Interlocuções entre ecofeminismo, trabalho de cuidado e tributação, por Melissa Demari e Tatiana Aguiar

28 de julho, 2025 Jota Por Melissa Demari e Tatiana Aguiar

Para atingir justiça ambiental de gênero, é necessário eliminar estrutura econômica baseada na divisão sexual do trabalho

O trabalho de cuidado constitui-se na realização das tarefas associadas à criação de condições para a sobrevivência humana e em sociedade e à manutenção do sistema capitalista. Tendo por base tal pressuposto, o presente artigo pretende analisar se o desempenho destas funções pode ser afetado pela crise ambiental, e se, em havendo alguma relação entre um e a outra, pode a tributação impactá-la positiva ou negativamente.

As funções de cuidado são historicamente atribuídas às mulheres, validando sua existência perante a sociedade, mediante o custo de prejuízos financeiros e socioemocionais. Ademais, dão sustentação ao desenvolvimento do capitalismo, pois liberam os trabalhadores para vender sua força de trabalho, criando condições para produção de capital, acumulação de riqueza, circulação de bens e renda, consumo etc.

Dados estatísticos apontam que mulheres e meninas dedicam por volta de 2,5 vezes mais horas por dia ao trabalho de cuidado não remunerado do que os homens, representando dois terços das pessoas que trabalham nesse setor. Se a atividade de cuidado fosse remunerada, ela ultrapassaria 40% do PIB em certos países. Essa disparidade afeta o conquista/obtenção dos direitos e oportunidades de mulheres e meninas e impacta o alcance do desenvolvimento sustentável. Cerca de 80% do trabalho doméstico pago no mundo são do sexo feminino.

Silvia Federici aponta que a conquista do trabalho produtivo pela mulher não a libertou do reprodutivo e das funções correlatas, gerando, inclusive uma certa penalização em razão desta acumulação. No que interessa à análise proposta, a interlocução entre o trabalho de cuidado e o meio ambiente foi pensada pelo ecofeminismo, para o qual o controle das mulheres e a dominação da natureza têm a mesma matriz: a cultura patriarcal de dominação, exploração e hierarquização, que subjuga corpos e meio ambiente em prol da acumulação de capital e da manutenção do poder masculino.

A consolidação desse movimento ocorreu na segunda onda do feminismo, com preocupações relativas à preservação do meio ambiente, a partir de reflexões acerca dos direitos reprodutivos, superpopulação e expansão industrial, e sob a perspectiva dos direitos das mulheres. Sob a perspectiva ecofeminista, as mulheres são mais afetadas pela crise ambiental, especialmente em razão do trabalho de cuidado que desempenham.

O uso de agrotóxicos, por exemplo, causa inúmeros danos ao meio ambiente, bem como danos comprovados à saúde. Ao considerar que as mulheres respondem essencialmente pelo cuidado dos enfermos e que são responsáveis pela administração dos recursos domésticos como garantidoras da comida e da água potável, a escassez desses recursos faz com que elas precisem assistir as vítimas de acidentes ambientais, além de serem obrigadas a se deslocarem ainda mais para acessá-los. Ainda, a ONU aponta que, estatisticamente, a violência de gênero também aumenta em casos de crises climáticas.

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