(Folha de S.Paulo, 24/07/2016) A preocupação crescente a respeito do zika destaca uma realidade assustadora: o mundo continua mal preparado para enfrentar um vírus que se alastra rapidamente.
Na última década, o ebola, a gripe aviária, a gripe suína e outras pandemias demonstraram nosso grau de vulnerabilidade quando surtos de grande proporção começam em um país em desenvolvimento, com sistema de saúde precário.
As pandemias são uma ameaça à segurança global e requerem uma resposta verdadeiramente global.
Isso está a ponto de acontecer. O mundo agora já pode enviar dinheiro, equipes médicas e medicamentos para salvar vidas em qualquer dos 77 países mais pobres, a fim de impedir que um surto de grandes proporções se espalhe.
O recém-criado Mecanismo de Financiamento para Emergências Pandêmicas alavanca fundos de países ricos, mercados de capital e empresas de resseguro para, se necessário, preparar uma resposta rápida e antecipada a algum surto de potencial pandêmico -e a uma fração do custo da ação tardia.
Esse mecanismo, que estará em pleno funcionamento no fim deste ano, desembolsará fundos mais rapidamente de duas formas.
Primeiro, abrirá um mercado de seguro inteiramente novo, contra riscos pandêmicos. Os países de baixa renda serão cobertos contra certos tipos de vírus que podem causar a maioria dos surtos mais severos, incluindo o ebola.
Segundo, no caso de um surto emergente ou de tipos mais imprevisíveis, para os quais não haja disponibilidade de dados, tais como o Zika, o mecanismo poderá utilizar a verba para acionar uma resposta mais rápida.
De qualquer forma, isso significa que não precisaremos mais depender de deliberações políticas, inevitavelmente lentas, ou de apelos para angariar recursos, como pedidos de donativos.
Se esse instrumento existisse em 2014, durante o surto de ebola na África Ocidental, poderíamos ter mobilizado US$ 100 milhões até julho deste ano para acelerar a resposta. Sem ele, o financiamento somente começou a aparecer três meses depois de constatado o surto.
Além de fechar uma lacuna crítica de financiamento, o mecanismo servirá de base para a construção de um sistema global de redução de riscos pandêmicos.
Há uma grande probabilidade de que o mundo sofra um forte surto nos próximos dez ou 15 anos. Uma análise econômica recente sugere que o custo global anualizado de uma pandemia, de grau moderadamente severo a severo, é de aproximadamente US$ 570 bilhões -ou 0,7% da renda global.
Não conseguimos mudar a velocidade de um furacão ou a magnitude de um terremoto, mas podemos alterar a trajetória de um surto. Com um sistema global de prontidão para levar fundos ao local certo no tempo certo, temos o potencial de salvar milhares, ou talvez milhões, de vidas e proteger a economia global contra perdas superiores a trilhões de dólares.
Jim Yong Kim, médico e antropólogo, é presidente do Grupo Banco Mundial. Foi diretor do departamento de HIV da OMS (Organização Mundial da Saúde)
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