(Terra) Os médicos colombianos revelaram os alarmantes números da violência contra a mulher em seu país e demonstraram ainda mais preocupação com a possibilidade de suas obrigações, dentro da nova política governamental contra esse problema, entrarem em choque com o sigilo profissional.
O pesadelo, como descreveu à Agência Efe o presidente da Associação Colombiana de Sociedades Científicas, Rodrigo Córdoba, começou na semana passada, quando o Governo apresentou um pacote de decretos para prevenir qualquer tipo de violência contra a mulher em todas as situações.
Na ocasião, a ministra da Saúde da Colômbia, Beatriz Londoño, se referiu à responsabilidade dos médicos como “denunciantes” de cada caso de violência doméstica, o que não foi bem recebido por essa associação.
“Nós nos negamos categoricamente a exercer o papel da polícia, a denunciar o delito e fazer parte ativa do processo judicial, já que isso entraria em conflito com nossos princípios éticos”, argumentou Córdoba, que apoia “com profundo entusiasmo” toda iniciativa para acabar com a violência.
Para Córdoba, que representa dentro da organização os psiquiatras colombianos, se um médico apresentasse todos os dados do diagnóstico ao sistema judiciário, violaria imediatamente o sigilo profissional, o que não daria nenhuma garantia à vítima.
Essa relação de confiança com o médico é fundamental, já que o grande problema da violência contra a mulher continua sendo a falta de diagnóstico. “Muitas mulheres ficam em casa e não procuram um hospital”, o que, segundo o psiquiatra, torna inconcebível prejudicar o sigilo profissional.
Córdoba está aguardando o Governo definir se a função dos profissionais da saúde é serem “policiais” ou apenas registrar os casos de maus-tratos sem acrescentar detalhes, o que ficará estabelecido no dia 20 de fevereiro, conforme prometeu a alta conselheira para a Igualdade da Mulher, Cristina Plazas.
Os decretos assinados pelo Governo preveem também que a mulher agredida não consiga retirar a denúncia por coação ou arrependimento e dão, a qualquer pessoa que não seja a própria vítima, a possibilidade de entrar com um recurso de ação de tutela.
Durante cerca de 50 anos, a Colômbia concentrou seus esforços em combater o conflito armado, no qual as mulheres foram alvo de agressões por todas as pessoas envolvidas nos atos violentos.
Segundo relatório divulgado no ano passado pela organização Intermón Oxfam, entre 2001 e 2009, 489.687 mulheres foram vítimas de vários tipos de violência sexual, dos quais 29% foram cometidos por guerrilheiros, paramilitares e membros da polícia.
No entanto, de acordo com Córdoba, 90% das mulheres atendidas nos hospitais colombianos chegam como vítimas da violência cotidiana em um país onde, conforme um relatório da ONU, em 2010, 50% dos homens admitiram ter maltratado sua esposa alguma vez.
Em 2010, das 57.875 vítimas de maus-tratos registradas na Alta Secretaria Presidencial para a Igualdade da Mulher, 51.182 eram do sexo feminino, tendência que se mantém constante historicamente.
A faixa etária na qual há mais vítimas é a que vai dos 25 aos 29 anos, época em que começam a conviver com seu cônjuge e as relações de domínio em culturas machistas se consolidam.
Acesse o pdf: Violência contra mulheres vira pesadelo do sigilo médico na Colômbia (Terra – 02/02/2012)