(Jornal de Brasília, 28/03/2016) Primeiro laboratório a desenvolver uma vacina contra a dengue, a empresa francesa Sanofi Pasteur quer aproveitar a experiência para sair na frente no processo de desenvolvimento de um produto contra o vírus zika. Chefe do programa de pesquisa e desenvolvimento da vacina contra dengue da companhia, Nicholas Jackson esteve recentemente no Brasil para definir detalhes sobre o processo. Em entrevista exclusiva, ele revelou que os testes em animais devem começar até junho.
Em fevereiro, a Sanofi Pasteur anunciou que iniciará pesquisas de uma vacina contra o zika. Como está este processo?
Temos a experiência de três vacinas contra flavivírus: febre amarela, encefalite japonesa e, agora, dengue. Podemos usar a força, a experiência e a infraestrutura acumuladas também contra o zika e nos colocar numa posição que possibilitaria um avanço muito rápido. Sobre o zika, provavelmente estamos olhando a ponta do iceberg. Existe um potencial de que ele cause sequelas mesmo em crianças sem sintomas. A microcefalia é muito fácil de ver, mas existe uma preocupação de que crianças que parecem saudáveis desenvolvam problemas neurológicos por causa do zika. Há uma grande necessidade de investigar cuidadosamente essa doença.
E quando os testes da vacina deverão ser iniciados?
Estamos em uma fase muito inicial da pesquisa e o próximo passo seria ter os estudos apropriados para animais, para certificar a segurança do produto. Esperamos iniciar os estudos em animais na primavera (do Hemisfério Norte, que vai de março a junho).
Pretendem pular algumas etapas do processo por causa dessa expertise em outras vacinas?
Temos de seguir todas as etapas, mas podemos fazer trabalhos em paralelo. Podemos usar a tecnologia da ChimeriVax (vacina contra encefalite japonesa) para trabalhar em uma vacina contra o zika.
Como será o caminho para o desenvolvimento da vacina?
Definimos um plano, que precisa ser avaliado pelas agências regulatórias porque, para avançarmos rápido, ele precisa ser agressivo. Olhando para os estudos pré-clínicos de segurança, será um esforço substancial com modelos animais e precisamos do engajamento das agências regulatórias e de especialistas para ter certeza de que nosso plano é robusto e nos permitirá ir de forma confiável para os estudos clínicos (com humanos). Considerando que a ChimeriVax foi testada em 15 mil indivíduos e a Dengvaxia (vacina contra a dengue), em 45 mil, temos 60 mil pessoas nas quais essa tecnologia foi atestada segura, isso é muito importante. A vacina contra o zika vai usar a mesma tecnologia da ChimeriVax.
Em quanto tempo poderíamos ter uma vacina contra o zika?
É muito cedo para dar datas precisas. O que posso dizer é que devemos ser capazes de cortar anos de um processo normal. O desenvolvimento de uma vacina pode levar dez anos, mas esse prazo é muito longo para o vírus zika em um contexto de emergência. O potencial dessa doença em devastar famílias e comunidades é muito real.
A Anvisa deu registro para a Dengvaxia no Brasil, mas especialistas criticam o fato de ela não ter alta eficácia contra todos os tipos de vírus da dengue…
Quando não há tratamento específico para a doença, quando há dificuldades de controlar o mosquito e ausência de qualquer outra vacina, o índice que temos, de 66% de eficácia, atende a uma grande necessidade de saúde. Temos evidências de que a vacina pode prevenir 80% das hospitalizações. Então não concordo que essa vacina não tenha potencial de atender às necessidades médicas. Em São Paulo, onde você teve um grande surto de dengue, as autoridades tiveram de usar tendas para atender às pessoas. Se você pode prevenir 80% dos casos de hospitalização, é um enorme ganho para a saúde pública.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Fabiana Cambricoli
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