Resistir não é escolha, é sobrevivência, por Nana Soares

01 de setembro, 2016

Quando se é parte de um grupo historicamente marginalizado, seus direitos nunca estão plenamente garantidos. É preciso lutar para assegurar algo que nunca deveria ter sido negado em nenhum momento: o direito ao corpo, ao território, a auto-determinação, a autonomia, a andar livremente pelas ruas, falar seu idioma e amar quem você quiser são alguns dos itens básicos que não vêm no pacote se você é mulher, negr@, indígena, LGBT, pessoa com deficiência e por aí vai.

(O Estado de S. Paulo, 01/09/2016 – acesse no site de origem)

No caso das mulheres, fomos excluídas do espaço público por tanto tempo que querem nos fazer acreditar que só trabalhar, estudar e votar basta e não há mais motivo para lutar. Nossos gritos por uma vida livre de violência e de machismo são minimizados e abafados tanto quanto possível.

Eu gostaria que estivéssemos fazendo mimimi, lutando por coisas que não importam ou não fazem diferença na vida de muita gente. Gostaria mesmo. Mas não estamos. Reivindicamos o básico, o óbvio ululante e que ainda é negado em pequenos atos do cotidiano ou pelo Estado. Há momentos de melhora e de avanço, mas logo depois o retrocesso vem mostrar sua cara de novo. Vem porque nosso movimento incomoda e sempre incomodou. Não é nada confortável ter gente expondo as contradições, opressões e injustiças do cotidiano, especialmente quando acabar com elas o atinge diretamente e te faz abrir mão de alguns de seus privilégios.

Lutar e mudar o mundo é cansativo demais. É frustrante ver que as coisas não avançam no ritmo que deveriam – isso quando não há retrocesso. É frustrante ser rotulada, taxada de chata, arrumar briga com a família no jantar em nome de uma mudança que não sabemos nem se estaremos vivas quando acontecer. A gente apanha tanto (as vezes literalmente) que questiona se vale a pena o esforço, se realmente vai conseguir mudar. A gente vai pra rua desacreditada que ainda precisa lutar pelas coisas que temos que lutar.

Mas por que então nós ainda lutamos e gritamos, afinal?

Porque temos tudo a perder se não fizermos isso.

Também não sei muito bem de onde vem a força, mas sei que, para as mulheres e outros grupos oprimidos, ter coragem não é uma opção. Ou resistimos ou morremos  – de corpo e de alma. Não deveríamos mesmo ter que lutar por coisas tão básicas, mas pior é viver num mundo hostil sem poder ser o que se é. Bem pior.

Saia para o mundo, viva, questione o que for errado. Faça o que gosta, ocupe todos os espaços que você quiser e que com certeza também foram feitos para você. Olhe para o lado, dê a mão para as mulheres a sua volta e revolucione o mundo junto com elas. É difícil, mas o outro lado tem muito mais medo da gente do que a gente deles.

“Você pode me fuzilar com palavras / E me retalhar com seu olhar / Pode me matar com seu ódio / Ainda assim, como ar, vou me levantar” – Maya Angelou em seu poema “Still I Rise” (Ainda assim eu me levanto)

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