(IPS) “Politicamente incorreto na hora de negociar votos e alianças com a direita, a despenalização do aborto saiu do plano de Direitos Humanos do governo brasileiro e do debate eleitoral, inclusive entre os candidatos mais abertos ao tema”, escreve a repórter Fabiana Frayssinet, da agência de notícias IPS.
A jornalista refere-se ao recuo do governo, que resolveu revisar o texto do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH3) depois da chuva de críticas liderada pela Igreja Católica contra alguns pontos mais polêmicos do plano, como a descriminalização do aborto e a união civil de homossexuais. O ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos – que liderou o processo de elaboração do PNDH, chamou de “saudável retrocesso”.
“São pressões oportunistas, no contexto da disputa para as eleições presidenciais de outubro, de setores conservadores situados na cúpula da estrutura de poder vigente”, declarou Kauara Rodrigues, assessora das áreas de saúde, direitos sexuais e reprodutivos, do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).
Segundo apurou a reportagem, em uma audiência na Câmara dos Deputados, o ministro Vannuchi afirmou que tentará incorporar ao texto as recomendações da Organização das Nações Unidas sobre a despenalização do aborto. Assim, ressaltará que se trata de um assunto de utilidade pública e que as leis proibitivas jamais resolveram o problema do aborto em nenhum país.
Embora destaque como ponto positivo a manutenção da linguagem da ONU, Beatriz Galli, da organização internacional Ipas, descartou que, no Congresso, seja reincorporada uma referência explicita à despenalização. Galli atribuiu o recuo do governo às pressões próprias de um ano eleitoral. A aprovação de um tema tão polêmico seria um erro estratégico para seus interesses, por isso a questão é igualmente evitada pelos candidatos presidenciais.
Dilma Roussef (PT) “agora não se refere ao aborto, embora no ano passado afirmasse que ‘abortar não é fácil para nenhuma mulher’, e que duvidava que ‘isso possa justificar a falta de legalização’.”
José Serra (PSDB) “tampouco menciona o aborto, apesar de como ministro da Saúde ter influenciado na aprovação de uma lei que orienta os profissionais da saúde sobre a interrupção da gravidez em razão de violência sexual”.
Marina Silva (PV) “segue com sua postura ambígua. Qualifica o aborto como tema ‘complexo’ vinculado à espiritualidade e, ao mesmo tempo, propõe que a sociedade civil deve debater como trata-la e também um plebiscito”.
Nilcéa Freire (ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres) disse por meio de sua porta-voz ela “não está se pronunciando sobre o tema”.
Aborto em números
No Brasil, há pelo menos um milhão de abortos clandestinos por ano, que levam a 250 mil atendimentos em centros públicos de saúde para tratar complicações decorrentes a realização de abortos em condições inseguras, hoje uma das quatro primeiras causas de morte materna no país.
Pesquisa do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro revela que o risco de morrer por aborto é 2,5 vezes maior entre as mulheres negras do que entre as brancas. “As mulheres negras são mais vulneráveis. Não têm recursos para ir a clínicas clandestinas e usam métodos perigosos de aborto, que aumentam os riscos e as complicações”, afirmou Mario Monteiro, coautor do estudo, à reportagem da IPS.
Leia na íntegra: Brasil abre a agenda eleitoral e fecha a do aborto (IPS – 03/05/2010)
Indicação de fontes:
Beatriz Galli – advogada e integrante do Cladem e do Ipas
Cladem (Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher) e Ipas
Rio de Janeiro/RJ
Tel.: (21) 2532-1930 / 2532-1939 – [email protected]
Fala sobre: direitos humanos; direito ao aborto; direitos reprodutivos
Margareth Arilha – psicóloga e coordenadora da CCR
CCR – Comissão de Cidadania e Reprodução
São Paulo/SP
11 5575-7372 – [email protected]
Fala sobre: direitos reprodutivos e direito ao aborto
Osmar Ribeiro Colas – médico ginecologista e obstetra
Comissão de Violência Sexual e Interrupção da Gestação Prevista por Lei da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia); Unifesp – Casa da Saúde da Mulher Prof. Domingos Delascio
São Paulo/SP
11 5573-4919 9978.1111 – [email protected]
Fala sobre: serviços de aborto legal; violência sexual