O pesquisador Alexandre Grangeiro, do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, concedeu entrevista exclusiva à Agência Patrícia Galvão em que fala sobre a Campanha de Carnaval de 2010 e faz críticas à política de prevenção adotada pelo Ministério da Saúde para atingir os segmentos considerados mais vulneráveis à epidemia de HIV/Aids.
A seguir, alguns destaques da entrevista (clique nos links para assistir aos trechos):
As campanhas são mais importantes para criar um ambiente favorável à prevenção da Aids do que para aumentar a informação
“No Brasil criou-se uma cultura de fazer uma campanha de Aids no carnaval; isso facilita a discussão, facilita a assimilação.” (…)
“O carnaval é um momento propício para falar sobre prevenção de Aids, falar sobre sexualidade. A sociedade, de uma certa forma, está mobilizada.”
“Não é ruim fazer uma campanha no carnaval e para um grupo específico; o ruim é fazer a campanha só no carnaval e abordando uma única população. Se ela for parte de uma estratégia de prevenção que se soma a outras ações, que vá gradativamente envolvendo toda a sociedade, ela é boa.”
Ações de prevenção revelam-se insuficientes
“Desde 1980, no Brasil, todas as pesquisas começaram a demonstrar que o uso do camisinha aumentava. As últimas pesquisas, realizadas em 2008 e 2009, começaram a demonstrar uma tendência ao contrário, esse percentual [de uso do preservativo] vem se reduzindo. Isto pode estar demonstrando uma série de questões.”
Camisinha tem que ser distribuída e vendida em todos os lugares
“Sinal vermelho: as pesquisas estão mostrando que está reduzindo a parcela da população que usa preservativo. Hoje, os pontos de distribuição e venda de preservativos são insuficientes. Tem que ter preservativo na balada. Tem que ter preservativo na esquina.”
Se meninas de 13 a 19 anos estão com Aids, significa que elas se infectaram aos 8, 12 ou 14 anos
“As meninas se infectaram – por conta do período de encubação – mais cedo do que efetivamente adoeceram. Esses casos estão demonstrando que há um início de relação sexual desprotegida, não só em relação ao preservativo, mas também em relação à informação, aos cuidados com o corpo e, provavelmente, sem capacidade de dialogar com seu parceiro.”
O preconceito e o estigma contribuem para aumentar o risco e o número de casos entre gays jovens
“Quando a gente compara a população homossexual com qualquer outra população, [vemos que] é a que mais usa preservativo, é a que tem maior nível de conhecimento, é a que mais se mobiliza contra o preconceito; entretanto, esse grupo continua se infectando mais do que a população em geral (…) e a única faixa etária [em que a epidemia] tem crescido são a dos homossexuais jovens.”
Preservativo e diálogo: a combinação mais eficaz
“Eu diria que o preservativo é o principal instrumento, é o instrumento mais eficaz; mas sem conversa nem se consegue usar o preservativo. (…) O uso do preservativo [pressupõe] o diálogo entre duas pessoas, significa o acordo entre duas pessoas.”
“O foco principal de uma prevenção da Aids é que as pessoas conversem, dialoguem, e, ao dialogar, decidam a melhor forma de fazer a prevenção.”
O sistema de saúde não está atento para a prevenção da Aids entre as mulheres
“[Nos serviços de saúde] a mulher não é questionada sobre Aids, embora as mulheres estejam mais presentes no serviço de saúde. (…) Ela não consegue se identificar no risco de Aids, e quando ela não se identifica no risco de Aids ela não faz o diálogo em relação à Aids.”
Paradoxo: a população jovem é a que mais usa o preservativo, mas é também a que mais deixa de usar quando há envolvimento afetivo
“A população jovem é a que mais usa preservativo em comparação as outras faixas. A iniciação sexual com preservativo é altíssima no Brasil. (…) Hoje quem tem 20 anos já conheceu a Aids, talvez com menor intensidade do que quem tem 40 anos. (…) Talvez não conheça de fato a gravidade da Aids, (…) mas ao mesmo tempo essa é uma geração que nasce num período em que é mais natural utilizar [o preservativo].”
Para contatar o entrevistado:
Alexandre Grangeiro – médico e pesquisador
Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP
São Paulo/SP
Tel.:
Fala sobre: políticas de prevenção ao HIV e tratamento de Aids; pesquisas epidemiológicas; segmentos vulneráveis
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