Quando o sigilo não estiver assegurado, a quem as vítimas de estupro vão recorrer?, perguntam as médicas Elcylene Leocádio, Maria José Araújo e Tania Di Giacomo do Lago, ex-coordenadoras da Área de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde.
(Opinião/Folha.com | 23/11/2020)
Proteger mulheres e meninas do estupro é um dever do Estado, e as iniciativas para garantir este direito devem ser apoiadas. Mas se as medidas adotadas com a intenção de protegê-las podem levar à intimidação e à revitimização, a sociedade pode e deve questioná-las. E se um representante do Estado diz que “é difícil entender como se pode ser contra a portaria proposta”, como escreveu o atual coordenador da atenção básica do Ministério da Saúde nesta Folha (“Uma portaria para proteger vítimas e punir estupradores”; 11.nov.2020), consideramos necessário explicar.
No papel de coordenadoras da Área de Saúde da Mulher no Ministério da Saúde, fomos responsáveis pela elaboração das primeiras normas técnicas de atenção às mulheres vítimas de estupro. Com base em nossa experiência, acreditamos que obrigar uma mulher vítima de violência sexual a dar detalhes sobre o agressor como precondição à atenção à saúde é ultrapassar o limite da proteção e adentrar um terreno complexo, no qual as mulheres correm riscos (inclusive de morte) que não podem ser minimizados.