Acreditava-se que única via de entrada era a proteína AXL, mas cientistas perceberam que estavam errados
(O Globo, 01/12/2016 – acesse no site de origem)
Até agora, os estudos sobre zika e microcefalia mostravam que o vírus conseguia entrar nas células reponsáveis pelo desenvolvimento do cérebro porque se ligava a uma proteína chamada AXL, existente na superfície dessas células. Entretanto, um estudo conduzido pela Universidade Harvard, nos EUA, e publicado nesta quinta-feira na revista “Cell Stem Cell”, mostra que o vírus da zika consegue invadir as células cerebrais mesmo sem essa proteína. Isto é, a AXL não é a única via de entrada para a infecção por zika.
As tais células responsáveis pela geração de neurônios e pela construção do cérebro à medida que o embrião se desenvolve são chamadas de células progenitoras neurais ou NPCs. De acordo com a pesquisa, mesmo quando essas células não produzem a proteína AXL em sua superfície, o vírus da zika consegue atacar.
— Nosso achado realmente recalibra esse campo de pesquisa, porque nos diz que ainda temos que descobrir como o zika está entrando nessas células — disse Kevin Eggan, um dos autores e professor principal do Instituto de Células-Tronco de Harvard (HSCI, na sigla em inglês) e de biologia regenerativa na mesma universidade.
INIBIR PROTEÍNA NÃO É SUFICIENTE PARA PÔR FIM À EPIDEMIA
Se, antes, a ideia de muitos laboratórios era impedir a entrada do vírus da zika nas células apenas por meio da inibição do contato com essa proteína, agora os cientistas de Harvard dizem que se for feito apenas isso, não será suficiente para acabar com a epidemia de microcefalia
— É muito importante para a comunidade científica saber que a segmentação da proteína AXL por si só não vai ser suficiente para acabar com as infecções por zika — destacou Ajamete Kaykas, investigador sênior em neurociência no Novartis Instituto de Pesquisa BioMedical, instituição que também participou da pesquisa.
— Estávamos pensando que as células NPCs que não tinham AXL não seriam infectadas. Mas vimos que essas células são tão infectadas quanto as células normais — sublinhou Max Salick, pesquisador do NIBR e co-primeiro autor do artigo.
‘NO INÍCIO DA PESQUISA, MINHA MULHER ESTAVA GRÁVIDA’
Trabalhando em uma instalação dedicada à pesquisa de doenças infecciosas, os cientistas expuseram culturas de células bidimensionais de NPCs sem a proteína AXL ao vírus da zika. E compararam com o contato de células com a AXL, em contato com o vírus. Em ambos os casos, as células mostraram claramente infecção por zika. Esta descoberta foi apoiada por um estudo anterior que inibiu a expressão da AXL no cérebro de camundongos.
Os pesquisadores de Harvard e do NIBR começaram a trabalhar com o vírus em meados de abril de 2016, apenas seis meses antes de começarem a publicar suas descobertas. Esta velocidade incomum de investigação reflete a urgência do desafio global frente ao zika, uma vez que o vírus já se espalhou para mais de 70 países e territórios.
— No início da pesquisa, minha mulher estava grávida — observou Kevin Eggan. — Eu não podia ler os jornais sem me preocupar.