07/10/2013 – Mulheres e gays nas propagandas: clichê e preconceito

07 de outubro, 2013

(Meio & Mensagem Online) Interessante pesquisa, divulgada na última semana de setembro, pelo Instituto Patricia Galvão, feita pelo Data Popular traz dados reveladores sobre a percepção da população em relação à representação da mulher na propaganda de TV. Vamos a alguns deles: 59% dos entrevistados acreditam que a publicidade não retrata a mulher da vida real; 62% acham que as propagandas na TV não mostram a mulher que, além de ser esposa e mãe, trabalha e estuda; 65% concordam que o padrão de beleza nas propagandas na TV é muito distante da realidade da brasileira; 84% concordam que o corpo da mulher é usado para promover a venda de produtos nas propagandas na TV. O percentual de respostas entre homens e mulheres é muito parecido e, em alguns casos, a visão masculina é até mais crítica que a das próprias mulheres.

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Na mesma semana, uma polêmica envolvendo gays ganhou força na Itália e reverberou globalmente. O presidente da Barilla, maior fabricante de massas do mundo, Guido Barilla, perdeu uma ótima oportunidade de ficar calado e em entrevista à emissora italiana Radio 24, durante programa de grande audiência no país, declarou que em hipótese alguma faria propagandas de TV em que seus produtos fossem consumidos por famílias formadas por casais homossexuais. “Se os gays não gostarem, podem comer outra marca”, afirmou Guido. “O conceito de família sagrada continua sendo um dos nossos valores fundamentais”. Imediatamente grupos defensores dos direitos dos gays na Itália começaram nas redes sociais uma campanha de boicote à empresa.

A Barilla, fundada há 136 anos e presente hoje em mais de uma centena de países, domina metade do mercado italiano e pelo menos um quarto das vendas nos Estados Unidos. Diante da repercussão negativa do caso, teme ter sua liderança abalada de alguma forma. Um dia depois da polêmica, um filme publicitário veiculado na TV, no horário do almoço, em que aparecia uma tradicional família composta por mãe, pais e filhos, como habitualmente, foi finalizado por uma retratação de Guido Barilla. Cinismo pouco é bobagem.

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Os dois fatos ilustram o limite tênue entre clichê e preconceito, especialmente quando diz respeito a gênero e orientação sexual. Há muito tempo — pelos menos, umas três décadas —, a mulher passou a exercer um papel na sociedade brasileira ímpar do ponto de vista de aumento de importância, com ascensão profissional, chefiando famílias e formação educacional superior aos homens. E a publicidade ainda insiste em reproduzir clichês e imagens irreais do sexo feminino. Agências e marcas se defendem dizendo que procuram passar na sua comunicação a imagem da mulher que retrata as mudanças recentes. Mas o fato é que a percepção negativa está cristalizada. E, por mais que se tente argumentar que ela não corresponde à realidade, o simples fato de haver uma tremenda dificuldade de elencar campanhas cujas protagonistas sejam mulheres normais (e não modelos ou atrizes), trabalhadoras, inteligentes e que cuidam dos filhos demonstra que, nesse caso, percepção e realidade andam juntas.

Uma das notícias mais lidas no site meioemensagem.com.br, este ano, foi a que se referia ao projeto de lei em curso no Congresso que proíbe família gay em publicidade. Ou seja, esse é um assunto que provoca reações. Infelizmente, mesmo sem a vigência da proposta absurda desse projeto — que dificilmente será aprovado —, a indústria publicitária brasileira ainda insiste no padrão Barilla de família. Ótimo artigo de Contardo Calligaris, publicado na Folha de S.Paulo, na quinta-feira 3, conta a história da peça Lou&Leo, baseada na experiência real de Leo Moreira de Sá (que interpreta a si mesmo). Ocorre que Leo nasceu Lourdes e se casou com Gabi, que, por sua vez, nasceu Carlos. De longe, formam um casal heterossexual ou “normal”. Mas ambos mudaram seus sexos.

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Vivemos em uma sociedade cada vez mais plural. Ao mesmo tempo, mulheres e gays são seres raros nas áreas de criação das agências de propaganda. Há diversos fatores que têm feito a publicidade perder a relevância que já teve no passado. Talvez se soubesse retratar melhor a complexidade das pessoas e evitar se escorar em clichês e reproduzir preconceitos, poderia conquistar um espaço que está aberto. Basta ter coragem.

Acesse o PDF: Mulheres e gays: clichê e preconceito (Meio & Mensagem Online, 07/10/2013)

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