(Agência Patrícia Galvão, 31/10/2014) Em recente artigo, a socióloga Clara Araújo apresenta uma detalhada análise sobre os resultados do processo eleitoral recém encerrado e que já pode ser considerado histórico, seja pelo fato de três mulheres terem disputado o mais alto cargo Executivo do País, obtendo 64,42% dos votos válidos no primeiro turno para a Presidência da República, mas também pelo “aumento substancial das candidaturas” femininas, que trouxe vários elementos positivos ao debate sobre o que poderia ser considerada uma “justiça de gênero” no Brasil, apesar das contradições colocadas pelo baixo crescimento eleitoral das mulheres.
Professora do programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais e coordenadora do Núcleo de Estudos de Desigualdades e Relações de Gênero da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (NUDERG/UERJ), Clara Araújo aponta que a eleição de 2014 “certamente será registrada na história das lutas das mulheres para ocupar espaços de poder e se firmarem como competidoras em um país continental como o Brasil”.
A pesquisadora destaca seis aspectos dos resultados do primeiro turno eleitoral que podem embasar uma análise positiva: o aumento do número de candidaturas de mulheres; o percentual de votos destinados às mulheres candidatas à Presidência; a trajetória das candidatas que disputaram o mais alto cargo eletivo no país; o percentual de mulheres eleitas para o Senado e “o próprio resultado para a Câmara Federal” – pois, “se for comparado com as eleições anteriores, os números são positivos, embora baixos”; e o fato de o aumento da fragmentação eleitoral (o número de legendas representadas na Câmara dos Deputados saltou de 22 para 28 na próxima legislatura) não ter prejudicado diretamente as mulheres.
Entre os elementos desfavoráveis à representação feminina na política nacional, a socióloga lista os resultados das disputas aos cargos de governos estaduais e em assembleias legislativas; e a permanência do “insatisfatório compromisso” dos partidos com políticas efetivas de estímulo à participação das mulheres nos espaços de representação e poder, o que pode ser verificado também quando são analisadas as “condições de elegibilidade” e “competitividade” das candidatas de forma contextualizada.
A especialista questiona também uma abordagem “diluída de substância e de conteúdo” em relação ao tema dos resultados das cotas legais de gênero entre mulheres dos vários partidos, que apesar da correção e importância da pauta coloca todas as legendas em um mesmo patamar “difuso” e “confortável” de responsabilidades.
Clara também aponta que o papel dos partidos deve ser analisado levando-se em conta também a localização no espectro ideológico, cuja atualidade é enfatizada por ela frente aos debates em pauta no momento atual, em particular no campo dos direitos humanos. Devem também ser considerados o peso do poder econômico em suas múltiplas manifestações, incluindo o que chama de “familismo”, e o peso das bancadas religiosas e sua constituição também majoritariamente masculinizada.
Em sua conclusão, Clara Araújo destaca que, embora permaneça “um padrão de gênero” desfavorável às mulheres nas eleições, “a conjuntura atual reforça o foco da política e de pesquisas em uma agenda de reforma política e de relações entre compromissos partidários e estruturas sociais que influenciam os percursos e trajetórias políticas”.
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Clara Araújo – socióloga e pesquisadora do Departamento de Ciências Sociais da UERJ (21) 2334-0933 [email protected] |