A recente decisão da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal pode provocar uma grande mudança no tratamento que se dá à interrupção voluntária da gravidez. Hoje ocorre a simples criminalização, resposta ruim por qualquer ângulo de análise.
(O Estado de S. Paulo, 30/11/2016 – acesse no site de origem)
A criminalização do aborto é pouco eficiente, gera mais danos à vida das mulheres e é seletiva, atingindo sobretudo mulheres negras e pobres. As experiências de países que descriminalizaram e legalizaram o aborto demonstram que boas políticas públicas reduzem não só a mortalidade mulheres por conta do aborto inseguro, como do próprios abortos, sendo a melhor opção para preservar vidas.
A Constituição Federal de 1988 dá amparo à descriminalização do aborto ao conferir às mulheres liberdade, autonomia, privacidade e controle de seus direitos reprodutivos, ou seja, de decidir quando e como ter filhos. Ainda assim, a permanência da criminalização do aborto continua gerando grandes violências e injustiças.
O Supremo Tribunal Federal parece estar trilhando, ao longo dos anos, um consistente caminho argumentativo para a total descriminalização: a autorização de pesquisa com células tronco embrionárias e a possibilidade de antecipação de parto de feto anencéfalo se unem, agora, à decisão que reconhece a autonomia da mulher em decidir sobre a gestação. É passada a hora do tribunal enfrentar o sério e delicado tema do aborto. É imperativo que o país reconheça a injustiça da sua criminalização.
Eloísa Machado de Almeida, professora e coordenadora do Supremo em Pauta FGV Direito SP