PEC das Domésticas fez crescer no Rio movimento de pré-escolas com turno integral em até 30%
(O Globo) Com a aprovação em março da Emenda Constitucional 66, a famosa PEC das Domésticas, quem tem filho pequeno e contava com uma empregada ou babá para ajudar — muitas vezes numa carga horária tão extensa quanto a animação de crianças, que acordam elétricas e dormem só quando vencidas pelo cansaço —, precisou reinventar os arranjos domésticos. Em vez de pagar hora extra e demais encargos para as funcionárias de casa, muitos cariocas têm optado por mandar os rebentos para o horário integral da creche. Embora a Associação Brasileira de Educação Infantil não tenha ainda dados sobre o fenômeno, as creches já sentem a mudança.
Na Dínamis, na Rua Barão de Lucena, em Botafogo, a estimativa da diretora Ana Paula Júlio é que tenha havido um aumento de 30% na procura pelo período integral, de 12 horas, e do de sete horas.
— No horário integral, temos uns 80 alunos. No ano passado, não passava de 40. Acho que a PEC influenciou essa mudança. Antes, eu via muitas babás buscando as crianças. Hoje, são as avós, já que muitas mães só saem do trabalho às 18h e, por conta do engarrafamento, não conseguem chegar a tempo —diz Ana Paula.
Na ponta do lápis, para os pais da Dínamis vale a pena investir no horário integral, que custa cerca de R$ 2 mil mensais, já incluídos neste valor todas as refeições. No horário de sete horas, o valor é de R$ 1.900. Ou seja, com apenas R$ 100 mensais de diferença é possível pegar o filho já de banho tomado e alimentado — um valor inferior ao de duas horas extras diárias para uma doméstica com salário de mil reais (e que receberia cerca de R$ 327 a mais pelo tempo extra).
Faltam vagas
Na Criativa, creche com casas em Copacabana, Gávea e Botafogo, o aumento de procura também tem sido observado. No ano passado, cerca de 80 das 200 crianças da unidade da Rua Cinco de Julho estudavam seis horas. Agora, são 50. O resto migrou para os horários mais longos, de oito e 12 horas.
— Com essa questão das babás e empregadas, a procura aumentou muito. A gente tinha cinco visitas por semana, agora são vinte. As pessoas querem deixar os filhos 12 horas, mas não é fácil conseguir vaga — alerta Júlia Barcellos, supervisora administrativa da Criativa.
Pais fazem conta para saber se vale ter funcionária em casa
Mãe de Enzo, de 4 anos, e de Rafael, de 2, Adriana Molinari optou por mudar de horário depois da PEC. Ela passou os meninos, que ficavam por seis horas na creche, para o turno de oito horas:
— A babá ficou doente e tive que fazer isso. Agora, estou começando a calcular se vale mais a pena deixar na creche, ter uma pessoa em horário integral ou em meio período. O problema da creche é que não posso levar as crianças, se elas estão doentes. Tenho que ter opção para essas emergências.
Pai de um casal, o engenheiro Ricardo Maleh foi pego de surpresa:
— Ela (a empregada) disse que agora tinha hora extra, que queria aumento. Propus manter o salário e reduzir a carga horária, mas ela não aceitou e foi embora.
Para contornar a confusão, Ricardo passou o horário de um dos filhos para o integral. E contratou uma babá que trabalha quatro horas pela manhã e quatro horas à noite. O arranjo só é possível porque ela mora perto do trabalho e da creche.
— Cortei o custo da passagem da babá e das refeições que as crianças faziam em casa. Estou pagando mais pela creche, mas vale a pena por conta da nutricionista, da coordenadora. A babá nunca é tão qualificada.
Presidente do Sindicato das Escolas, Victor Nótrica diz que a opção do horário integral é uma realidade para quem tem filhos em creche, mas uma dificuldade para os pais com crianças mais velhas, já que poucas escolas do ensino fundamental oferecem essa opção. Interesse em expandir o horário existe. O que dificulta, diz, são as exigências da prefeitura. Em Botafogo, por exemplo, não se pode abrir novas escolas.
Na Barra, a Escola Parque vai aumentar o horário extenso, que prevê três horas e meia de aulas extracurriculares e almoço antes das aulas de conteúdo propriamente ditas.
— Independente de os pais terem mandado as empregadas embora ou tenham evitado horas extras, para a criança, estar na escola é sempre a melhor opção — diz Eliete Wermelinger, coordenadora de atendimento.
Acesse em pdf: Sem babás, crianças ficam mais na creche (O Globo – 25/05/2013)
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