(Carta Capital) Em entrevista à revista CartaCapital, a cientista social Tatau Godinho analisa a situação das mulheres na política, critica a desigualdade de gênero e comenta os ganhos que as brasileiras podem ter com a eleição de uma mulher para a Presidência.
Para Tatau Godinho, “as questões relacionadas aos direitos das mulheres vão ser colocadas na agenda política de forma muito mais cotidiana”, mas isso vai depender também de uma presença mais forte do movimento de mulheres. E a cientista política, que há vários anos se dedica à temática das mulheres e poder, alerta: “o campo da oposição provavelmente se apoiará em uma agenda conservadora em relação aos direitos das mulheres, como já ocorreu nas eleições”.
Leia alguns trechos dessa entrevista:
“CartaCapital: Quais os avanços poderão ser conquistados pelas mulheres, na política, com a eleição de Dilma Rousseff à presidência da República?
Tatau Godinho: Sem dúvida uma mulher na Presidência da República já representa, de saída, uma quebra de barreiras. O principal cargo político do país é uma referência necessária para os debates, as articulações políticas, para as mais diversas áreas em torno das quais a sociedade se mobiliza. Tem uma influência importante, também, no imaginário social em relação às mulheres. Mas as mudanças mais concretas, em termos de políticas, dependem da insistência que a presidenta tiver em fortalecer uma agenda voltada para a igualdade. As questões relacionadas aos direitos das mulheres vão ser colocadas na agenda política de forma muito mais cotidiana. E é muito importante uma presença mais forte do movimento de mulheres para que isso seja feito em um sentido progressista. O campo de oposição, provavelmente, se apoiará também em uma agenda conservadora em relação aos direitos das mulheres, como já ocorreu nas eleições. Por isso, para garantir um avanço, acredito que seja necessário que a sociedade se mobilize no sentido de possibilitar um efetivo avanço de direitos. Dilma Rousseff tem um histórico de atuação rompendo espaços em áreas muito fechadas às mulheres e, acredito, que isso dará a ela uma boa experiência de como lidar em um ambiente adverso.
CartaCapital: O que muda na bancada feminina no Congresso com a eleição de Dilma?
TG: As deputadas e senadoras têm uma oportunidade inédita de fortalecer sua voz no Congresso. Mas é preciso se apoderar dos sinais indicados pela futura presidenta, de que valoriza o aumento da participação política das mulheres, e consolidar novas lideranças nas disputas concretas que compõem o dia a dia do Congresso. Esse é um momento privilegiado para que as parlamentares mulheres reforcem sua presença e, mais especialmente, para que a bancada feminina apareça como uma forte articuladora de reivindicações de políticas que incidam sobre a desigualdade entre mulheres e homens. Para isso é necessário que a atuação se paute por uma plataforma ampla, que não fique apenas em temas de menor incidência, ou nas áreas que são consideradas tradicionalmente mais receptivas à participação das mulheres. Há questões fundamentais em relação ao mundo do trabalho, no âmbito da política econômica e de desenvolvimento, da previdência, ou a reforma política e partidária, como mencionado anteriormente, que são muito importantes. Isso vai depender da atuação das parlamentares comprometidas com essa agenda. Ampliar o número de mulheres é muito importante, mas mudanças reais para as mulheres só ocorrerão se isso se combina com uma agenda de propostas e reivindicações para alterar as condições de desigualdade e discriminação vividas pelas mulheres.
CartaCapital: Em reunião de transição dos ministérios na segunda-feira 8, Dilma anunciou que quer mais mulheres no primeiro escalão do governo. O que achou dessa atitude da presidente?
TG: É muito positivo que Dilma tenha acenado, logo de início, com a importância de ter uma presença maior das mulheres em cargos chaves do governo. Com certeza os partidos vão resistir. Afinal, dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Nem na física nem na política. E a concentração masculina nas redes de direção é brutal. Não são apenas os dirigentes partidários. Isso inclui os quadros do parlamento, das direções sindicais, das universidades ou outras entidades da sociedade. A insistência da presidenta em compor um governo com maior presença de mulheres obrigará os partidos, e toda a sociedade, a discutir a questão.
Em outros países, houve um processo semelhante. Como na Espanha, por exemplo. E isso cria, de fato, possibilidades de mudanças.”
Leia a entrevista na íntegra: Políticas para mulheres e mulheres na política (Carta Capital – 16/11/2010)