A dinâmica dos feminicídios no Brasil: possibilidades e desafios, por Duília Dalyana Ribeiro

03 de setembro, 2025 Jota Por Duília Dalyana Ribeiro

Legislação brasileira progrediu, mas país enfrenta persistência da violência de gênero

O feminicídio constitui um problema universal e uma das expressões mais graves da violência de gênero. Em 2023, cerca de 51,1 mil mulheres e meninas foram mortas por parceiros íntimos ou membros da própria família no mundo, colocando o Brasil na quinta posição do ranking global. Apesar desse quadro alarmante, avanços normativos têm sinalizado um processo gradual de transformação institucional.

Em 2025, por exemplo, completam-se 10 anos da promulgação da Lei 13.104/2015, que tipificou o feminicídio como homicídio qualificado e crime hediondo, posteriormente alterado pela Lei 14.994/2024, que elevou o feminicídio a tipo penal autônomo, dentre outros efeitos, aumentando a pena de 20 a 40 anos de reclusão.

Essa mudança legislativa, entretanto, ocorreu apenas em outubro de 2024. Por esse motivo, e considerando que os órgãos de segurança pública ainda estão em fase de adaptação aos novos parâmetros de registro, o anuário manteve, metodologicamente, a contabilização dos feminicídios dentro da categoria mais ampla de homicídios femininos. Essa decisão permite a comparabilidade histórica e evita a subnotificação de casos já classificados sob a legislação anterior.

Os dados de 2024 evidenciam a persistência da violência de gênero: foram registradas 8.957 tentativas de homicídio contra mulheres. São Paulo lidera em números absolutos de homicídios femininos (421), seguido por Bahia (388) e Minas Gerais (347).

Quando analisados apenas os feminicídios, São Paulo também ocupa a primeira posição (253), seguido de Minas Gerais (163) e Paraná (109). Em estados como Distrito Federal (65,7%), Acre (61,5%) e Santa Catarina (61,4%), mais da metade dos homicídios de mulheres foram motivados por razões de gênero, revelando que a violência letal contra mulheres está profundamente enraizada em dinâmicas relacionais e culturais.

Nos últimos quatro anos, observa-se um fenômeno paradoxal: enquanto os homicídios femininos apresentaram queda em estados como Amapá (–54,1%) e Sergipe (–41,3%), os feminicídios aumentaram de forma expressiva em outros estados, como Paraná (33,7%), Piauí (42,4%) e Maranhão (37,8%). Esses números sugerem não apenas o avanço do reconhecimento e registro do feminicídio, mas também a persistência e até a intensificação de relações sociais marcadas por desigualdades de gênero que se manifestam no espaço privado.

Essa especificidade é evidente ao se observar o local dos crimes: 64,3% dos feminicídios ocorreram dentro da residência da vítima, frequentemente cometidos por companheiros ou ex-companheiros, enquanto apenas 15,6% dos homicídios de homens ocorreram em ambiente doméstico (Anuário, 2025). Como argumentam Arendt (2020) e Bourdieu (2002), o espaço privado, permanece um território de desigualdade e dominação, onde a violência masculina opera como mecanismo de controle e reafirmação de autoridade.

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