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Guacira de Oliveira
– socióloga do Cfemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria) e integrante da Articulação de Mulheres Brasileiras
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Articulação de Mulheres Brasileiras
NOTA PÚBLICA pela imediata revogação da Medida Provisória nº 557 e em defesa da Maternidade Livre e da Autonomia das Mulheres e da Política de Atenção Integral à Saúde das Mulheres
Vimos a público expressar nossa indignação e repúdio ao conteúdo da Medida Provisória nº 557, assinada em 26/12/11 pela presidente Dilma Roussef e pelos ministros Alexandre Padilha, Guido Mantega e Miriam Belchior, tendo sido publicada no Diário Oficial da União no dia seguinte. Com essa Medida, o governo federal cria um cadastro nacional obrigatório para toda mulher gestante e puérpera (mulheres que pariram recentemente), sob a falsa justificativa de prevenir a morte materna no país.
- Consideramos que a mortalidade materna é um problema crucial, e que demanda mais recursos, mais médicos, mais informação, mais tratamento especializado. O controle e a vigilância precisam ser feitos sobre os serviços de saúde e não sobre as mulheres.
- A Medida Provisória 557 atenta contra a democracia. Todas/os sabemos que medidas provisórias, por não não permitirem resoluções construídas democraticamente, deveriam ser usadas exclusivamente para questões de justificada urgência. O que não é o caso.
- A MP 557 foi editada no período de recesso do Congresso Nacional e sem debate com organizações da sociedade civil que, há décadas, têm contribuído para a formulação de políticas públicas no campo da saúde da mulher.
- A voz das mulheres comprometidas nesse debate durante o Governo Dilma está sendo desconsiderada por esta Medida, assim como têm sido desconsideradas todas as críticas consistentes que organizações do movimento feminista brasileiro têm elaborado e expressado sobre a “Rede Cegonha”.
- A implementação dessa rede se faz à revelia e em detrimento da Política de Assistência Integral à Saúde da Mulher, esta sim a política de saúde que queremos para as mulheres brasileiras: a que poderá assegurar saúde, dignidade e autonomia para nós, mulheres.
- O conteúdo da MP fere a Constituição Federal por introduzir na legislação a figura jurídica do nascituro, que não tem condição de existência como indivíduo autônomo.
- Neste sentido, a edição da Medida é uma vergonha para o nosso país. Anos atrás, o Brasil foi liderança entre os países latino-americanos, com posições progressistas em favor dos direitos das mulheres. A atual política do governo federal coloca o Brasil entre os governos que abandonam a perspectiva dos direitos humanos e direitos reprodutivos para as mulheres.
- É imperativo destacar que o Estado brasileiro sofreu condenação internacional, recentemente, pelo Comitê para a Eliminação da Discriminação contra a Mulher (Cedaw) no caso da brasileira Alyne da Silva Pimentel, por ter violado suas obrigações em relação ao acesso à saúde, num caso de morte materna perfeitamente evitável.
- Exigimos do Governo Federal o respeito às deliberações de Conferências Nacionais de Políticas Públicas e aos processos de participação social que estas propiciam, por convocação do próprio Governo Federal. E também aos Tratados Internacionais assinados pelo Estado brasileiro, com os quais os governos se comprometem a garantir o acesso das mulheres brasileiras aos direitos reprodutivos e aos direitos sexuais.
- A MP viola os direitos humanos e atenta contra a autonomia das mulheres ao criar um novo cadastro obrigatório para o atendimento durante o pré-natal. O próprio Ministério da Saúde reconhece que toda gestante que vai a uma unidade de saúde do SUS já faz um cadastro. Deste modo, a MP tem um caráter discriminatório: a mulher grávida que não fizer o novo cadastro não terá acesso ao serviço de saúde, nem ao benefício de R$ 50,00 introduzido pela MP. Da forma como está sendo implantado, o benefício atenta contra a dignidade das mulheres, tem um caráter controlador, reduzindo-nos à ideia de uma incubadora.
- O atendimento na rede pública de saúde para nós mulheres precisa considerar mais amplamente nossos direitos. E no que diz respeito ao acompanhamento daquelas que são atendidas nos hospitais privados, cabe ao Ministério da Saúde viabilizar, por meio de Portaria ou outro instrumento, as condições para o controle, vigilância e acompanhamento das gravidezes de risco.
- A MP desconhece o aborto como uma das principais causas da mortalidade materna no Brasil. E o fato de que a III Conferência Nacional de Políticas para Mulheres posicionou-se, por ampla maioria das delegadas presentes, pela revisão da legislação punitiva do aborto no Brasil, com atenção às mulheres na rede SUS. A CNPM aprovou a não-criminalização, discriminação ou quaisquer maus tratos às mulheres que realizarem abortos.
- A MP 557 será ineficaz para proteger a vida das mulheres, mas cria as condições para oficializar a gravidez forçada como política do Estado brasileiro.
A Medida se mostra completamente descabida ao desconsiderar ações já previstas, desde 2001, quando na conclusão do relatório da CPI da mortalidade materna ficou estabelecido um conjunto de recomendações para sua prevenção e redução.
Para que a gravidez de risco seja diagnosticada e para que mortes maternas sejam evitadas é preciso investimento em serviços de saúde, profissionais qualificados, leitos e equipamentos adequados. Atualmente, assistimos inúmeras unidades de saúde sem condições para isso pela insuficiência de investimentos na saúde, especialmente no SUS, por problemas de gestão ou por uso ilícito dos recursos públicos.
Neste momento, a MP 557 está tramitando no Congresso Nacional e a Portaria nº 68 do Ministério da Saúde, de 11/01/12, não altera a Medida. Faz apenas desdobramentos para sua aplicação.
Por tudo o que apresentamos, exigimos:
- A revogação da MP 557 e, por consequência, a revogação da citada Portaria.
- A retomada e o fortalecimento da Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher, com reafirmação do compromisso do atual governo federal com os direitos reprodutivos das mulheres.
- A revisão da legislação punitiva do aborto (descriminalização), o compromisso do Governo brasileiro com a legalização, garantindo a autodeterminação reprodutiva das mulheres.
Articulação de Mulheres Brasileiras, 13 de janeiro de 2012.
Marcha Mundial das Mulheres
Publicada em: 12.01.2012
Evidentemente o caráter persecutório da MP torna-se mais forte pelo fato de que no Brasil as mulheres são criminalizadas pela realização do aborto. Nos últimos anos há uma ofensiva conservadora e aumento da perseguição e criminalização das mulheres, inclusive com a interdição policial de clínicas, com a utilização de prontuários e registros das usuárias. As mulheres não podem exercer sua autonomia diante de uma gravidez indesejada e ficam expostas a riscos para sua saúde, sua integridade física e liberdade.
É evidente que o cadastro proposto é universal e compulsório, como se pode ler no texto da MP. Se é possível tomar medidas para que isso não seja utilizado como mais um instrumento de restrição de liberdade das mulheres em sua vida reprodutiva, os argumentos do Ministério da Saúde de que “universal” não se confunde com “compulsório” só faz sentido se isso corresponde a uma sugestão do Ministério de que as mulheres não procurem os serviços de saúde! Aliás, todas nós esperamos e queremos um atendimento integral à saúde das mulheres e que todas possam estar inscritas no sistema de saúde. O que torna, portanto, mais estranha e incompreensível a necessidade de tal cadastro específico de gestantes, mesmo considerando a problemática da mortalidade materna.
Desde o início da gestão, tem prevalecido nas ações do Ministério da Saúde uma perspectiva conservadora que não leva em consideração a saúde integral das mulheres e está centrada fundamentalmente no aspecto materno infantil. Nesse sentido a MP é uma continuidade da rede cegonha e de uma visão redutora do papel das mulheres como mães e reprodutoras.
Também chama a atenção a introdução da proposta de um Comitê Gestor Nacional sem qualquer participação da sociedade civil, e principalmente de Comissões de Cadastro, Vigilância e Acompanhamento de Gestantes e Puérpuras de Risco quando na realidade já existe no sistema de saúde, com participação dos movimentos e da sociedade civil, os Comitês de Morbi-Mortalidade Materna, fruto da luta e reivindicação dos setores organizados como parte de toda uma luta dos movimentos sociais por um sistema de saúde público e com controle social. A proposta não segue o acúmulo do SUS, prevendo em sua composição apenas a participação de profissionais e gestores, e desconhece o papel do movimento organizado nesses instrumentos.
Finalmente, o enfrentamento da mortalidade materna exige enfrentar a terceira causa de mortalidade materna que é o abortamento inseguro. É amplamente conhecido que isso só será possível se for respeitada a autonomia das mulheres e o aborto diante de uma gravidez indesejada for parte da política de saúde pública.
É obrigação do Ministério da Saúde ter políticas de atenção à maternidade que busquem reduzir a morbi-mortalidade materna e para isso é necessário qualificar a assistência e garantir o acesso e acolhimento nas unidades e hospitais, tanto na regulamentação para o atendimento privado como nos serviços sob responsabilidade da rede SUS. Nesse sentido a o benefício de R$50,00 terá um papel importante para o deslocamento daquelas que têm dificuldade financeiras. Sua eficácia, entretanto, depende da existência de outras políticas sociais associadas. Mas, mais uma vez, não é isso o que justifica a edição desta medida provisória.
É urgente que o Ministério da Saúde retire essa MP e articule suas ações para redução da mortalidade materna em acordo com mecanismos e as diretrizes já previstos no SUS e nas Conferencias Nacionais de Saúde.
Por isto, nós, da Marcha Mundial das Mulheres, exigimos:
• Que o Ministério da Saúde retire a MP 577/2011 no sentido de garantir a integralidade da saúde da mulher em consonância com seus direitos e garantias individuais;
• Que o Ministério da Saúde retome o debate sobre os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres e que o governo reafirme a autonomia política das ações condizentes com os princípios do Estado Laico, tomando medidas sem se curvar para conservadorismos ou morais religiosas;
• Um compromisso explícito do governo de impedir todas as ações de retirada de direito das mulheres nas políticas públicas;
• Que o Ministério da Saúde e o governo federal em conjunto com a sociedade civil enfrentem o debate do aborto inseguro e a necessidade de políticas de atendimento às mulheres que decidem interromper uma gravidez indesejada e, portanto, que o aborto seja descriminalizado e legalizado.
Marcha Mundial das Mulheres
Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
Entenda por que a MP 557 viola os direitos das mulheres (Universidade Livre Feminista – 25/01/2012)