(Thomaz Rafael Gollop, para o Blog do Noblat) A anencefalia caracteriza o feto que não tem a caixa craniana nem a maior parte do encéfalo. É uma anomalia congênita grave que acarreta, em todos os casos, absoluta incompatibilidade com a vida.
O anencéfalo é um natimorto cerebral (de acordo com o CFM), que pode ter uma sobrevida vegetativa por, no máximo, alguns dias ou semanas, mas a sua morte é inexorável.
O diagnóstico ultrassonográfico de anencefalia, que é 100% seguro, pode ser realizado com 12 semanas de gravidez. É um exame fácil de ser feito e está disponível no SUS.
Além disso, a literatura médica refere graves riscos nessas gestações: em 50% dos casos há excesso de líquido amniótico com consequente hiperdistensão do útero, o que pode dificultar sua contração depois do parto e levar a grandes hemorragias; em 18% dos casos a gravidez se prolonga além do prazo normal; 25% dos fetos anencefálicos estão em posição anormal, o que causa dificuldades no parto (essa situação é seis vezes mais frequente do que em gestações normais); e a placenta pode descolar-se da parede uterina três vezes mais frequentemente do que em gestações normais.
Sem falar no imenso sofrimento psicológico que as gestantes enfrentam nessa situação.
O Brasil é o quarto país do mundo em frequência de casos de anencefalia. Ela ocorre em 1 para cada 1.000 nascidos vivos em razão de múltiplos fatores: sazonais, geográficos, nutricionais e genéticos.
As políticas públicas que determinam o uso de 4 mg de ácido fólico um mês antes e nos dois primeiros meses da gravidez para reduzir a ocorrência desses casos são extremamente importantes. Entretanto, apenas metade deles está relacionada com deficiência de ácido fólico na gestante.
É por tudo isso que, desde 1989, juízas e juízes brasileiros têm concedido autorização para a antecipação terapêutica do parto nesses casos, possibilitando, assim, que a mulher receba assistência adequada, médica, de enfermagem e psicológica, em qualquer hospital.
Todavia, essas autorizações podem demorar – e podem até ser negadas -, pois ficam na dependência da convicção de cada juiz.
O que se pretende com a ADPF 54 é que o STF declare que a antecipação do parto é um direito da gestante, que não deve precisar de autorização judicial para receber a assistência médica.
A eventual decisão favorável do STF possibilitará adequada assistência médico-hospitalar para as mulheres que desejarem interromper a gravidez. E, àquelas que optarem por mantê-la, serão igualmente acolhidas no serviço público ou privado de saúde.
Thomaz Rafael Gollop é médico ginecologista e obstetra, especialista em Medicina Fetal. É professor livre-docente da Faculdade de Medicina de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.
Acesse em pdf: Anencefalia: aspectos médicos, por Thomaz Rafael Gollop (Blog do Noblat – 10/04/2012)