Todos os anos, em abril, maio, as doenças transmitidas pelo Aedes aegypti — dengue, zika e chicungunha — diminuem consideravelmente. A explicação mais racional é que a população do vetor diminui quando as temperaturas noturnas começam a baixar, e a as chuvas escasseiam. Com o retorno das chuvas e do calor no fim do ano, voltaremos a viver a angústia de doenças para as quais ainda não temos tratamento e que têm associadas a elas um padrão de morbidade e mortalidade ainda em evolução. A mortalidade da dengue se associa às múltiplas exposições, a cada um dos diversos sorotipos, e aumenta com o tempo; a chikungunya traz-nos uma série de complicações crônicas, como a dor nas articulações; e a zika com sua trágica herança de danos.
(O Globo, 17/05/2017 – Acesse o site de origem)
Mas, no dia 11 de maio, o Ministério da Saúde declarou o fim da Emergência Nacional para Zika e microcefalia. Fim da emergência? Estão resolvidos os problemas de saneamento e acesso à agua que farão com que o Aedes volte a transmitir a doença? As crianças com sequela da zika e suas famílias recebem e receberão o apoio necessário para minimizar o impacto da doença? As mulheres poderão engravidar no verão sem correr riscos? Existe alguma estratégia de controle do mosquito que funcione nas condições concretas das cidades brasileiras que detenham a disseminação da doença no próximo verão? Qual a dimensão da transmissão sexual da zika? Qual o grau de imunidade de grupo necessário para diminuir a intensidade dessas enfermidades? Como está a distribuição da imunidade nos diversos estados brasileiros?
Nada mudou.
O Ministério da Saúde citou quatro características para que um evento seja considerado uma emergência pelo Regulamento Sanitário Internacional: o impacto do evento sobre a saúde pública; se o evento é incomum ou inesperado; se há risco significativo de propagação internacional; e se há risco significativo de restrições ao comércio ou viagens internacionais.
É justamente o impacto sobre a saúde pública, associado ao risco de propagação nacional — já que partes do país não foram afetadas —, assim como o impacto internacional para os países vizinhos — e nem todos foram afetados —, assim como o impacto no turismo, que exigem a manutenção de um estado de emergência que até o momento não cumpriu com sua missão de proteger a população ou mesmo de minimizar o impacto da zika.
E não nos esqueçamos de que além da zika, dengue e chikungunya temos também a febre amarela que, se urbanizada e transmitida pelo mesmo Aedes, pode vir a se tornar o quarto cavaleiro.
A emergência deve ser mantida e expandida visando a buscar alternativas concretas para proteger a população de agravos decorrentes da falta de saneamento básico e de uma política avançada de desenvolvimento de vacinas. Uma política que permita proteger a população de outras possíveis doenças emergentes assim como modernizar a produção de vacinas como a de febre amarela, utilizada gota a gota, pelas limitações da produção nacional que carece de apoio para sua expansão.
Gustavo Bretas é membro da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco