O voto negro, por Frei David Santos

15 de setembro, 2014

(O Globo, 15/09/2014) O povo afrodescendente, com seu crescente ingresso nas universidades e nos altos postos do mercado através das cotas nos concursos, terá grande papel na construção do país.

O voto para presidente da República de um importante segmento da sociedade brasileira terá um peso decisivo na balança das eleições de 2014. Os marqueteiros já sabem e estão debatendo como trabalhar esse fenômeno eleitoral. Ele será fundamental para levar à derrota ou à vitória o candidato que melhor entender e dialogar com esse fenômeno.

Segundo os dados do TSE e do PNAD/IBGE, entre os habilitados como eleitores de 2014, 55% são negros (pretos e pardos). Esse fenômeno de o Brasil ter a maioria negra de eleitores se dá pela primeira vez. Na pesquisa Ibope de 15 e 16 de julho, Aécio tinha 18% das intenções de votos do povo negro. Em 24 de agosto, caiu para 15% na pesquisa Ibope e voltou a cair, em 1º de setembro, na pesquisa Datafolha, para 12%. Marina, na pesquisa Ibope de 24 de agosto, aparece com o alto índice de 28% das intenções de votos do povo negro.

Isso é por acaso? O que representam esses percentuais para a definição do candidato vencedor? Por que parte desses votos foi perdida (ou não conquistada) por Aécio? Como o programa do PSDB contempla a população negra? Esta, nas suas demandas por políticas públicas de empoderamento, tem sido contemplada nos municípios e nos estados governados, até então, pelo PSDB? E pelo PSB ou pelo PT?

Nestas eleições, o voto negro será o fiel da balança, especialmente para garantir e dar passagem para os candidatos ao segundo turno. Todo bom partido governante precisa ser bom para todos os segmentos da população. Retomando a análise dos votos em Marina, detectamos que ela voltou a subir em 1º de setembro, na pesquisa Datafolha, para 32% das intenções de votos do povo negro. Já Dilma, antes do fenômeno Marina, na mesma pesquisa do Ibope de 15 e 16 de julho, tinha 39% das intenções de votos do povo negro. Em 24 de agosto, caiu para 38% com a chegada de Marina. Em 1º de setembro, na pesquisa Datafolha, subiu para 40% das intenções de votos desse segmento. Recuperou e cresceu. Por quê? Como os cientistas políticos avaliam esse fenômeno? E os marqueteiros, como estão trabalhando esses dados estatísticos? Como reverter essa potência para os seus respectivos candidatos? Por que esta certa estabilidade do voto da população negra em Dilma?

Quem não considerar o voto da negritude e não tiver um tratamento direto ou indireto voltado para esse segmento, após as eleições, poderá se arrepender.

O pesquisador Luiz Augusto Campos, da Escola de Ciência Política da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio), lançou em 2013 um estudo que deve urgentemente ser lido por todos os marqueteiros. Seu trabalho está disponibilizado na internet, com o título “Socialismo moreno – Conservadorismo pálido? Cor e recrutamento de candidatura nas duas maiores cidades brasileiras”. O estudo aborda a acolhida ou não de candidaturas do povo negro por partido. Ter negro candidato, sem dinheiro, adianta? Em suas análises, traz luz e elementos para todos os bons marqueteiros e políticos que pensam o Brasil como um todo.

Não nos iludamos: o povo negro daqui para a frente, com seu crescente ingresso nas universidades e nos altos postos do mercado de trabalho através das cotas nos concursos públicos, terá grande papel na construção do novo Brasil que estamos desenhando. A influência de um cotista no seu grupo familiar, quase sempre por ser o único com faculdade, é grande! Um bom político e um partido sério não podem se contentar com um aparente silenciamento da população negra e sua postura política – que não é ouvida. Algo novo está surgindo e será um grande diferencial para a construção da nova nação: plural e participativa.

O povo afrodescendente foi e está sendo incluído no sistema social e quer nele permanecer. O compromisso que espera de todos os candidatos é que sempre coloquem o tema da inclusão como pauta prioritária. Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, de agosto de 2012 a agosto de 2014, naquela Casa, os processos contra o racismo cresceram mais de 150%, incluindo o do goleiro Aranha, apesar da visão equivocada de Pelé. Uma nova consciência de pertencimento está sendo desenhada, e o silenciamento frente à discriminação do povo negro, por parte dos candidatos, poderá custar caro.

Acesse o PDF: O voto negro, por Frei David Santos (O Globo, 15/09/2014)

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