(Terra) As mudanças realizadas pelo governo federal no decreto que cria o 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) desagradaram tanto os setores favoráveis e como os contrários ao aborto.
Publicado em dezembro de 2009, o texto anterior falava em “apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos”. Pressionado, o governo recuou e alterou o texto para: “considerar o aborto como tema de saúde pública, com garantia do acesso aos serviços de saúde”.
Enquanto os setores contrários ao aborto dizem que não houve mudança efetiva, os que são favoráveis à descriminalização avaliam que a alteração impediu um avanço que constava do texto anterior. Em outras palavras, a mudança não agradou nenhum dos lados.
“Mudaram seis por meia dúzia”, reclama a professora Lenise Garcia, do Instituto de Biologia da Universidade de Brasília, para quem “o texto ainda é claramente a favor da descriminalização. As pessoas que lidam nessa área de defesa da vida sabem que as explicações se equivalem”. Essa é também a opinião do deputado federal Luiz Bassuma (PV-BA), presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e Contra o Aborto: “a mudança é cosmética e superficial. Antes, a citação era mais explícita, mas o novo texto muda muito pouco para quem acompanha o assunto.”
Por outro lado, a coordenadora da Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto, Rogéria Peixinho, diz que, apesar da posição contrária à do parlamentar e da pesquisadora, quem defende o direito ao aborto também não ficou satisfeito com o novo decreto. “A gente não legitima esse texto porque ele não muda a situação de criminalização e morte das mulheres e continua sem reconhecer a autonomia das mulheres. Quem saiu ganhando foram os conservadores. O governo Lula cedeu às pressões de fundamentalistas”, critica a coordenadora, para quem “simplesmente dizer que é um tema de saúde pública (é algo que) já estava no texto anterior”.
De fato, o Plano de Direitos Humanos editado durante o governo Fernando Henrique Cardoso, em 2002, já considerava o aborto como tema de saúde pública e garantia acesso aos serviços de saúde “para os casos previstos em lei” e também apoiava o “alargamento dos permissivos para a prática do aborto legal”.
Maria José Rosado, da organização feminista Católicas pelo Direito de Decidir, considera que o melhor seria ter mantido a redação anterior. “Nós queríamos a afirmação do direito das mulheres de ascenderem a um aborto saudável e de livre escolha, mas não obtivemos”, lamenta Maria José, que no entanto considera que a mudança acabou trazendo um lado positivo. “Houve ameaças de retirada da questão do aborto do texto. Se o governo afirma que é um problema de saúde pública, indica a necessidade de se ter políticas para isso. Esse é um patamar de luta importante. O governo cedeu à igreja relativamente e não de forma absoluta“.
Acesse a matéria Grupos pró e antiaborto se unem contra mudanças na lei (Portal Terra – 23/05/2010)
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16/05/2010 – Leitoras criticam recuo do governo em relação ao aborto no PNDH-3 (Folha)