Em 2015, apenas 73,7 % das mulheres na faixa dos 25 aos 54 anos, estavam na força de trabalho,nos EUA
(Folha de S.Paulo, 31/01/2017 – acesse no site de origem)
A explicação comum que se dá ao motivo pelo qual muitos homens – até mesmo nos anos mais produtivos de sua atividade econômica – saem da força de trabalho não se aplica a Krystin Stevenson.
Aos 31 anos, dois filhos, ela não desdenha os empregos considerados trabalhos para mulheres. Ela não foi engolida pelo fogo incontrolável do vício da droga, não teve problemas com a lei e nem foi excluída por causa de um acidente depois de levantar pesos durante anos na indústria ou na construção.
Ao contrário, ela desistiu do emprego de US$ 40 mil ao ano como representante de serviços ao consumidor numa companhia imobiliária, no verão de 2015, quando sua frágil rede de apoio deixou de existir. Sua mãe, que cuidava de doentes em tampo parcial, tomava conta de crianças, buscando as maiorzinhas na escola à tarde, a certa altura sofreu um derrame, e passou a precisar de ajuda. Por isso, Krystin teve de ajudar a mãe idosa e cuidar dos pequenos.
“Acabei deixando o emprego”, disse Krystin, que mora nos arrabaldes de Denver. “Tentei trabalhar e ajudá-la ao mesmo tempo, mas o emprego não era flexível”.
Krystin faz parte da crescente porcentagens de americanas que não estão empregadas e nem procuram trabalho – uma tendência persistente em meio à profunda insatisfação e ansiedade em relação ao futuro da economia que contribuiu para catapultar Donald J. Trump para a Casa Branca.
A parcela de mulheres entre os 25 e os 54 anos que levavam um salário para casa aumentou no final da Segunda Guerra Mundial e foi crescendo nos anos 70 e 80, antes de chegar ao pico em 1999, alcançando os 77%. Contrariamente às expectativas, começou a baixar no início dos anos 2000, e depois despencou durante a recessão.
Mais de sete anos desde o início da recuperação, não retrocedeu. Em 2015, apenas 73,7 % das mulheres na faixa dos 25 aos 54 anos, estavam na força de trabalho.
A redução entre os homens começou mais cedo, nos anos 60, e acelerou na grande recessão, porque as indústrias que tradicionalmente pagavam bem, a mineração e os empregos na construção civil desapareceram. Cerca de um entre 10 homens na mesma faixa etária das mulheres não se encontra na força de trabalho.
Evidentemente, mulheres que pararam de trabalhar não estão tão carregadas de responsabilidades quanto muitos homens. É muito menos provável que elas tenham antecedentes criminais ou uma deficiência física. Um número maior delas tem diploma de curso superior, e muitos dos setores nos quais elas tradicionalmente predominavam – empregos em serviços menos bem pagos – estão crescendo em comparação às ocupações de classe média, em que os homens predominam. Tampouco elas passam as horas em que não estão ocupadas jogando vídeo games, o que, segundo suspeitam alguns economistas, contribui para distrair os homens do relógio.
Mas as mulheres ainda são as cuidadoras fundamentais. de crianças, dos pais idosos e de parentes doentes.
“Cuidar das crianças é a sua ocupação principal”, disse Krystin, explicando por que motivo ela ainda não tinha voltado a trabalhar.
É raro todos os homens que deixam o emprego dizerem que é porque estão ajudando a tomar conta dos filhos ou de outro membro da família, afirma Nicholas Eberstadt, economista do American Enterprise Institute, conservador.
O que ele chama de “fosso” em termos da ajuda prestada à família parece explicar a forte discrepância entre as mulheres que trabalham nos Estados Unidos e em outros países industrializados avançados com políticas abrangentes de apoio à família. Na maioria das nações europeias, por exemplo, a participação da força de trabalho feminina aumentou consideravelmente desde 2000 em lugar de baixar.
“Sempre pensei que as mulheres lutassem por causa da falta de licença maternidade paga e pelo problema do cuidado dos filhos”, disse Heidi Hartmann, presidente do Institute for Women’s Policy Research. Como achavam muito complicado trabalhar, ela afirmou, “decidiam sair”.
Embora os homens predominem na lista dos inválidos, seus problemas de saúde produzem um efeito dominó nas mulheres da família. São elas que então passam a tomar conta dos maridos, dirigindo ou acompanhando-os às consultas médicas e às sessões de terapia que podem absorver um dia inteiro.
Os salários mais baixos pagos às mulheres e as responsabilidades familiares sempre fizeram com que elas se empregassem e tivessem de deixar sucessivamente o emprego – entrando e saindo da força de trabalho – com muito mais frequência do que os homens. Um filho doente ou uma emergência familiar pode tirar rapidamente uma pessoa do emprego.
Além disso, como os salários, particularmente os mais baixos, estagnaram, trabalhar não chega a representar uma grande recompensa. Mulheres que concluíram sua instrução depois de tirar com o diploma de segundo grau, ou mesmo antes, saíram da força de trabalho em proporções até maiores do que seus colegas homens, entre 2000 e 2015, afirma um relatório do Bureau of Labor Statistics.
Mas o que mudou consideravelmente é o padrão de comportamento dos homens em relação ao trabalho, que está cada vez mais se equiparando ao das mulheres, porque eles também começaram a entrar e sair regularmente do emprego depois de alguns meses. A estabilidade e a segurança são mais inatingíveis.
Embora a parcela de mulheres entre os 25 e os 54 anos que estão na força de trabalho por um certo período de tempo tenha permanecido consideravelmente firme ao longo dos anos (em 18%), no caso dos homens ela quase dobrou nos últimos 40 anos para 11,8%, segundo a nova pesquisa de John Coglianese, no curso de doutorado em Harvard.
Na opinião de alguns analistas, o foco específico nos homens que se mantêm fora do mercado de trabalho sem uma avaliação mais profunda das mulheres colocou uma atenção exagerada nos problemas dos trabalhadores em potencial em lugar da qualidade do trabalho em si
Eles afirmam que a combinação da falta de mulheres e do crescimento relativamente baixo dos salários apontam para uma economia frágil, como causa básica, e não o forte consumo de analgésicos ou de vídeogames.
“Tenho a certeza de que a qualidade do emprego em si é uma parte da história”, disse David Madland, assessor sênior do American Worker Project do Centro por American Progress, entidade liberal. “É preciso que valha a pena para a pessoa”.
Tanto os homens quanto as mulheres se queixam de não serem capazes de encontrar empregos em tempo integral, seguros, que pagam salários de classe média. Krystin Stevenson, por exemplo, precisa resolver o problema do cuidado das crianças, mas, assim como muitos homens, ela também não quer qualquer emprego.
“Eu sou bacharel em relações públicas, por isso não quero trabalhar no McDonald’s ”, ela disse.
Patricia Cohen