(G1, 08/10/2015) Anúncio foi feito na manhã desta quinta (8) em Estocolmo, na Suécia. Escritora e jornalista bielorrussa é a 14ª mulher a receber o prêmio.
A escritora e jornalista bielorrussa Svetlana Alexievich, de 67 anos, foi anunciada na manhã desta quinta-feira (8) vencedora do Nobel de Literatura 2015. Ela é a 14ª mulher a vencer o prêmio. A escolha foi divulgada em um evento na cidade de Estocolmo, na Suécia. Além do título, a escritora ganha 8 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 3,75 milhões).
Segundo o comitê da premiação, Alexievich foi escolhida por sua “obra polifônica, um monumento do sofrimento e da coragem em nosso tempo”. Considerada cronista implacável da União Soviética, ela é uma das raras autoras de não ficção premiadas com o Nobel.
A cerimônia de entrega acontecerá em Estocolmo, no dia 10 de dezembro, aniversário da morte do fundador do prêmio, Alfred Nobel.
Sem títulos publicados no Brasil mas traduzida para o inglês e mais de dez idiomas, como espanhol, francês, alemão e chinês, Svetlana tem como livro mais conhecido “Voices from Chernobyl: The history of a nuclear disaster” (“Vozes de Chernobil: A história oral de um desastre nuclear”), publicado em 1997. Ele levou dez anos para ser escrito e reúne entrevistas com testemunhas da maior catástrofe nuclear da história. A obra chegou a ser proibida em Belarus.
“Acabo de informá-la”, afirmou Sara Danius, secretária da Academia Sueca, ao canal público SVT. “Ela disse apenas uma palavra: Fantástico!”, completou. “É uma grande escritora, que encontrou novos caminhos literários”, disse Danius.
10 anos para escrever um livro
Svetlana sempre recorreu ao mesmo método para seus livros documentais, entrevistando durante muitos anos pessoas com experiências dramáticas: soldados soviéticos que retornaram da guerra no Afeganistão (“Zinky boys: Soviet voices from Afghanistan war”) ou suicidas (“Enchanted with death”).
Em uma entrevista que faz parte de uma coletânea de seus trabalhos publicada nesta quarta-feira (7) na França, Svetlana Alexievich afirma sobre seus textos: “Eu não estou tentando produzir um documento, mas esculpir a imagem de uma época. É por isso que eu levo entre sete e dez anos para escrever cada livro”.
Ainda comenta: “Eu não sou jornalista. Não permaneço no nível da informação, mas exploro a vida das pessoas, sua compreensão da vida. Também não faço o trabalho de um historiador, porque tudo começa, para mim, no ponto de término da tarefa do historiador: o que se passava pela cabeça das pessoas após a batalha de Stalingrado ou após a explosão de Chernobil? Eu não escrevo a história dos fatos, mas a história das almas”.
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Biografia
Vinda de uma família de professores rurais, Svetlana Alexievich nasceu em 31 de maio de 1948 na cidade de Ivano-Frankivsk, na Ucrânia, mas cresceu em Belarus. Estudou jornalismo na Universidade de Minsk entre 1967 e 1972. Após a graduação, trabalhou num jornal local na província de Brest.
Depois ela voltou para Minsk, onde trabalhou na “Sel’skaja Gazeta”, jornal das fazendas coletivas soviéticas. Lá, ela reuniu material para seu primeiro livro “War’s unwomanly face” (1985), baseado em entrevistas com centenas de mulheres que participaram da Segunda Guerra Mundial.
Este trabalho é o primeiro do grande ciclo de livros de Alexievich, “Voices of Utopia”, em que a vida na União Soviética é retratada a partir da perspectiva do indivíduo. Por causa de sua crítica ao regime, Alexievich viveu periodicamente no exterior, na Itália, França, Alemanha e Suécia, entre outros lugares.
Voz das mulheres
Svetlana Alexievich é a 14ª quarta mulher a ganhar o Nobel de Literatura. Antes dela, a mais recente havia sido a autora canadense Alice Munrom, escolhida em 2013.
A proposta do livro de estreia de Svetlana – “War’s unwomanly face” (1985), algo como “A guerra não tem uma face feminina” – era registrar relatos de mulheres que lutaram durante a Segunda Guerra Mundial.
“Tudo o que sabíamos da guerra foi contado pelos homens. Por que as mulheres que suportaram este mundo absolutamente masculino não defenderam sua história, suas palavras e seus sentimentos?”, questionou a escritora certa vez.
Cronista implacável da União Soviética
Svetlana Alexievich retrata o império soviético de Chernobil ao Afeganistão em livros que não são encontrados em seu país. A escritora não perdoa a visão do “homo sovieticus”, incapaz de ser livre.
A obra da escritora é rica em depoimentos ouvidos com paciência ao longo do tempo. O título “O fim do homem vermelho ou a era do desencanto”, um retrato sem concessões mas compassivo do “homo sovieticus”, que saiu mais de 20 anos depois da implosão do império da União Soviética, recebeu em 2013 o prêmio Medicis de ensaio na França.
“Conheço bem aquele ‘homem vermelho’: sou eu, as pessoas que me cercam, meus pais”, explicou Svetlana em uma ocasião. Mais tarde, completou: “Não desapareceu. E o adeus será muito demorado”.
Por este motivo, a escritora diz que tem muito respeito pelos ucranianos que, com seus protestos, expulsaram do poder o ex-presidente pró-Rússia Viktor Yanukovich em 2014.
“Hoje o modelo para todos é a Ucrânia. Seu desejo de romper por completo com o passado é digno de respeito”, opinou a vencedora do Nobel sobre o país devastado pelo conflito entre separatistas pró-Rússia e as forças ucranianas.
“Penso que o império ainda não desapareceu. E, pessoalmente, tenho a inquietante impressão de que não desaparecerá sem derramamento de sangue.”
Censurada
Svetlana Alexievich já foi acusada de “romper a imagem heroica da mulher soviética”. Seu primeiro livro, “War’s unwomanly face”, teve de esperar pela Perestroika, a reforma do sistema aplicada por Mikhail Gorbachev, para ser publicado. Com a obra, alcançou fama em toda a União Soviética e no exterior.
“Vivemos entre carrascos e vítimas, os carrascos são difíceis de encontrar. As vítimas são nossa sociedade, e são muito numerosas”, declarou Alexievich em entrevista à agência de AFP.
Outro livro que rendeu polêmica foi “Vozes de Chernobyl: A história oral de um desastre nuclear” (1997). Belarus – presidida por Alexander Lukashenko desde 1994, um dos países mais afetados pelas consequências de Chernobyl, onde o tema continua sendo tabu – proibiu o livro. Segundo a vencedora do Nobel, sua obra “não agrada” o presidente.
“Vivemos sob uma ditadura, há opositores na prisão, a sociedade tem medo e, ao mesmo tempo, é uma vulgar sociedade de consumo. As pessoas não se interessam pela política. É um período difícil”, resumiu a escritora à AFP em 2013.
Os intelectuais bielorrussos também não parecem apreciar as opiniões de Svetlana, que reivindica a “cultura russa” da qual eles desejam distinguir-se e, ao mesmo tempo, passa a maior parte do tempo na Europa ocidental. Sua obra acaba por provocar uma mescla de atração e repulsa no país.
Não ficção
O Nobel para Svetlana Alexievich representa uma exceção porque é bastante incomum a Academia Sueca premiar um autor que escreva, predominantemente, não ficção. O prêmio é entregue desde 1901.
Antes da bielorrussa, raros exemplos de escritores do gênero a levar o Nobel foram Theodor Mommsen (1902), Bertrand Russell (1950), Winston Churchill (1953) e Jean-Paul Sartre (1964). O francês também escreveu romances, peças de teatro e crítica literária, mas foi reconhecido sobretudo por sua atuação como filósofo.
Outro vencedor do Nobel que, apesar de ter escrito ficção, se destacou com ensaios e memórias foi Elias Canetti (1981).
Abaixo, veja os vencedores do Nobel de Literatura dos últimos anos:
2014: Patrick Modiano (França)
2013: Alice Munro (Canadá)
2012: Mo Yan (China)
2011: Tomas Tranströmer (Suécia)
2010: Mario Vargas Llosa (Peru)
2009: Herta Müller (Romênia)
2008: Jean-Marie Gustave Le Clézio (França)
2007: Doris Lessing (Reino Unido)
2006: Orhan Pamuk (Turquia)
2005: Harold Pinter (Reino Unido)
2004: Elfriede Jelinek (Áustria)
2003: J. M. Coetzee (África do Sul)
Veja a lista das mulheres que já receberam o Nobel de Literatura:
2015: Svetlana Alexievich (Ucrânia)
2013: Alice Munro (Canadá)
2009: Herta Müller (Alemanha)
2007: Doris Lessing (Grã-Bretanha)
2004: Elfriede Jelinek (Áustria)
1996: Wislawa Szymborska (Polônia)
1993: Toni Morrison (EUA)
1991: Nadine Gordimer (África do Sul)
1966: Nelly Sachs (Suécia)
1945: Gabriela Mistral (Chile)
1938: Pearl Buck (EUA)
1928: Sigrid Undset (Noruega)
1926: Grazia Deledda (Itália)
1909: Selma Lagerlöf (Suécia)
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