(O Estado de S.Paulo) Não há normas específicas para o teste, que serve de prova nas ações de paternidade; pesquisador contesta a precisão da técnica.
Mães têm enfrentado uma batalha contra as estatísticas para convencer juízes a mandar refazer o exame de DNA, reconhecido como quase irrefutável pela Justiça. Mais de 20 anos depois da criação do teste, que se tornou a prova mais importante nas investigações de paternidade, ainda não há normas técnicas e fiscalização específica para o procedimento.
Renita Teles de Souza ficou desesperada quando um exame de DNA apontou que seu bebê não era filho do ex-namorado dela, morto seis meses antes de a criança nascer. O menino, hoje, tem 8 anos. “O pai teve o seu corpo cremado e eu tinha absoluta certeza, não existia outra possibilidade”, diz. “E os pais deles não me conheciam muito”, lembra. “DNA é DNA. É a ciência”, disseram os avós paternos do menino. Renita foi à Justiça e conseguiu reverter o laudo. Neste ano, entrou com uma ação de indenização contra o laboratório pela falsa exclusão de paternidade do ex-namorado.
A vendedora Roseli Soares também enfrentou dificuldades com um exame de DNA. Quando quis apresentar sua filha, que hoje tem 21 anos, ao verdadeiro pai, precisou recorrer ao teste. Na época a menina tinha 7 anos. Mas o resultado apontava que a criança tinha 95% de chances de ser filha de um homem que Roseli nem sequer conhecia quando a menina nasceu – o ex-companheiro dela, que registrou o bebê quando a criança já tinha 2 anos. Roseli conseguiu um acordo com o laboratório pelo erro no exame. Ganhou R$ 9 mil.
Professor de Medicina Legal da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o médico Zulmar Coutinho questiona a precisão dos exames de DNA. Em seu livro, Exames de DNA: Probabilidade de Falsas Exclusões Ou Inclusões 100%, de 2006, ele analisou mais de 100 casos em que o resultado do teste trouxe dúvidas. Com base na quantidade de exames de contraprova e nos casos em que pais muito parecidos com os filhos foram excluídos da paternidade, ele estima que até 10% das análises de DNA possam ter erros. “A possibilidade maior é de falsa exclusão de paternidade, ou seja, o individuo é o pai biológico e o exame o exclui por problemas técnicos”, diz.
Os problemas apontados por Coutinho incluem trocas de amostras, qualificação insuficiente do laboratório por falta de controle de qualidade para detectar erros ou até falhas por cálculo estatístico e interpretação. Ele cita, por exemplo, o caso de uma pessoa que recebeu três perfis genéticos diferentes, um de cada laboratório.
Críticas. A indústria dos laboratórios fornecedores de testes de DNA contesta a estimativa do professor. “Isso deprecia todo o trabalho que a gente faz”, diz Débora Sacramento, diretora do Genomic, um dos primeiros laboratórios a aplicar a técnica no Brasil.
Segundo Débora, ainda não há um padrão para a realização dos testes no País. A maior confiabilidade está nos laboratórios mais tradicionais, que têm maior grau de exigência. Por exemplo, o número de segmentos de DNA (locus) recomendado pela Polícia Federal Americana (FBI) é de no mínimo 13. No mercado, uma boa prática é usar 17 locus, mas os melhores exames trabalham entre 21 e 29 locus. Os resultados falsos seriam, assim, problemas ligados a empresas inexperientes.
Acesse o PDF: Mães lutam para conseguir refazer exames de DNA (O Estado de S.Paulo, 06/10/2013)