A norma fluminese proibia que legistas homens fizessem o exame
(Agência Brasil, 13/03/2019 – acesse no site de origem)
O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu hoje (13), por unanimidade, uma liminar (decisão provisória) para suspender a aplicação do trecho de uma lei do Rio de Janeiro que proibia legistas homens de realizar perícias em meninas menores de idade vítimas de abuso sexual.
A liminar havia sido pedida pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em outubro do ano passado, quando ela questionou o trecho da Lei 8.008/2018, segundo o qual a menor vítima de abuso sexual “deverá ser, obrigatoriamente, examinada por legista mulher”.
Apesar de admitir que “o espírito da norma é bom”, Dodge argumentou que, na prática, devido à inexistência de peritas mulheres em número suficiente, a lei tem “produzido um efeito deletério”: a não realização das perícias médicas em tempo hábil para a produção de provas, dificultando ou mesmo impedindo que os abusadores sejam denunciados ou condenados pelo crime.
O relator da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo, ministro Edson Fachin, concordou com os argumentos da PGR. Para ele, a lei poderia a princípio ser considerada regular, mas acabou se tornando inconstitucional ante a realidade do estado do Rio de Janeiro, que não possui legistas mulheres para realizar o trabalho, prejudicando o direito das vítimas de terem acesso à Justiça.
Fachin propôs que “as crianças e adolescentes do sexo feminino vítimas de violência deverão ser examinadas por legista mulher desde que não importe retardamento ou prejuízo da diligência”, abrindo assim a possibilidade de que médicos homens façam as perícias sem infringir a lei.
Com diferentes argumentos, todos os demais ministros – Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Dias Toffoli – também votaram por conceder a liminar. O decano, Celso de Mello, não participou do julgamento.
Em seu voto, Cármen Lúcia elogiou a solução de Fachin, por a seu ver preservar a intenção original da lei, ao mesmo tempo em que ajusta a norma à realidade. Ela destacou o “preconceito que passa a própria vítima, que tem até medo de ir ao médico perito realizar o exame”.
Para ela, a lei buscou equacionar essa situação de grave preconceito social contra a vítima feminina de abuso sexual, ao exigir a perícia feita por uma mulher, apesar de ter tido sua aplicação prejudicada pela falta de profissionais que permitam o cumprimento da norma.