(Folha de S. Paulo, 31/08/2014) Com menos vagas em maternidades, algumas grávidas têm que fazer quase uma peregrinação para obter atendimento e chegam a ficar horas afastadas dos bebês.
A técnica em ótica Allana Beatriz Inácio Silva, 22, teve o filho Pietro em maio deste ano no Hospital Sepaco, na zona sul de São Paulo. Mas só conseguiu ficar com ele quase 11 horas após o parto.
Motivo: com a maternidade lotada, ela teve que esperar sozinha em uma sala de recuperação até que houvesse um quarto disponível.
Durante a espera, questionou sobre amamentar o filho e foi informada que o bebê já havia sido alimentado no berçário. “O primeiro leite não foi o meu. Chorei muito e sofro até hoje com isso”, diz Allana, que pretende processar a maternidade.
Segundo obstetras, situações como essas têm ficado mais comuns nos últimos anos. Em 2010, a advogada Juliana Açakura, 37, esperou duas horas em uma cadeira de rodas para entrar no centro cirúrgico do Hospital São Luiz, em São Paulo.
“Eram cinco, seis mulheres, todas esperando sem saber quando era sua vez. Era um entra e sai de mulher barriguda e de bebês que parecia linha de produção”, diz ela, que também relata ter sido impedida de amamentar o filho. “Ele só veio para o meu colo cinco horas após nascer”, lamenta.
Procurado, o Sepaco disse que “por conta do fechamento de várias maternidades na cidade, enfrenta uma alta taxa de ocupação”. O hospital afirma que vai avaliar o que ocorreu no caso da paciente.
Em nota, a maternidade São Luiz disse que investe para ampliar sua capacidade de atendimento, mas que “o setor de saúde enfrenta o desafio da crescente demanda”.
PEREGRINAÇÃO
Em busca de uma vaga, a fotógrafa Ana Paula Cayres, 32, teve de passar por quatro maternidades particulares de Campo Grande (MS) durante o trabalho de parto.
“Minha médica ligava para os hospitais no meio do caminho e eles falavam que estava tudo lotado. Foi um pesadelo”, lembra ela, que acabou tendo a filha em uma cesárea de emergência.
A obstetriz Ana Cristina Duarte, do Gama (Grupo de Maternidade Ativa), afirma que o problema de lotação é agravado pela concentração de cesáreas agendadas em determinadas épocas do ano, como vésperas de feriados –o que deixa sem vaga quem chega em trabalho de parto.
Em alguns hospitais, porém, até quem tenta agendar a cesárea tem dificuldade.
Uma semana antes da data prevista para ter o bebê, a professora Tatiane de Faria, 33, foi pega de surpresa por uma mensagem do plano de saúde. Ela planejava fazer o parto na Pro Matre, onde teve o primeiro filho. Descobriu que não havia vaga em nenhum dia da semana. Acabou sendo transferida para outra unidade da rede.
Questionada, a Pro Matre negou a falta de vagas.
Para o obstetra Newton Busso, o aumento na adesão aos planos de saúde contribuiu para aumentar o problema. “É difícil agendar o parto em função das poucas maternidades. E as de melhor padrão estão lotadas”, diz.
Giovanna Balogh
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