A taxa de gravidez na adolescência na América Latina e no Caribe é uma das maiores do mundo, superada apenas em regiões da África, aponta um relatório do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA).
(AFP, 17/10/2018 – acesse no site de origem)
Segundo o documento intitulado “O poder de decidir”, 62 a cada mil jovens com idade entre 15 e 19 anos ficam grávidas na América Latina.
Esse número excede a taxa média de 44 por 1.000 adolescentes grávidas em todo o mundo, e está abaixo apenas das 93 na África Oriental e Austral e 114 na África Ocidental e Central.
“A questão da fecundidade adolescente é um fenômeno que caracteriza a região de alguma forma”, disse à AFP Esteban Caballero, diretor do UNFPA para a América Latina e o Caribe.
Equador (111), Honduras (103), Venezuela (95), Nicarágua (92) e Guatemala (92) têm as taxas mais elevadas, ao contrário do Chile (41), Trinidad e Tobago (38), Curaçao (35), Aruba (35), Bahamas (32) e Martinica (20).
Entre as causas, Caballero observa que “um determinante básico é a falta de acesso a métodos contraceptivos, isso é o mais óbvio”.
Segundo o UNFPA, existem países onde um menor de 18 anos não pode comprar contraceptivos se não tiver a permissão dos pais ou tutor, o que dificulta a aquisição dos métodos mais modernos, como a pílula.
A violência sexista, a falta de educação sexual, principalmente em escolas, e os casamentos precoces são outros fatores que contribuem para o fenômeno. A maternidade na região “começa pouco depois da primeira relação sexual, e as primeiras uniões costumam ser formalizadas perto ou depois de uma gravidez, muitas vezes de maneira involuntária”, ressalta o texto.
– Pobreza, o círculo vicioso –
Segundo a ONU, a gravidez na adolescência é mais comum nos agregados familiares mais pobres e deve-se mais à falta de acesso a métodos contraceptivos do que ao desejo de ter filhos.
Essa situação impede que tenham maior acesso à educação sexual ou à independência econômica, motivo pelo qual são mais vulneráveis a engravidar desde cedo, e isso acaba reproduzindo o círculo da pobreza.
“A gravidez na adolescência aumenta o risco de uma vulnerabilidade durante toda a vida, pois pode acabar com oportunidades de maior educação, emprego e, assim, oportunidades de renda. É um fator de transmissão geracional da pobreza”, disse Caballero.
Além disso, a gravidez indesejada estimula a prática do aborto em condições inseguras e clandestinos, em uma região onde, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), 44 por 1.000 mulheres com entre 15 e 44 anos abortaram entre 2010 e 2014, taxa 9 pontos acima da média mundial.
“As adolescentes que vivem em domicílios mais ricos têm maior acesso a informações sobre saúde sexual e reprodutiva, e maior acesso a serviços de controle de natalidade. Além disso, podem buscar serviços de aborto em condições de segurança, ainda que ilegalmente”, aponta o relatório.
– Consenso e religião –
Para evitar a gravidez precoce, Caballero defende um consenso entre o governo e setores da sociedade civil para estabelecer uma nova abordagem que facilite a educação sexual, o acesso a contraceptivos e o empoderamento das mulheres.
“É uma realidade que existe, mas que nem sempre é reconhecida, e então não a abordamos do ponto de vista da saúde pública, mas tomamos isso do ponto de vista moral”, apontou Caballero.
Mas outro obstáculo possível é a influência da religião, principalmente católica, mas com um grande avanço dos evangélicos, que são contrários ao planejamento familiar e ao uso de métodos contraceptivos ou aborto.
No entanto, Caballero minimiza este aspecto: “Há muitas mulheres que decidiram ter menos filhos e que na maioria dos casos optam pelo uso de contraceptivos modernos, e estas são mulheres que são de diferentes igrejas”, disse ele.