(O Globo) O Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) começou a sair do papel no fim de agosto do ano passado, quando a população do município goiano de Santo Antônio do Descoberto foi a primeira a ser agraciada com o serviço de internet de alta velocidade a preços mais acessíveis. O programa fez com que o Governo Federal e a sociedade civil passassem a discutir questões mais amplas, que extrapolam o preço final cobrado pelo serviço como, por exemplo, a qualidade e a velocidade de conexão que, com certeza, vão impactar de diferentes formas a vida da população de baixa renda.
Certamente esses pontos são fatores muito importantes quando falamos em universalização do serviço, porém não são suficientes para pôr fim à exclusão digital, pois sua solução não se limita a ter ou não um computador conectado à internet. É importante saber se realmente as pessoas das classes C, D e E estão capacitadas para usá-lo de maneira adequada e produtiva.
Não saber como se apropriar da tecnologia também é uma forma de exclusão digital, e o Brasil ainda possui 110 milhões de pessoas (58% da população) que não costumam ter contato com a internet, seja em casa, no trabalho ou por meio de uma lan house – segundo dados recentes do Ibope Nielsen. Isso quer dizer que mais da metade do país ainda é excluída digitalmente, eles não têm noção do que é possível ser feito na rede mundial de computadores ou dos riscos que existem nela.
Para se ter uma política de inclusão digital eficaz é preciso envolver os três setores da economia: ONGs, Governo e empresas privadas. Mais que levar computadores ou acesso à internet a todos os municípios brasileiros, é necessário construir um sólido modelo de gestão, elaborar uma política pedagógica de qualidade — que ensine a população a se apropriar da tecnologia como ferramenta cidadã —, de acompanhamento, avaliação e capacitação contínuos. E isso só pode ser desenvolvido por meio de um processo cocriativo e de gestão compartilhada com essas três esferas da sociedade civil. Além disso, é fundamental associar essa ação a uma política consistente de descarte apropriado do lixo tecnológico.
O reconhecimento da importância de universalizar o acesso à internet levou, no início de janeiro, o Ministério das Comunicações a anunciar que o Governo tem planos de criar uma espécie de um PNBL para celular, focado em consumidores que não têm renda para contratar um serviço fixo de R$ 35 pelo Plano Nacional de Banda Larga tradicional. A ideia é que as operadoras vendam pacotes de serviços que darão direito a fazer uma quantidade “x” de ligações pelo telefone móvel para qualquer operadora e acessar a internet pelo aparelho.
Sabemos que o caminho da inclusão digital passa, legitimamente, pelo uso da telefonia celular em um futuro próximo. De acordo levantamento da Associação Brasileira de Telecomunicações (Telebrasil), o país fechou 2011 com quase 58 milhões de acessos em banda larga, sendo que — deste total — 41,1 milhões são oriundos de banda larga móvel (via celular 3G ou modem) e 16,7 milhões são provenientes de banda larga fixa. Isso mostra que hoje a maior parte dos acessos à internet é feita por telefonia móvel. Daí a importância de se criar um PNBL voltado especificamente para esse meio.
O fato é que um país incluído digitalmente não depende apenas do uso da ferramenta, mas da capacidade da população de se apropriar dela, com objetivo de produzir e publicar conteúdo relevante. E é essa visão abrangente que o Governo precisa para desenvolver uma política de acesso à web onde a internet se torne uma importante via de empoderamento e libertação, que auxilie o país a ser mais competitivo no século XXI.
RODRIGO BAGGIO é presidente do Comitê para Democratização da Informática.
Acesse em pdf: Inclusão digital sustentável, por Rodrigo Baggio (O Globo – 04/02/2012)