21/04/2013 – Na mídia, representação das mulheres também é desigual

21 de abril, 2013

(ABCD Maior) A psicóloga Rachel Moreno atua no movimento feminista desde os temos da ditadura militar. De lá para cá, a militância questionou a violência, o trabalho doméstico, os salários desiguais, a liberdade sexual. Hoje, o trabalho da especialista passa pela Imagem da Mulher na Mídia, exatamente o título do livro que acaba de lançar em Santo André. Nesta semana, Rachel recebeu o ABCD MAIOR e falou sobre o espaço das mulheres na sociedade atual, das classes operárias até a decisão de Daniela Mercury de se expor publicamente ao lado de uma parceira. “É bom, já que o movimento feminista não tem acesso à mídia”. O assunto se insere no tema do 1º de Maio, que neste ano vai discutir a democratização dos meios de comunicação. Leia os principais trechos:

ABCD MAIOR – A senhora está há muitos anos no movimento feminista e seu último livro fala sobre a mulher na mídia. Fale um pouco dos rumos que tomaram seu trabalho até chegar a esse ponto da análise sobre a mulher.

RACHEL MORENO – A gente sempre tentou se pautar por aquilo que fosse mais emergente. Então nos primeiros tempos que participei as mulheres saíam para trabalhar e não tinham com quem deixar os filhos. A creche era uma demanda. Aí a gente descobriu em 1979 que a violência doméstica era um problema sério. Na época se batalhava por democracia, e essa demanda causou polêmica, porque o movimento dos trabalhadores dizia: afinal de contas, tem violência entre homem e mulher no meio operário? Precisamos estar juntos para fazer a revolução, mas as mulheres vão ter de continuar apanhando? Não faz sentido. E veio a lei Maria da Penha. Teve um período que me afastei; no meio de outras coisas, entrei num grupo que discutia a mídia e voltei para o movimento feminista e cruzamos os temas.

E como a publicidade tem usado a mulher, seja como objeto nas propagandas ou como foco enquanto consumidora?

A publicidade é uma área que utiliza pesquisa. Na medida em que utiliza isso, a propaganda é mais refinada em termos de atualização do público que ela quer atingir. Por que apareceu negro na propaganda antes que na programação? Porque tinha negro na classe média com poder aquisitivo. Mas como ela foca o público majoritário, ultimamente temos questões sobre identidade de gênero que a publicidade pisa na bola, porque não respeita esse movimento de vanguarda, dos formadores de opinião. Então a peça tem uma roupagem atualizada, mas um conteúdo ultrapassado. Outra coisa: a publicidade tem de falar com as mulheres, porque elas são responsáveis por 85% das decisões de consumo. Mas quando você dirige um produto para a mulher, você corre o risco de não ter atualizado o seu discurso sobre estética, por exemplo. Por fim, quando fala com os homens, a mulher vem na publicidade como eles fantasiam que a mulher virá.

Voltando ao lugar da mulher no movimento sindical, no movimento operário. Como a senhora vê o espaço que elas têm hoje?

Eu estava no Sindicato dos Bancários (do ABC, em Santo André) e o presidente (Eric Nilson)disse que a categoria estava com quase 50% de mulheres e que a última presidente tinha sido mulher, assim como talvez a próxima. Disse que tinha 40% de mulheres na diretoria, o que já é um grande avanço. Alguns partidos políticos e centrais sindicais têm aprovado a paridade. Isso abre portas, mas quando a gente fala de representação política, a gente tem um número aquém de candidatas. Então falta a gente focar no porquê de não avançar. Por exemplo, o trabalho doméstico. Como fica para a mulher participar como candidata e cuidar dos filhos?

O debate do 1º de Maio deste ano tratará do direito à comunicação. Como a senhora vê o espaço para as formadoras de opinião?

A Unesco faz uma pesquisa a cada dois anos, e o Brasil faz parte, que tenta entender como a mulher aparece na mídia. E o que acontece é que são muito menos numerosas no Brasil as mulheres que aparecem como formadoras de opinião; segundo, elas têm um duplo papel, porque são não só formadoras de opinião como modelo de beleza e juventude. Você tem no Jornal Nacional um casal. E um fio branco que vira uma mecha branca no apresentador é um charme; a mulher dele que apresentava o jornal é mais velha e não tem um fio de cabelo branco, porque se começar a aparecer o cabelo branco ou qualquer ruga imediatamente é trocada por outra personagem mais jovem. Outro ponto: nos espaços colocados como sérios, como um telejornal, as mulheres aparecem em 18% das situações. E são 52% da população. Então estão mal representadas. Quando aparece é vítima de alguma coisa, testemunha de alguma coisa, ou então perguntam “o que a senhora sentiu, qual emoção teve?”. É uma roupagem do século 21 com valores do século 19.

Exemplos como o da cantora Daniela Mercury, que a favor da causa homossexual decidiu por apresentar-se junto da sua companheira, ajudam no debate?

Estamos falando do movimento LGBT, e as lésbicas estão no movimento feminista. O movimento negro também, ou seja, quando discute discriminação, não é só gênero, mas a liberdade sexual, o racismo. Agora, quando você tem uma figura famosa a respeito desses temas polêmicos é legal, é importante, faz com que o movimento chegue a alguns cantos que a gente não consegue alcançar porque afinal de contas o movimento feminista não tem acesso à mídia. Por outro lado não quer dizer que não tenham segmentos organizados no sentido oposto. Falamos da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara, cujo presidente [Marco Feliciano] se colocou radicalmente contra o avanço LGBT ou qualquer postura nesse sentido. A gente deveria prestar atenção que os dois segmentos que mais têm crescido nos últimos tempos na política: são os evangélicos e os ruralistas. E isso significa alguma coisa.

Acesse em pdf: Na mídia, representação das mulheres também é desigual (ABCD Maior – 21/04/2013)

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