Bolívia descriminaliza aborto para mulheres que tenham dependentes

29 de setembro, 2017

Nova lei elimina a pena em diversos casos, mas ainda considera interrupção da gravidez um delito

(El País, 29/09/2017 – acesse no site de origem)

A Câmara dos Deputados da Bolívia aprovou nesta sexta-feira o artigo 153 de um novo Código Penal que vinha sendo discutido nos últimos dias e descriminalizou vários casos de aborto sob diferentes circunstâncias. Ao mesmo tempo, a lei continua considerando a interrupção da gravidez como um delito e punindo-a com até três anos de prisão.

O Código Penal anterior não punia os abortos depois de estupro ou quando existia risco para a saúde da mãe. O atual declara agora também isentos de sanções os abortos que, sendo praticados antes das oito semanas de gravidez, tenham sido decididos por mulheres que sejam estudantes ou tenham sob seus cuidados crianças, idosos ou pessoas deficientes. O artigo estabelece também que o aborto praticado por adolescentes não receberá nenhuma punição em nenhuma etapa da gravidez.

A norma obriga também os serviços públicos de saúde a fazer aborto nas mulheres que pedirem o procedimento e cumpram os requisitos explicitados, sem poder “alegar objeção de consciência”. A objeção de consciência é reconhecida unicamente de forma “individual” ao pessoal médico e tem de ser manifestada com antecedência. Além disso, não tem validade em caso de risco de morte para a mãe. A questão foi um tema importante no debate prévio à aprovação desta norma, já que várias associações médicas anunciaram que se ateriam a ela para bloquear na prática a planejada ampliação dos casos legais de aborto.

A Ordem dos Médicos atuou em coordenação com os bispos católicos para se opor ao projeto desta lei, que foi apresentado pelo governista Movimento ao Socialismo. Embora o Estado tenha sido declarado laico em 2009 e os abortos terapêuticos sejam permitidos desde os anos setenta, a influência das igrejas sobre a população boliviana é muito forte.

Inicialmente, os parlamentares defensores da reforma quiseram suspender o direito dos médicos e profissionais da saúde de se recusarem a realizar abortos, mas isto foi considerado contrário aos direitos constitucionais deles. Por fim, a Câmara redigiu o texto que foi aprovado e permite a objeção de consciência, desde que seja individual e não coletiva, e ao mesmo tempo obriga os serviços de saúde a formar unidades com pessoal disposto a fazer o trabalho requerido pelas mulheres que se enquadrarem na lei.

Outro ponto de discussão foi a inclusão da pobreza como condição suficiente para suspender a punição ao aborto. Os parlamentares reformistas queriam fazer isso, mas a questão foi alvo dos ataques dos favoráveis à criminalização, que os acusaram de usar o aborto como mecanismo de controle da natalidade. No final, o requisito da condição socioeconômica foi eliminado, embora se mantenha implícito na descriminalização do aborto das mulheres com idosos, deficientes ou crianças sob seus cuidados.

O debate desta lei causou uma forte polarização na sociedade boliviana e é improvável que tivesse passado sem a maioria que os governistas têm no Congresso. No entanto, a questão também dividiu os seguidores do presidente Evo Morales, que não se pronunciou sobre o tema, mas vários parlamentares da oposição respaldaram a emenda, que o movimento feminista local considera “insuficiente”, mas também “um passo adiante”.

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