Uma em cada 5 crianças no Brasil é filha de meninas entre 10 e 19 anos

06 de dezembro, 2017

Quase 60% das adolescentes que engravidam não estudam, nem trabalham. A gravidez na adolescência muda a realidade de meninas pelo Brasil.

(Profissão Repórter, 06/12/2017 – acesse no site de origem)

Os números sobre gravidez precoce na adolescência mostram uma realidade dura para as jovens mulheres. Segundo o Ipea, 76% das adolescentes que engravidam abandonam a escola e 58% não estudam, nem trabalham.

No Acre, 27% de todos os bebês que nascem são filhos de mães adolescentes. Entre janeiro e outubro desse ano, foram registrados 617 partos normais de mães entre 15 e 19 anos na maior maternidade do estado, em Rio Branco.

Na sala de espera do pré-natal, uma menina de 14 anos, grávida de cinco meses, diz que não sabia que era preciso tomar a pílula anticoncepcional todos os dias. Pamela tem 17 anos, um filho de dois e está grávida novamente. A repórter Eliane Scardovelli acompanhou o trabalho de parto da jovem. Confira no vídeo.

Por conta do alto número de adolescentes grávidas, a Secretaria de Saúde do Acre criou um projeto para conscientização nas escolas. O projeto começou em 2015 e já conseguiu reduzir em 11% os casos de gravidez entre adolescentes nas escolas do estado. O objetivo é também mudar o comportamento dos homens. “O moralismo e o machismo entram forte. O menino é incentivado a ter várias parceiras e não a ser pai”, afirma Antonio de Oliveira, criador do projeto.

Em uma escola pública, há até um uniforme especial para as meninas grávidas. Depois de ter o bebê, algumas levam os filhos para as aulas. Samara é uma delas. Ela tem 16 anos e está no 2º ano do Ensino Médio. A filha Ágata, de 10 meses, a acompanha todos os dias na escola.

Números alarmantes na Ilha de Marajó
Uma em cada cinco crianças nascidas no Brasil é filha de adolescentes entre 10 e 19 anos. Na Ilha de Marajó, no Pará, essa proporção é de uma em cada três. “Ultimamente, as jovens estão ficando grávida muito crianças. A gente recebe criança de 12 anos. A gente conversa com as adolescentes, faz palestras, mas o índice é muito grande. E nessa faixa etária muitas se recusam a fazer o pré-natal porque têm vergonha”, conta a agente de saúde, Lidiana Pereira Brito.

Além da gravidez precoce, outro fator que preocupa é o HPV, vírus que provoca uma doença sexualmente transmissível e é uma das principais causas do câncer de colo do útero, que pode ser prevenido com exames como o papanicolau. No ano passado, o Pará registrou 820 casos e a doença foi discutida em um congresso de ginecologia. “A maior incidência e mortalidade do câncer do colo do útero é quase um índice de pobreza”, afirma o ginecologista Cesar Eduardo Fernandes.

São muitas as histórias de gravidez precoce na Ilha do Marajó: Shirlene Alcântara, de 15 anos, ficou grávida com 13. Ela é casada com Claudiu Guedes, de 36 anos, que não é o pai de sua filha. Thais engravidou do primeiro filho aos 11 anos. Quando estava grávida do segundo filho, descobriu que tinha sífilis, mas não vai ao médico, pois o marido, de 18 anos, tem ciúmes. Conheça um pouco da história dessas jovens neste vídeo.

Raimunda Vieira é agente de saúde na ilha e tem duas filhas adolescentes. A mais velha engravidou aos 15 anos. A mais nova, de 14 anos, está grávida. Ela desabafa e lamenta que o trabalho para reduzir a incidência de gravidez precoce e doenças sexualmente transmissíveis ainda seja tão difícil: “Eu acho que é uma cultura. São mães que não conversam com seus filhos e a gente sente essa barreira pra falar sobre sexo. Tem família que dialoga com a gente, mas tem família que não aceita”.

A rotina das jovens mães

Bruna Souza tem 16 anos e mora em Guarulhos, na Grande São Paulo. Ela teve gêmeas aos 14 anos. Hoje, Ana Clara e Ana Julia têm um ano e cinco meses. “Quando descobri, achei engraçado. Eu só acreditei mesmo quando nasceram”, conta.

“Eu quase tive um enfarte, levei um susto. A gente não espera, a gente dá conselho pra não acontecer o que aconteceu comigo. Eu fui mãe cedo, com 14 anos também”, relata a mãe de Bruna, Adriana Souza.

Por causa da gravidez, Adriana parou de estudar na 6ª série. Ela é faxineira, mas está desempregada. Depois de um ano, Bruna voltou para a escola para cursar o Ensino Médio.

Por mês, ela gasta 400 fraldas e 60 litros de leite. Felipe, o namorado e pai das meninas, ajuda a manter as gêmeas. Ele está construindo uma casa para morar com Bruna e as filhas. Eles começaram a namorar quando ela tinha apenas 11 anos.

Camila e Ícaro têm 17 anos e são pais da Alice, de seis meses. Eles se conheceram há dois anos em uma matinê: “Fiquei desesperada quando descobri que tava grávida. Pensei: ‘e as festas, e a escola, como vai ficar?’”.  Ela abandonou a escola no primeiro ano do Ensino Médio. Ele termina um curso técnico em 2018 e não trabalha.

No terceiro mês de gravidez, os dois foram morar na casa da mãe de Ícaro, Kelly Cristina da Silva, que engravidou aos 15 anos. Hoje, é ela quem sustenta a casa sozinha. Maria da Silva, a avó de Ícaro, ajuda no que pode. Ela tem 57 anos e já é bisavó.

“Meu sonho era fazer intercâmbio, estudar e falar bem inglês. Mas esse sonho já foi. Eu sinto falta da minha liberdade”, lamenta Camila. Ela está em busca de emprego, mas está difícil conseguir uma vaga: “Quando engravidei, perdi todas as oportunidades de trabalhar”.

 

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