(O Estado de S. Paulo, 16/02/2016) Segundo médicos, procedimento vem sendo cada vez mais procurado por mulheres que querem adiar a gravidez
Solteira aos 35 anos, a cirurgiã-dentista Camila Maitto não sabia quando ia encontrar o par perfeito, mas quis optar por uma espécie de previdência para a maternidade, como ela mesma diz. ”Minhas irmãs são médicas, meu pai também, fomos chegando a um consenso de que optar pelo congelamento de óvulos seria o mais adequado”, diz.
Agora, aos 37, está casada e planeja o primeiro filho para este ano. Se o método natural não der certo, já tem mais chances. Camila congelou sete óvulos. “Nunca descartei a possibilidade de ter um filho”, afirma. “A opção pelo congelamento me deu uma tranquilidade emocional muito grande”.
Ainda que não haja estatísticas no Brasil, especialistas afirmam que as mulheres têm buscado cada vez mais a técnica com o intuito de adiar a gravidez. “Nos últimos anos, aumentou assustadoramente a procura de mulheres que querem congelamento de óvulos”, diz Mario Cavagna, presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH).
O aumento da procura tem sido atribuído pelos médicos principalmente à entrada mais tardia da mulher no mercado de trabalho. Algumas empresas, como a Apple e o Facebook, oferecem o procedimento para as funcionárias nos Estados Unidos. Em nota, o Facebook informou que o congelamento de óvulos está coberto para todos os trabalhadores norte-americanos desde 2014. Não há previsão de o benefício chegar ao Brasil.
Para os especialistas, o problema é que muitas mulheres têm optado pelo procedimento após os 40 anos. A idade ideal para recorrer ao procedimento é até os 35. “Dos 35 ao 40, ainda há chances de gravidez, mas a qualidade do óvulo já diminui bastante”, afirma. A partir dos 40, o médico não recomenda o congelamento de óvulos. Nesta faixa etária, além de a probabilidade de gravidez ser menor, há maiores riscos de o bebê ter alguma síndrome genética devido a alterações cromossômicas.
Consciente de que a fertilidade cai após os 35 anos, a médica Cristiane Pires também optou pelo congelamento de óvulos assim que se separou, no ano passado, aos 37 anos. “O ideal seria se eu tivesse decidido fazer isso antes, mas não deu”, diz. A quem planeja o procedimento, ela aconselha a opção por um bom especialista e alerta que a técnica pode gerar ansiedade. “Você precisa usar medicamento, custa caro, depois espera para ver se teve uma boa resposta. Emocionalmente, não é tão fácil”, explica.
Veja perguntas e respostas sobre o procedimento:
Em que casos o congelamento de óvulos é indicado?
Há três indicações principais para o congelamento de óvulos. A principal indicação médica é para mulheres que têm diagnóstico de câncer e vão precisar se submeter a tratamento. “A gente não sabe o quanto a quimioterapia e radioterapia podem ser prejudiciais para uma reprodução no futuro”, explica Daniel Zylbersztejn, médico do setor de Reprodução Humana da Escola Paulista de Medicina da Unifesp.
O procedimento é recomendado também para mulheres que têm histórico de menopausa precoce na família. “Neste caso, é bom pensar em fazer o recolhimento dos óvulos porque o tempo reprodutivo pode ser curto”, defende.
A outra indicação é justamente para mulheres que, por motivos pessoais, querem adiar a gravidez. “Como a fertilidade da mulher é extremamente dependente da idade, o congelamento de óvulos é mais uma opção para o futuro”, afirma Cavagna.
Existe uma idade máxima para congelar os óvulos?
O ideal é que o procedimento seja feito até os 35 anos da mulher. A Sociedade Brasileira de Reprodução Humana contraindica o congelamento de óvulos por motivos sociais com 44 anos ou mais.
Por quantos anos um óvulo pode ficar congelado?
Segundo Luiz Eduardo Albuquerque, diretor do centro de reprodução humana Fertivitro – SP, a medicina ainda não definiu um limite de tempo máximo para a utilização dos óvulos. “Teoricamente, não é o tempo de congelamento que faz com que o óvulo sobreviva ao congelamento ou não, mas a técnica”, diz. Na prática, em geral, os óvulos têm ficado congelados por até 10 anos.
Quantos óvulos a mulher deve congelar?
O ideal é que a mulher congele ao menos 12 óvulos, mas a idade ainda é o fator mais importante a ser considerado. “É melhor ter 6 óvulos congelados aos 32 do que 15 aos 40”, afirma Cavagna.
Quais são os principais métodos de congelamento?
O principal método de congelamento atualmente é a vitrificação. “Na técnica, em poucos segundos, o óvulo atinge a temperatura do congelamento”, afirma Cavagna. De acordo com o especialista, a rapidez do processo impede a formação de cristais de gelo no interior da célula.
Como é o procedimento?
Antes do procedimento, a paciente precisa ser submetida a uma série de injeções diárias de hormônio para promover o crescimento dos folículos. O tratamento dura entre 10 e 12 dias.
Depois, a mulher recebe outra injeção para acabar de amadurecer os folículos até que 36 horas depois, a equipe médica faz a aspiração dos folículos para coletar os óvulos. “A aspiração é feita em ambiente cirúrgico, com sedação. A coleta é feita por ultrassonografia transvaginal”, esclarece Cavagna.
Qual é o custo médio do congelamento de óvulos?
Segundo os especialistas, todo o processo, que inclui o procedimento e os medicamentos, pode custar de R$ 10 mil a R$ 18 mil. Além disso, há uma manutenção dos óvulos, que gira em torno de R$ 1,2 mil ao ano. Depois, ainda há gastos com o descongelamento, a formação do embrião e a fertilização.
O congelamento de óvulos não está disponível pelo Sistema Único de Saúde. Em São Paulo, o Hospital Pérola Byington oferece o procedimento apenas para mulheres que têm indicações médicas.
Qual é a taxa de sucesso do procedimento?
O congelamento de óvulos não garante a gravidez no futuro. Isso porque o óvulo ainda precisa ser descongelado, fertilizado e implantado no útero. Segundo Cavagna, uma mulher que tenha congelado cerca de 20 óvulos antes dos 35 anos tem chance de aproximadamente 80% de ter o bebê. A probabilidade diminui quando a mulher opta pelo procedimento mais tarde.
Há algum risco de o bebê fruto de um óvulo congelado ter algum problema genético ou de saúde por causa do procedimento?
De acordo com Raul Nakano, diretor clínico da Ferticlin, o procedimento não traz nenhum risco a mais para a saúde do bebê. “A chance de a criança ter algum problema genético é a mesma, independentemente da forma como o bebê foi gerado, se de forma natural ou por fertilização”, diz.
Raul Nakano, diretor-clínico da Ferticlin, também nota o aumento. “Há uns 5 anos, vinha uma paciente por mês ou a cada 2 meses com esse intuito. Agora, há pelo menos uma por semana”, diz. Já no Grupo Huntington, foram feitos 173 congelamentos em 2015, o que representou um crescimento de 28,9% em relação a 2014.
Maria Eduarda Chagas
Acesse no site de origem: Especialistas tiram dúvidas sobre congelamento de óvulos (O Estado de S. Paulo, 16/02/2016)