ONU Mulheres e OIT afirmam que avanços realizados pelos países nos últimos anos devem retroceder diante da crise econômica causada pela Covid-19
(Celina/O Globo, 31/03/2020 – acesse no site de origem)
Os avanços globais feitos nos últimos anos em direção aos mesmos salários para homens e mulheres estão sob risco por causa da pandemia de Covid-19, alertam especialistas e ativistas pela igualdade de pagamentos. Nesse momento de crise, as mulheres usam o tempo em que não estão trabalhando para cuidar de outras pessoas. Elas também são a maioria dos trabalhadores em setores da economia que, historicamente, têm baixa remuneração.
Mas, essa grave diferença salarial pode aumentar em 2020, já que as mulheres são afetadas de maneira desproporcional pelas responsabilidades com a casa durante a quarentena, além de que trabalhos mal-remunerados, como os domésticos, estão desaparecendo, afirma Anita Bhatia, secretária-geral assistente e ex-diretora executiva da ONU Mulheres.
– As mulheres suportar uma grande crise. Temos homens que as apóiam, mas não em número suficiente, e realmente precisamos trabalhar nos vieses de gênero que impedem os homens de dividir as tarefas de cuidado com a casa e com outras pessoas.
Nos países que integram a Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCDE), que são majoritariamente nações europeias desenvolvidas, a diferença salarial era de 18% em 2000 e caiu para quase 13% em 2017.
A PayScale, baseada em Seattle, afirma que a diferença de salários entre homens e mulheres no Estados Unidos diminuiu nos últimos anos, mas o coronavírus pode ter um efeito contrário, com as mulheres se afastando do mercado de trabalho.
– Há a possibilidade de revertermos a tendência facilmente – diz Sudarshan Sampath, diretor de pesquisas da empresa, que descobriu que, quando as mulheres se candidatam a um trabalho depois de um tempo fora do mercado, elas ganham, em média, 7% menos do que outros candidatos à mesma função.
A crise econômica causada pela pandemia de coronavírus pode resultar na perda de mais de 25 milhões de postos de trabalho, de acordo com a OIT. A Catalyst, uma organização sem fins lucrativos baseada nos EUA, afirma que as pesquisas mostram que quando as empresas diminuem de tamanho, a diversidade se torna secundária, com mulheres e pessoas negras sendo as mais atingidas. Tanya van Biesen, diretora da Catalyst, diz temer que os progressos feitos nas últimas décadas seja perdido porque setores como turismo e hospitalidade, que tem grande parte da força de trabalho composta por mulheres, serão gravemente atingidos.
– Tenho medo de que a crise de saúde atual e a crise econômica que virá a seguir nos fará perder os ganhos que as mulheres conquistaram no mercado de trabalho.
Para reduzir a burocracia em meio a uma crise econômica, o governo britânico liberou as empresas de apresentarem seus relatórios anuais sobre as diferenças de salários entre homens e mulheres. Mas Sam Smethers, diretor da organização sem fins lucrativos Fawcett Society, acredita que haverá um ponto positivo na crise, que é a normalização do trabalho remoto e da flexibilidade de horários.
– Precisamos redesenhar a maneira como trabalhamos. O coronavírus nos força a fazê-lo.
No Brasil, a igualdade de salários avança a passos lentos. Em 2004, as mulheres ganhavam 70% do que recebiam os homens. Em 2018, elas passaram a ganhar 79,5% do que eles ganhavam. Esse aumento é mais um resultado da maior escolaridade das mulheres do que de políticas públicas ou das empresas. As mulheres cavaram um espaço no mercado de trabalho, mesmo que ainda seja mais na área de cuidados, cuja remuneração é menor. As medidas econômicas anunciadas pelo governo para enfrentar a crise iniciada pela pandemia incluem auxílio a informais, em sua maioria mulheres, e redução de jornada.
Por O GLOBO, com agências internacionais