com uso de abrigo para vítimas e dispositivos de monitoramento de mulheres amparadas por medidas protetivas. Para evitar que os bens da vítima sejam usados para esse pagamento, foi incluído no texto um dispositivo para que o ressarcimento não diminua o patrimônio dela ou de seus dependentes.
02) Ecocardiograma fetal: depende de aval do Senado o PL 5248/16, que inclui o ecocardiograma fetal entre os exames a serem oferecidos pelo SUS. Também deve estar disponível o exame de ultrassonografia transvaginal por duas vezes durante o primeiro quadrimestre da gravidez.
03) Prevenção contra câncer: enviado para sanção presidencial, o PL 843/07 autoriza o trabalhador a se ausentar do serviço para realizar exames preventivos contra o câncer. Apesar do tema não se restringir às mulheres, faz parte do pacote acertado pela bancada feminina.
04) Reconstrução de mama: dependente de sanção presidencial, o PL 4409/16 garante o direito à reconstrução das duas mamas para garantir sua simetria em mulheres submetidas a tratamentos contra o câncer.
05) Porn revenge: enviado para sanção presidencial, o PL 5555/13 prevê pena de 6 meses a 1 ano e multa para quem fizer registro não autorizado da intimidade sexual. O crime também inclui quem produz montagem para incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual.
06) Medida protetiva: ainda sem aval do presidente, o PL 3030/2015 aumenta a pena de homicídio no caso de descumprimento de medida protetiva de urgência prevista na Lei Maria da Penha.
07) Mães presas: pendente de sanção do presidente, o PL 10269/18 coloca na lei entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) que concedeu às detentas mães o direito de cumprir a pena em regime domiciliar.
08) Tratamento de agressores: depende de aprovação dos senadores o PL 5001/16, que altera a Lei Maria da Penha para que o autor de violência familiar frequente centros de educação e de reabilitação e receba acompanhamento psicossocial, por meio de atendimento individual ou em grupo de apoio. Após um acordo em plenário, o texto final prevê que a orientação possa ser determinada pelo juiz, mas não seja uma obrigação.
Por Marcella Fernandes