Advogado que propôs ação vê ‘vitória política’ e chance de fazer lei sobre o tema; sentença não vale para casos antigos
(O Estado de S. Paulo, 13/06/2019 – acesse no site de origem)
Especialistas ouvidos pelo Estado destacaram a importância de o Supremo Tribunal Federal (STF) ampliar o conceito de racismo, para criminalizar a homofobia. No entanto, a decisão não agradou a membros da bancada evangélica no Congresso.
“O conceito de raça social é mais amplo, nos aspectos político e social de raça”, diz o advogado Paulo Iotti, proponente das ações. “Racismo é gênero que admite negrofobia, xenofobia, religiofobia e etnofobia.” Para ele, o STF ver omissão do Congresso é uma “vitória política”.
Na prática, não haverá mudança em texto de nenhuma lei, apenas o entendimento do Supremo de que essa deve ser a conduta dos juízes e dos delegados em ocorrências de discriminação por orientação sexual. “A partir da publicação da decisão, todos os juízes e tribunais estão vinculados a esse entendimento. Só que isso não pode retroagir para fatos praticados antes”, diz o especialista do Urbano Vitalino Advogados.
Para o professor de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) Thiago Amparo, “há um histórico de omissão do Legislativo em trabalhar qualquer proteção aos LGBTs” e um sistema de proteção deficitário. “Por um lado, temos leis esparsas em alguns Estados que protegem administrativamente LGBTs. Por outro, temos no âmbito federal uma mora legislativa tanto na falta de lei de antidiscriminação geral que puna civilmente a LGBTfobia, quanto na falta de lei que tipifique a LGBTfobia.”
Sobre a relação entre liberdade religiosa e LGBTfobia, o professor Amparo destacou o entendimento do STF. “Os ministros deixaram muito claro que a literatura religiosa está garantida, principalmente no exercício da liturgia religiosa, qualquer que seja, desde que não se faça manifestações que configurem discurso de ódio.”
Legislativo e religião
Desde o início do ano, a bancada evangélica do Congresso pressionou o STF para que não entrasse na “agenda de costumes”, o que inclui a criminalização da homofobia.Grupos religiosos fizeram campanha nas redes sociais pela retirada do tema de pauta e pela liberdade religiosa. Nesta quinta-feira, 13, o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), uma das lideranças do grupo, disse, no Twitter, que os ministros do STF “usurparam a competência do Legislativo”.
Em maio, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, por 20 votos a 1, projeto que criminaliza a homofobia, mas que faz exceção para garantir a liberdade religiosa. O relator, senador Alessandro Vieira (PPS-SE), acrescentou trecho que veda a restrição de manifestação “de afetividade em local público ou privado aberto ao público”, mas determinou que a regra não vale para templos religiosos. Ainda serão votadas na CCJ emendas ao texto do projeto.
Juliana Diógenes, Tulio Kruse e Jéssica Otoboni