(Observatório da Imprensa) Se não tiver mais nada a comemorar neste primeiro ano de governo, a presidente Dilma Rousseff vai poder, ao menos, celebrar suas boas relações com a mídia. Tudo começou na posse, quando ela garantiu que a liberdade de imprensa seria plena em seu governo. E continuou com o primeiro discurso na ONU. Depois vieram as quedas de ministros, que garantiram ao seu governo – como apontou a comentarista Cristina Lobo (Globo News) – a aprovação na região Sul, além da aprovação no Nordeste (herdada do presidente Lula). O ano termina com uma pesquisa que mostra que a presidente chega ao final do primeiro ano com uma aprovação maior do que a de seus antecessores, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e ninguém menos que seu mentor, Lula.
Para quem temia que Lula fosse uma figura onipresente no governo Dilma, uma surpresa: eles continuam grandes amigos, como a presidente faz questão de declarar, mas o governo é dela. Reconhecida internacionalmente e celebrada por jornais e revistas lá fora, Dilma Rousseff conseguiu, de cara, um grande milagre: pouco se fala na imprensa de suas roupas, cabelos e maquilagem. São detalhes que, se a gente levasse em conta a paixão que parte da mídia tem por celebridades, poderiam ser muito destacados.
Com uma vida pessoal muito reservada e seu ar durão, a única atitude mais “feminina” que a mídia destacou, ao longo desse ano, foram os momentos em que ela deu uma choradinha discreta. Sempre em solenidades oficiais e em encontros (como com os atletas deficientes) em que as lágrimas eram muito bem-vindas.
Os números da oposição
Visivelmente encantada com Dilma, a revista IstoÉ publicou uma extensa matéria sobre ela que começa dizendo:
“Suceder ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o mais carismático e popular da história do Brasil, era, sem dúvida, um grande desafio. Mas a primeira mulher a governar o país não costuma recuar diante de obstáculos. Ao contrário, o que mais emociona a presidenta Dilma Rousseff são exemplos de superação diante das dificuldades da vida. E, neste primeiro ano de mandato, ela deu prova de sua determinação. Comandou um agudo corte orçamentário, mas sem descuidar do crescimento e da geração de empregos. Sob a batuta de Dilma, o Brasil foi uma das poucas economias a crescer em meio a uma gravíssima crise internacional.”
E continua:
“Primeira mulher a abrir a Assembleia-Geral da ONU, a presidenta da República hoje é considerada a terceira estadista mais poderosa do mundo, em ranking da revista Forbes. Tem à frente apenas a chanceler alemã, Angela Merkel, e a secretária de Estado americana, Hillary Clinton. A tradicional revista The New Yorker chamou-a de ‘A Ungida’ e afirmou que Dilma ‘está conduzindo o país num boom econômico’.”
Veja Online (15/12/2011) fez uma análise numérica do governo Dilma, neste primeiro ano, baseada em informações de Duarte Nogueira, líder do PSDB na Câmara:
“O governo aplicou em 2011 muito menos do que o previsto para alguns dos principais programas mantidos pelo Executivo. O ritmo lento de execução atinge o carro-chefe da gestão petista: dos 40,9 bilhões autorizados para o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) neste ano, 6,9 bilhões (16,9%) foram pagos. Outros 16,6 bilhões foram usados para cobrir restos a pagar da primeira etapa do PAC, ainda no governo Lula. O índice de execução é ainda menor quando são levados em conta outros programas, como o Minha Casa, Minha Vida (0,79%), o Luz para Todos (0,27%), a implantação de sistemas de esgoto (0,41%) e a Política Nacional sobre Drogas (16,37%). Um dos raros setores com aplicação razoável dos recursos previstos foi o Programa de Agricultura Familiar (Pronaf), com pagamento de 50,9% do destinado. O percentual empenhado do PAC até agora é de 69,5% e, do Minha Casa, Minha Vida, 69,8%. Algumas despesas, entretanto, aumentaram. O gasto com pessoal subiu 11,8% na comparação com 2010. Ao todo, foram gastos 732 bilhões de reais com salários e encargos trabalhistas.”
Mas a imprensa em geral parece não tomar conhecimento desses números apresentados pela oposição.
A situação da mulher
Entre elogios (da grande maioria da imprensa) e notícias que divulgam a visão da oposição sobre seu governo, a presidente Dilma Rousseff se prepara para o segundo ano de mandato. Como disse a cronista Dora Kramer (Estado de S.Paulo, 18/12/2011):
“Popularidade é bom e todo mundo gosta. Rende votos, vitórias eleitorais, aumenta a perspectiva do poder, infla egos, mas cria cacoetes de comportamento, alimenta vocações autoritárias e, por isso, o ideal é que seja usada em prol da coletividade e não do projeto de um só partido.”
Como a presidente vai usar esses altos índices de aprovação daqui para frente é a grande dúvida da comentarista e da imprensa menos deslumbrada. Às mulheres resta a esperança de que o prometido “olhar feminino” garantido por Dilma no começo do governo finalmente entre em ação. Questionada pela jornalista Cristiana Lobo, ela respondeu que o olhar feminino, por enquanto, estava no melhor acabamento das casas do governo (com mais azulejos) e no programa contra drogas.
Talvez ela não tenha entendido a pergunta. Quem sabe agora, que está com a popularidade em alta, ela comece a olhar mais para as mulheres que reclamam por melhores condições de trabalho, programas de saúde mais eficientes, creches para os filhos de trabalhadoras, salários melhores, só para citar alguns itens prioritários para as eleitoras que ajudaram a fazer a primeira mulher presidente e a queridinha de boa parte da mídia.
Para a imprensa, também é tempo de sair da lua de mel e cobrar, além de muitos itens, os que dizem respeito diretamente à situação da mulher no Brasil.
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[Ligia Martins de Almeida é jornalista]
Acesse em pdf: Um ano de boas relações, por Ligia Martins de Almeida (Observatório da Imprensa – 20/12/2011)