(El País) Com o objetivo de conscientizar os fumantes de que o lixo é o lugar certo para jogar os restos dos cigarros – bitucas, em paulistanês, baganas ou guimbas em carioquês -, uma campanha realizada pelo movimento Rio Eu Amo Eu Cuido criou polêmica no mesmo dia em que começou.
A abundante necessidade de chamar a atenção do público para uma questão ambiental, fez com que muita gente se sentisse, invés de consciente com a causa, incomodada com a campanha que diz, entre outras pérolas, “Ninguém gosta de bunda caída. Ainda mais, caída no chão”, em uma tentativa de fazer uma brincadeira entre a bunda do cigarro – que não deve ser jogada no chão – e a bunda das mulheres – que não deve ser caída, já que “ninguém gosta” desse tipo físico.
Assim que foi parar na internet, pelo Facebook do movimento, as críticas começaram a aparecer. O grupo feminista Marcha Mundial das Mulheres repudiou a ação com uma nota no site, publicada nesta segunda-feira: “A campanha que supostamente pretende promover uma “conscientização” ambiental reproduz de maneira violenta a lógica de mercantilização dos nossos corpos, fazendo uma ligação estúpida, machista e quase incompreensível entre o corpo da mulher e a guimba do cigarro”, e sugere uma “contra-campanha”, intitulada “Ninguém gosta de ONG machista que promove a mercantilização dos nossos corpos”.
Segundo Ana Lycia, coordenadora da Rio Eu Amo Eu Cuido, o objetivo dessa ação era causar polêmica. “A campanha é para ser polêmica mesmo, queremos dar visibilidade para algo invisível”, diz, se referindo às bitucas, e não às bundas. “A ideia não era fazer uma campanha machista. Inclusive, os anúncios também têm bundas masculinas, só que ainda não conseguimos publicar na nossa Fanpage no Facebook, porque não deu tempo”.
Além das peças publicitárias, a ação conta com a Mulher Melancia como espécie de embaixadora, que canta um funk que é o jingle da campanha. Curiosamente, não há um Homem Melão, ou nada parecido, para fazer par com a figura feminina que usa o nome da fruta em alusão ao tamanho do seu traseiro. “Ela tem uma bunda enorme. E a bunda grande é um problema, quando se trata do cigarro”, diz Lycia, que explica que a campanha foi pensada porque bituca, em inglês, é cigar butt, e butt, é uma palavra também usada para definir bunda.
Liderado pela Mulher Melancia, um grupo de “popozudas”, como denomina a campanha no Facebook, saiu para distribuir porta-bitucas para as pessoas na praia, no último domingo.”E já que a nossa campanha fala de bunda, as melhores promotoras que poderíamos ter são as nossas queridas popozudas. Queremos que uma equipe de meninas com bumbum grande distribua porta-bundas para os banhistas nas areias do Rio de Janeiro”, era o que dizia o release da ação.
As críticas à ação não passam de moralismo, segundo Lycia. “As pessoas moralizam uma questão porque a gente está falando de bunda, como se isso fosse um problema em um país de carnaval, de praia”, diz. “O público feminino se indignou bastante, achando que é uma campanha machista, sexista. Mas as pessoas não entenderam a questão da campanha”.
Embora o público não tenha entedido, Lycia reconhece que o movimento já está repensando em mudar a estratégia por causa da polêmica. “O movimento está chegando a rever a campanha, pela grande polêmica que está causando”.
Em nota oficial, a Secretaria Especial de Política para as Mulheres (SPM) do Rio de Janeiro também repudiou a campanha. “A Secretaria expressa seu descontentamento e repúdio à campanha da ONG Rio Eu Amo Eu Cuido, que associa o descarte de guimba de cigarro a uma imagem depreciativa da mulher. A secretaria é contra a mercantilização, exploração e exposição da imagem do corpo da mulher nas publicidades ou veículo de mídia. Uma de suas missões é valorizar e reforçar a autoestima e a imagem das mulheres. A campanha em pauta vai contra os valores defendidos pela SPM-Rio que fará esforços para sua retirada dos meios de comunicação”.
Acesse o PDF: A única que está caída é a campanha (El País – 04/02/2014)