07/04/2012 – Governo pressiona teles por qualidade na telefonia fixa

07 de abril, 2012

(Julio Wiziack e Maria Paula Autran, da Folha de S.Paulo) Assunto fará parte das negociações de renovação das concessões, previstas para 2015, mas que serão adiantadas. Ideia é forçar as operadoras de telefonia a oferecerem serviços de qualidade também para as classes baixas

O governo decidiu antecipar a discussão sobre a renovação dos contratos de concessão das operadoras de telefonia fixa, prevista para ocorrer em 2015.

Motivo: “arrumar a casa” e forçar as operadoras a cumprirem metas consideradas “mandatórias” para “melhorar a oferta e a qualidade dos serviços”.

O governo quer que o serviço seja prestado não só para as classes AB, como também para as classes CDE.

O ministro Paulo Bernardo (Comunicações) chegou a afirmar que as teles “optaram por oferecer serviço caro para poucos” e que o governo “vai empurrar o setor”.

Para o governo, chegou a hora. As discussões já estão em curso. Telefônica, Oi e Embratel contrataram consultorias especializadas para analisar os diversos cenários que estão na mesa de negociação.

A assinatura dos contratos pressupõe que as teles e o governo estejam de acordo em todos os pontos. Neste momento, só existe confronto.

Oficialmente, as teles não falam do assunto. Mas a Folha apurou que um dos pontos controversos é o plano do governo de criar metas para a competição.

Por ele, será decidido, por exemplo, quais empresas têm “poder de mercado”, um conceito que definirá a capacidade das concessionárias em interferir no mercado, atrapalhando a livre concorrência.

Quem tiver “poder de mercado” será obrigado a investir mais no aumento de capacidade de sua rede e a alugar parte dessa infraestrutura a terceiros, uma forma de estimular a competição especialmente nas regiões mais afastadas dos grandes centros.

ASSINATURA BÁSICA

Para isso, será criada, inclusive, uma entidade que vai “arbitrar” casos de conflito nas relações entre as teles.

O preço será referenciado. Também haverá metas de qualidade, outro ponto polêmico no setor.

Além disso, o governo quer acabar com a assinatura básica do serviço de telefonia fixa e estuda até por fim às taxas de interconexão entre as redes fixas, cobrada toda vez que o assinante de uma companhia liga para outro número da concorrente.

Nos bastidores, as concessionárias dizem que irão à Justiça caso esses planos sejam levados adiante, colocando-os como um impeditivo à renovação dos contratos, que acontece a cada dez anos.

No ministério e na Anatel, o ritmo é de pressa, mas as teles dizem que não vão negociar “com a faca no pescoço” e que as propostas são de intervenção estatal, tese que já está sendo sustentada com base em pareceres dos principais juristas do país contratados para por limites aos planos do governo.

Bem de concessão esbarra na gestão da Anatel

A discussão dos contratos envolve um tema controverso: os bens que fazem parte da concessão.

Caso os contratos sejam cancelados, a União teria de recebê-los de volta para prestar o serviço.

Esse controle cabe à Anatel, mas a agência só tem quatro funcionários para dar conta de todos os ativos (centrais telefônicas, satélites etc).

A Folha teve acesso a um levantamento parcial dos 6.638 bens das concessões. Não há informação de mais da metade deles. Existem casos de bens vendidos ou dados em garantia sem aval da Anatel.

Até satélites foram dados em garantia a empréstimos de uma operadora.

No início de 2011, a agência determinou que as operadoras “arrumem a casa” e apresentem a lista completa dos bens e sua situação. A partir daí, as regras mudarão.

A discussão entre operadoras, Anatel e o ministério sobre esse assunto é intensa.

Uns querem acabar com a reversibilidade dos bens. Outros querem que as centrais de dados e parte da rede de fibras ópticas (usadas na banda larga) sejam bens da concessão. 
Acesse em pdf: 
Governo quer rever assinatura básica de teles (Folha de S.Paulo – 07/04/2012)
Bem de concessão esbarra na gestão da Anatel (Folha de S.Paulo – 07/04/2012)


Leia também:
Análise: Pontos devem ser esclarecidos para não travar investimentos
EDUARDO TUDE
ESPECIAL PARA A FOLHA

O controle dos bens estabelecidos para o regime de concessão não reflete a realidade das telecomunicações do Brasil de hoje, onde a telefonia fixa deixou de ser o principal serviço. Os demais serviços (celular, banda Larga, TV por assinatura) são prestados por meio de autorizações. Em 2011 existiam 242 milhões celulares contra 43 milhões telefones fixos.

Não se imagina que, em 2025, quando termina o prazo dos contratos, o poder público vá assumir o serviço no lugar das concessionárias.

Como separar a rede utilizada para telefonia fixa da usada para banda larga? A rede de fibra óptica instalada para prestar o serviço de banda larga utilizando dutos antes da telefonia fixa é um bem reversível? A Anatel indenizaria a atual concessionária por seus investimentos?

Essas questões precisam ser resolvidas de forma clara, ou poderão se tornar um entrave para investimentos. É bem-vinda a proposta da Anatel de rever os contratos e adequá-los à atualidade.

Em julho de 1998, quando ocorreu a privatização do setor, o telefone fixo era o principal serviço de telecomunicações. Por essa razão, a outorga ocorreu sob o regime de concessão em regime público com atribuição de obrigações de universalização (todos têm direito aos serviços) e de continuidade (serviço sem interrupção).

Uma das preocupações era como garantir a continuidade do serviço em caso de problemas com a concessionária ou do fim da concessão. Foi criado então o conceito de “bens reversíveis”, indispensáveis à continuidade do serviço, mas nunca ficou completamente claro o que estaria incluído neles.

EDUARDO TUDE é presidente da consultoria Teleco.

 

Acesse em pdf: Pontos devem ser esclarecidos para não travar investimentos, por Eduardo Tude (Folha de S.Paulo – 07/04/2012)

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