(Blog da Marcha) A Marcha Mundial das Mulheres saúda as companheiras da Central Única dos Trabalhadores (CUT) pelo processo de debate e reflexões que as levou a tomar um posicionamento contrário à regulamentação da prostituição.
A reação à posição da CUT, expressa pelo autor do atual projeto de lei que visa regulamentar as casas de prostituição, reforçou uma vez mais sua visão que desqualifica a luta feminista.
O argumento de que as feministas são moralistas e conservadoras porque questionam a prostituição, é desrespeitoso e não contribui para o debate. Vemos a desqualificação de um longo processo de lutas das mulheres por liberdade, igualdade e autonomia e que nada tem a ver com conservadorismo. As feministas defendem o direito das mulheres a viver livremente sua sexualidade, com autonomia sobre seus corpos e seus desejos, questionando a heteronormatividade e a violência. E negamos a falsa liberdade, oferecida pelo mercado, que se encerra unicamente na ideia de não ter impedimentos para a ação “econômica”. Esta ideia está na base da banalização da sexualidade, tornando-a mais um produto.
Não podemos ignorar as experiências das mulheres na sexualidade e simplesmente afirmar que exercer a prostituição é uma forma de vivenciar sua liberdade sexual. Sobretudo, não podemos ignorar que estamos falando, em sua imensa maioria, de mulheres sendo prostituídas por clientes homens. E que entre a maioria das mulheres que vivem em situação de prostituição, sobretudo as pobres, está presente o desejo de sair desta situação.
A naturalização da prostituição reforça um modelo em que a sexualidade feminina se constrói em função do desejo masculino. Conservadora é uma visão de liberdade sexual que se baseia na satisfação dos desejos dos homens e que oculta/inibe/oprime o desejo das mulheres. Conservadora porque conserva e reforça privilégios acumulados historicamente pelos homens na sociedade patriarcal.
Ao afirmar que “seguiremos em marcha até que todas sejamos livres”, a Marcha Mundial das Mulheres se posiciona em um campo que questiona profundamente as desigualdades do sistema capitalista, patriarcal e racista. Propõe um horizonte no qual haja a real superação da divisão sexual do trabalho, o fim da violência contra as mulheres e em que prevaleça a autonomia das mulheres, em relações de liberdade que só podem se realizar, para todas as mulheres, com a igualdade. Esta perspectiva é, portanto, radicalmente distinta do individualismo liberal que defende a liberdade de cada mulher para fazer o que quiser com seu corpo, mas que não é capaz de identificar que, no atual modelo, a liberdade não caracteriza a vida da maioria das mulheres.
Desde essa perspectiva, também questionamos a visão, dita de esquerda, que reduz o debate com a naturalização da prostituição como algo que sempre existiu, invocando um fatalismo que rebaixa o debate político e não questiona as relações patriarcais. Este raciocínio é contraditório com toda a história da esquerda que persegue a utopia de superar o capitalismo e construir um mundo de igualdade, tarefa que é tão difícil quanto a construção da igualdade e liberdade das mulheres, mas que lutamos pra realizar, ao pretender “mudar o mundo e mudar a vida das mulheres em um só movimento”.
A luta em defesa da liberdade e autonomia de todas as mulheres está fortalecida com esta posição do Coletivo Nacional de Mulheres da CUT, inserida em sua luta histórica por outro modelo de sociedade em que o corpo e a vida das mulheres são respeitados e não são mercantilizados. A CUT tem sido pioneira em pautar no conjunto do movimento sindical as lutas das mulheres, seja com sua posição em defesa da legalização do aborto ou na aprovação da paridade entre homens e mulheres na direção política da entidade.
Nossa expectativa é que outras organizações e entidades sejam estimuladas a realizar seus debates e questionar o projeto de regulamentação da prostituição para que, com o conjunto das forças progressistas, possamos derrotar o atual projeto no Congresso.
Marcha Mundial das Mulheres