(Folha de S.Paulo) Atualmente, cerca de 1 bilhão de pessoas sofrem de subnutrição, e muitos países estão longe de atingir o primeiro Objetivo de Desenvolvimento do Milênio, o de reduzir pela metade, até 2015, a proporção de pessoas que vivem na fome e na pobreza extremas.
A minha principal prioridade para 2012 será dar um novo impulso para alcançar esse objetivo, mas também olhar mais à frente, para a erradicação total da fome.
Obviamente, não é algo que a FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura) possa fazer sozinha. Será necessário uma mobilização internacional, o apoio dos governos e um esforço concertado de toda a família das Nações Unidas e de outros parceiros de desenvolvimento.
Pretendo começar imediatamente uma série de consultas com 20-30 dos países mais pobres do mundo e ajudá-los a mobilizar os recursos necessários para lançar as suas próprias estratégias abrangentes de segurança alimentar.
Não há receitas prontas, mas também não há necessidade de começar do zero. Em diferentes partes do mundo em desenvolvimento há uma riqueza de experiências internacionais às quais esses países podem recorrer para encontrar respostas para os seus problemas.
A FAO, tirando o melhor partido dos seus próprios recursos financeiros e humanos, e trabalhando lado a lado com outros parceiros, está preparada para ajudar esses países a formular planos viáveis de segurança alimentar.
Em 2011, a FAO lançou o que corresponde a uma revolução duplamente verde na agricultura, visando aumentar a produção e diminuindo o impacto ambiental causado pelos sistemas agrícolas atuais.
Esse novo modelo, “Save and Grow” (Poupar e Crescer), conserva e promove os recursos naturais, utilizando a contribuição da natureza -desde a matéria orgânica dos solos à regulação de fluxos de água – para o aumento das colheitas, e pode ser adaptado a condições específicas. Experiências em terreno em 57 países de baixo rendimento agrícola têm permitido aumentos de em média 80%.
Isso pode desempenhar um papel importante para ajudar países com insegurança alimentar a alcançar um maior crescimento econômico sustentável, questão que estará no centro das atenções em junho próximo, na Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20).
A mudança climática e a segurança alimentar têm agendas convergentes. Ambas requerem mudanças importantes para alcançarmos padrões mais sustentáveis de produção e consumo. Temos agora a oportunidade de explorar as suas potenciais sinergias.
Junto com a ONU Mulheres e com outros parceiros, a FAO defende o empoderamento das mulheres na agricultura. Atualmente, a produtividade dos terrenos cultivados por mulheres é mais baixa que naqueles cultivados por homens, porque elas não têm o mesmo acesso a recursos como terra, tecnologia e insumos. Podemos reverter o quadro.
Nesse novo impulso na luta contra a fome, devemos procurar soluções novas e inovadoras. A injeção de recursos nas economias rurais, por meio de programas de transferência de dinheiro e de incentivos à produção, por exemplo, estimulam o crescimento local. Criam-se empregos, renda e mercados para os pequenos agricultores, e a oferta local de alimentos frescos, saudáveis e nutritivos aumenta.
O caminho à frente é longo e, embora a nossa tarefa esteja dificultada pelo ambiente econômico incerto, estou convencido de que, com nova abordagem e esforços renovados, além de medidas para fortalecer a governança global da segurança alimentar, podemos avançar em direção à erradicação da fome.
José Graziano da Silva é diretor-geral da FAO (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura).
Acesse em pdf: A fome não pode esperar, por José Graziano da Silva (Folha de S.Paulo – 01/01/2012)