“O aborto é um direito fundamental da autonomia da mulher”, diz Barroso

Ativistas vão às ruas do centro do Rio de Janeiro em marcha pela legalização do aborto na América Latina. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

Ativistas vão às ruas do centro do Rio de Janeiro em marcha pela legalização do aborto na América Latina. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

27 de março, 2024 AzMina Por Carolina Oms, Ester Pinheiro e Joana Suarez

Presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, ressalta que nenhum país desenvolvido criminaliza o aborto, e defende que as mulheres não devem ser presas por isso 

“Que tipo de política pública praticamos aqui com a criminalização [do aborto] que nenhum país desenvolvido adota?”, argumenta o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso. Ele participou de uma entrevista coletiva em inglês, com jornalistas estrangeiras sobre direitos reprodutivos, em São Paulo, no último Dia Internacional da Mulher, 8 de março. E fez questão de enfatizar: “nenhum país democrático e desenvolvido no mundo criminaliza o aborto.”

O encontro de Barroso com profissionais do mundo todo para falar dos direitos das mulheres brasileiras fez parte de um Media Tour, programa organizado pelo Instituto AzMina em parceria com a Women’s Equality Center (WEC) e a International Women’s Foundation (IWMF). A iniciativa apoiou 7 jornalistas de diferentes países para contarem histórias sobre justiça reprodutiva, com foco em aborto legal e ilegal no Brasil, e, assim, difundir o tema globalmente.

Na avaliação de Barroso, o aborto é um direito fundamental da mulher e faz parte dos direitos sexuais e reprodutivos. Citando particularmente como a criminalização afeta as mulheres pobres, o presidente do STF é a favor da descriminalização do aborto no país. Mas, antes de pautar novamente a discussão no Supremo – por meio da ADPF 442 -, Barroso acredita que é preciso esclarecer socialmente a percepção “equivocada” sobre o assunto. Leia a entrevista completa abaixo:

*Saiba mais sobre direitos reprodutivos e veja os dados atualizados na plataforma abortonobrasil.info, lançada em 2023 pelo Instituto AzMina com apoio do Instituto Anis de Bioética e organizações feministas do selo Futuro do Cuidado.

Jornalistas estrangeiras: A descriminalização do aborto é uma pauta urgente?

Ministro Luís Roberto Barroso: Acho que é um assunto muito importante. Ainda assim, atualmente, acredito que a sociedade brasileira não tem plena consciência do que realmente está em jogo quando discutimos aborto. A questão não é se você é contra ou favorável ao aborto, mas: você acha que uma mulher deveria ser presa? Você acha que ela não deveria ter o direito de ir para o sistema público de saúde? É por isso que ainda não agendei esse julgamento, porque acho que deveríamos discutir isso na sociedade e fazer com que as pessoas entendam qual é a verdadeira questão em jogo.

O aborto deve ser evitado, ninguém acha que é uma coisa boa. Então o papel do Estado é evitar o aborto, dando educação sexual, distribuindo contraceptivos, e apoiando a mulher que queira ter um filho e que esteja em condições desfavoráveis. Dito isto, a criminalização do aborto é uma má política pública.

As pessoas precisam entender que você pode ser contra o aborto, pode optar por não fazê-lo, mas não pode querer colocar na cadeia essa mulher que teve que fazer ou queria fazer. Eu tento abrir esse debate com a sociedade brasileira, mas nem sequer tenho a certeza se a maioria do Tribunal apoiará esta posição. Em todos os países, os Supremos Tribunais podem tomar decisões contra majoritárias. Apesar disso acontecer, normalmente não o fazem, pois querem estar alinhados com a sociedade. Este é o tipo de preocupação que tenho agora.

Jornalistas: Considerando a complexidade do tema, quando a descriminalização pode ser uma realidade no Brasil?

Barroso: Não faço ideia. Depende desse debate se fortalecer e até conversar com os religiosos e fazer com que eles entendam a minha posição. Porque a percepção atual, de que quem apoia a descriminalização é a favor do aborto, é equivocada. Não é verdade, só é uma política pública ruim, porque impacta, acima de tudo, mulheres pobres.

Alguém dirá: “não são muitas mulheres que são condenadas por aborto”. Existem alguns casos, porque eu já dei habeas corpus para uma mulher que estava presa. Porém, a principal consequência da criminalização é que as mulheres pobres não podem ir ao sistema público de saúde para obter assistência, [acessar] o procedimento, informações e medicamento adequado. Então o que acontece é que elas tentam fazer isso sozinhas, comprometendo a saúde, e há casos de pessoas que morrem em decorrência de procedimentos feitos indevidamente.

Tenho alguns motivos para ter a minha posição, primeiro, acho que é um direito fundamental da mulher. Segundo, que pesquisas mostram que a criminalização não diminui o número de casos de aborto. Isso é muito injusto com as mulheres pobres porque se você tiver dinheiro, como pessoas da classe alta no Brasil, é possível ir para um país onde o aborto é legal, ou onde há clínicas privadas que fazem, ou podem ter acesso aos medicamentos adequados.

Acesse a entrevista no site de origem.

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