“É uma medida que não vai ter efetividade na realidade. As mulheres não terão mais proteção”, afirmou a defensora pública Ana Rita Souza Prata, na época.
(HuffPost Brasil, 14/08/2018 – acesse no site de origem)
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (14) um projeto de lei que altera a Lei Maria da Penha para que delegados e policiais possam conceder medidas protetivas. Hoje a autorização é judicial. Proposta similar foi vetada pelo presidente Michel Temer em novembro de 2017, com apoio dos movimentos feministas.
O texto aprovado foi o substitutivo do relator, deputado João Campos (PRB-GO), integrante da bancada religiosa, ao Projeto de Lei 6433/13. A proposta também é assinada pela deputada Soraya Santos (PR-RJ), presidente da bancada feminina na Câmara e ainda será analisada pelo Senado.
De acordo com o PL, se houver risco à vida ou à integridade física da mulher ou de seus dependentes, o agressor será imediatamente afastado de casa por delegado de polícia, quando o município não for sede de comarca ou por policial, quando não for sede de comarca e não houver delegacia disponível no momento da denúncia.
Nesses casos, a concessão de medida protetiva deverá ser comunicada em até 24 horas ao juiz, que decidirá em igual prazo sobre a manutenção ou não da decisão. Hoje, o prazo é de 48 horas para a polícia comunicar o juiz sobre as agressões, para que então ele decida.
De acordo com Soraya Santos, a alteração irá ajudar a proteger a vida de mulheres. “O que se pede neste projeto é que, em 24 horas, essa mulher possa ser atendida por uma autoridade policial e, em 24 horas, essa decisão seja remetida ao juiz para que possa confirmar ou não essa decisão”, afirmou. Ela lembrou que todos os dias 13 mulheres são mortas no País por feminicídio.
O texto estabelece também que medidas protetivas de urgência serão registradas em banco de dados mantido e regulamentado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que poderá ser acessado pelo Ministério Público, Defensoria Pública e dos órgãos de segurança pública e de assistência social.
Temer vetou alteração na Lei Maria da Penha
Em novembro de 2017, ao sancionar a Lei 13.505, o presidente Michel Temer vetou que delegados possam conceder medidas protetivas. Na justificativa, ele afirmou que a permissão para delegados era inconstitucional, por violar os artigos 2o e 144, § 4o da Constituição, “ao invadirem competência afeta ao Poder Judiciário e buscarem estabelecer competência não prevista para as polícias civis”.
O veto era uma demanda dos movimentos feministas e de especialistas. Em entrevista ao HuffPost Brasil, à época, a defensora pública Ana Rita Souza Prata, coordenadora do Núcleo de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública de São Paulo, afirmou que a mudança pode trazer danos à aplicação e efetividade da lei.
“A Lei Maria da Penha prevê obrigações hoje para a polícia que não são cumpridas pela alegação de falta de profissionais. Eu fico refletindo que profissional vai surgir para intimar esses agressores. É uma medida que não vai ter efetividade na realidade. E a gente questiona qual o objetivo real dessa proposta. Porque as mulheres não terão mais proteção com ela”, afirmou a especialista.
Outra preocupação, de acordo com Ana Rita Prata, é a de que as mulheres busquem a delegacia e tenham uma compreensão equivocada de que elas estão protegidas. “Sem a intimação do agressor, que seria a responsabilidade do delegado, a medida protetiva nada mais é do que um papel. Essa falsa compreensão da vítima leva à sensação de que elas são obrigadas a relatarem as violências unicamente na esfera criminal. E elas não são obrigadas”, argumentou.
O 5º país que mais mata mulheres
Na semana passada, o debate sobre violência doméstica voltou à tona com a morte da advogada Tatiane Spitzner, assassinada pelo marido, Luís Felipe Manvailer, em Guarapuava, no Paraná, e com os 12 anos da Lei Maria da Penha.
Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), o Brasil é o quinto país que mais mata mulheres. São 4,8 homicídios para cada 100 mil brasileiras. O Mapa da Violência de 2015 aponta que, entre 1980 e 2013, 106.093 pessoas morreram por sua condição de ser mulher. Do total de feminicídios registrados em 2013, 33,2% dos homicidas eram parceiros ou ex-parceiros das vítimas.
Com a Lei do Feminicídio, aprova em 2015, matar uma mulher pela sua condição de mulher, passou a ser um agravante do crime de homicídio. A mudança aumenta a pena de um terço até a metade. Para definir a motivação, considera-se que o crime deve envolver violência doméstica e familiar e menosprezo ou discriminação à condição de mulher.