17/03/2012 – Talvez seja preciso uma mulher para defender os direitos das mulheres, escreve colunista do New York Times

17 de março, 2012

(O Estado de S. Paulo) Elas precisam de alguém que as defendam da ameaça republicana e Hillary, melhor do que ninguém, é a resposta

MAUREEN DOWD É COLUNISTA, THE NEW YORK TIMES – O Estado de S.Paulo

Hillary Clinton lutou em defesa dos direitos das mulheres em todo o mundo. Mas quem teria imaginado que ela teria de lutar por eles em seu país? “Continuo sem compreender por que os extremistas sempre se voltam contra as mulheres”, disse ela a uma plateia de fãs durante o Women in the World Summit, realizado no sábado no Lincoln Center.

“Mas todos eles parecem fazer o mesmo. Não importa o país em que estejam nem a religião que afirmem seguir. Seu objetivo é controlar as mulheres. Querem controlar nossa maneira de vestir. Querem controlar nosso comportamento. Querem até controlar as decisões que tomamos em relação à nossa saúde e ao nosso corpo.”

“Pois é difícil acreditar que até mesmo no nosso país somos obrigadas as defender os direitos das mulheres e rejeitar as tentativas de marginalizar qualquer uma de nós, pois os Estados Unidos precisam dar o exemplo ao restante do mundo”, disse em meio a aplausos. Como secretária de Estado, Hillary não deveria se meter na política interna. Mas se tratava de uma oportunidade, um embate titânico entre o Inevitável (Hillary) e o Indefensável (os homens das cavernas do Partido Republicano).

A tentativa dos homens republicanos de obrigar as mulheres a voltar aos cintos de castidade deu nova vida ao presidente Barack Obama, mas irritou e indignou Hillary. E isso pode se revelar a coisa mais perigosa que os extremamente autodestrutivos líderes republicanos poderiam ter feito. Num estranho surto de misoginia em massa, os republicanos estão afastando de si as eleitoras – tanto republicanas quanto independentes – que os ajudaram a obter o controle da Câmara em 2010.

A senadora Olympia Stone, que já se cansou do tratamento e vai deixar o Congresso, disse a Karen Tumulty, do Washington Post, “temos a sensação de estarmos retrocedendo a uma outra era”. Ela alertou que os republicanos podem estar empurrando as mulheres para os braços dos democratas. E quem poderia ser melhor do que Hillary para recebê-las com um abraço de boas-vindas? A mulher que foi descrita como “sexecretária de Estado” por Rush Limbaugh saberia muito bem como contra-atacar.

Impasse. Tem-se especulado muito a respeito da ascensão de Hillary. Patrick Caddell e Douglas Schoen sugeriram no Wall Street Journal que Obama deveria “assumir uma posição moralmente elevada” e deixar que Hillary concorra à presidência. Segundo a argumentação deles, Hillary poderia “romper o impasse em Washington”. Trata-se de um cenário divertido, mas absurdo.

Al Hunt, da Bloomberg News, escreveu esta semana que Hillary passaria com facilidade por Larry Summers e ficaria com a presidência do Banco Mundial, além de ser automaticamente o principal nome dos democratas para as eleições de 2016. Meu colega Bill Keller sugeriu que ela substituísse Joe Biden na candidatura à vice-presidência este ano, rebaixando-o para o bairro de Foggy Bottom, em Washington: “Uma Hillary vice-presidente seria um trunfo formidável no governo e na campanha, tanto como estrategista política quanto como mensageira para o Capitólio. Em termos simples, ela tem uma capacidade notável de se orientar no mundo de homens poderosos e problemáticos”.

Mas ela não seria capaz de passar por dois homens poderosos que consideram sua ascensão problemática: Obama e Biden. Por mais que os comentaristas gostem de comentar a respeito da troca Biden-Hillary simplesmente porque ela é muito mais convincente – e experiente – do que todos os adversários republicanos, esta opção não está no horizonte da Casa Branca. Isso faria com que o presidente parecesse fraco, desesperado e desleal, e obteria uma vice-presidente que disputaria com ele os holofotes. Além disso, antes de sair de cena, Biden se algemaria a Barack Obama.

Sem dúvida, o ataque republicano às mulheres proporciona, tanto para Obama este ano quanto para Hillary em 2016, um caminho fácil em direção à Casa Branca.

As mulheres assistiram a uma assustadora sequência de esforços por parte do Congresso e de alguns Estados no sentido de transformar as mulheres em propriedades, de constrangê-las em relação ao sexo e de limitar seus direitos reprodutivos. Elas viram a reação covarde dos candidatos republicanos depois que Rush Limbaugh rotulou de “prostituta” e “vadia” uma estudante de Direito que pedia ao seguro saúde que cobrisse as despesas com pílulas anticoncepcionais, prática que é comum há quase cinco décadas.

As mulheres americanas perceberam subitamente que sua emancipação no século 21 não está garantida, como supunham. No programa Meet the Press, transmitido no domingo, o governador da Virgínia, Bob McDonnell, um republicano, teve a audácia de dizer o seguinte para justificar seu apoio a uma lei cujo objetivo é humilhar as mulheres que fazem aborto ao penetrá-las com um dispositivo para tirar fotos: “Todo procedimento invasivo exige um consentimento informado”.

Minorias. O que ele queria de fato dizer é que, quando o aborto se torna uma opção, o consentimento informado deve exigir um procedimento invasivo. Acompanhando as opiniões talibanescas de Rick Santorum, Mitt Romney sugeriu numa entrevista concedida na terça-feira a uma emissora de TV de St. Louis que, para ajudar a equilibrar o orçamento federal, ele propunha eliminar o financiamento ao Planejamento Familiar: “Vamos acabar com isso”.

As mulheres que imaginaram que a eleição de Obama significaria o fim de todas as subdivisões e minorias estão começando a pensar: talvez ele não seja suficiente. Se o desejo desses líderes conservadores de submeter as mulheres a seu jugo está tão à flor da pele assim, se eles são perversamente impelidos a rebaixar as mulheres por mais que isso possa significar a própria derrota política, então talvez Obama não seja suficiente para defendê-las. Se as americanas se encontram em posição tão vulnerável, talvez precisem ser defendidas por uma mulher.

Será que ela é inevitável? / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

Acesse em pdf: Não mexam com as mulheres, por Maureen Dowd (O Estado de S. Paulo – 17/03/2012)

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