Aqui em Universa, é comum ver comentários de leitores (sim, estamos lendo o que vocês escrevem) falando que “feministas odeiam homens”, que “ficam com os peitos para fora” e que feminismo é um machismo ao contrário, entre outras ideias que envolvem o movimento.
(Universa, 16/03/2019 – acesse no site de origem)
Mas o que é verdade e o que é mentira nessas afirmações? Conversamos com três especialistas em teoria feminista para analisá-las. Vamos lá:
“Feminismo é um machismo ao contrário”
Essa dá para explicar usando o dicionário. Segundo o Houaiss, feminismo é a “teoria que sustenta igualdade política, social e econômica de ambos os sexos”, enquanto machismo é o “comportamento que tende a negar às mulheres a extensão de prerrogativas ou direitos do homem”.
Portanto, conceitualmente, não dá para dizer que um movimento funciona do mesmo jeito que outro mas de lado oposto. O machismo nega direitos às mulheres, e o feminismo quer retomar a igualdade entre os gêneros, e não negar direitos aos homens.
“Feministas só sabem por os peitos para fora”
Primeiro, uma pergunta: por que é permitido um homem andar sem camisa na rua e proibido mulher fazer o mesmo?
Pensou? Ok, agora sigamos.
Doutora em estudos de representatividade de gênero pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Fernanda Friedrich explica que há várias linhas de manifestação dentro do movimento e que, em algumas, são feitos protestos nas ruas em que partes do corpo ficam à mostra. Mas não é isso que faz de uma mulher feminista. Essa é apenas a maneira como ela expressa seu feminismo.
“Elas levam para o lado mais extremo, o de mostrar o peito, para chocar e simbolizar a sexualidade imposta sobre nosso corpo, que não é aplicada da mesma forma para os homens”, diz. Lembra da pergunta ali no começo? Não é “só” mostrar os seios, mas questionar a impossibilidade de mostrá-los, sem que o ato cause estranhamento ou seja considerado crime, como acontece no Brasil,
“Feminista não gosta de se depilar”
O feminismo tem como base a garantia da autonomia da mulher. Nada impede que ela se depile ou queira seguir práticas relacionadas à feminilidade. O problema é a imposição. “O movimento quer garantir a liberdade de qualquer um poder fazer com o corpo o que quiser, sem se prender a um estereótipo de gênero”, explica Hannah Maruci Aflalo, doutoranda em teoria feminista e representação política feminina pela USP (Universidade de São Paulo).
Resumindo: quer tirar os pelos? Tire. Não quer? Não tire. Dá para ser feminista dos dois jeitos.
“Feminista odeia homem”
Feminismo não é um ataque aos homens, mas ao machismo. Não é pessoal, não é uma guerra. É, de novo, a busca por direitos iguais. Mesmo assim, sem negar as diferenças entre homens e mulheres. “Que são físicas, e não intelectuais, como o machismo quer fazer crer”, afirma a especialista em estudos de gênero Fernanda Friedrich.
Ela mesma diz que já ouviu várias vezes a pergunta: “Mas como pode você ser feminista e casada com um homem?”. “Como se isso fosse afetar a rotina dentro casa”, diz. E ela odeia o marido? “Não”, responde, entre risos. “Eu o amo muito, ele é meu companheiro, e eu, inclusive, estou grávida de um menino, que também amo.”
“Feministas são todas lésbicas”
Seguindo a ideia de que feministas odeiam homens, o mais lógico é dizer que, por isso, elas só se relacionam com outras mulheres. Mas o feminismo não tem qualquer relação com orientação sexual.
Professora de História da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a teórica feminista Margareth Rago acredita que o comentário tem a ver com uma intenção de xingar as feministas. Para muitas pessoas que atacam o movimento, ser lésbica é algo errado, logo, dizer que alguém o é, torna-se uma ofensa.
“Dizer isso é mostrar um um horror às lésbicas, como se só fosse normal ser heterossexual.”
“Feminismo prega o aborto e quer acabar com a família”
Primeiro, sobre o aborto: seguindo a teoria feminista da liberdade individual feminina, a ideia não é que se “pregue” o aborto, mas que a mulher possa escolher se vai ter um filho, que será gerado em seu corpo e pelo qual será responsável.
Segundo, sobre a família. “O feminismo quer acabar, na verdade, com a ideia do homem provedor e da mulher que tem que ficar em casa cuidando dos filhos sem ter opção de seguir outros caminhos na vida, como trabalhar ou estudar”, explica Margareth Rago.
Camila Brandalise