Transexuais enfrentam preconceito e longa espera para troca de identidade

20 de outubro, 2016

Espera por mudança nos documentos pode chegar a cinco anos. Falta de legislação específica dificulta andamento dos processos.

(G1, 20/10/2016 – acesse no site de origem)

Cinco anos, cinco meses, e 12 dias. No Rio de Janeiro, esse é o tempo que pessoas transexuais chegam a esperar para ter reconhecidos, legalmente, o nome e o gênero com o qual se identificam. O processo é permeado por dificuldades e uma longa espera, e leva, em média, quase dois anos.

De acordo com um levantamento do Núcleo de Defesa dos Direitos Homoafetivos, das 170 ações que chegaram às varas de família e de registro público do município entre dezembro de 2010 e junho de 2016, apenas 69 casos tiveram uma sentença proferida pela Justiça do Rio, cerca de 40,6% do total.

Ainda segundo o levantamento, noticiado pelo jornal “O Dia”, mesmo entre as 69 pessoas que já tiveram uma resposta, a situação é diferente da desejada: 47 conseguiram a alteração total, do nome e do sexo na certidão. Outros 17 processos foram julgados procedentes em partes, o que quer dizer que houve a alteração do nome usado nos documentos, mas não do sexo.

Além disso, 35 das sentenças determinaram a inclusão da informação de que a alteração do nome ou do sexo ocorreu por decisão judicial. Ou seja, os novos documentos acabam informando que a mudança ocorreu, o que é considerado um desconforto para os transexuais.

Johi espera há mais de um ano para o processo que trocará seu nome e identidade (Foto: Arquivo Pessoal)

Johi espera há mais de um ano para o processo que trocará seu nome e identidade (Foto: Arquivo Pessoal)

 

Constrangimento cotidiano

Desde agosto de 2015, Johi Farias espera pelo processo de requalificação cível, que irá mudar seu nome e sexo em  documentos oficiais. O bartender de 24 anos relata que o caminho está sendo difícil.

“Passei por muitos psicólogos e assistentes sociais para conseguir dar entrada no processo. Mesmo nos lugares onde temos algum ‘documento’ com o nome social, como o cartão do SUS (Sistema Único de Saúde) por  exemplo, para usar em hospitais, ainda assim, pedem identidade e desconsideram o nome social que está cadastrado no cartão”, conta ele.

Para o morador de Duque de Caxias, na Baixada, a nova identidade representa um recomeço. “Essa mudança irá me incluir no mercado de trabalho, na escola, em tudo. Eu não posso ter uma conta no banco, não posso entrar em boates, não posso fazer um curso, nem mesmo votar sem passar pelo constrangimento de apresentar o RG e passar pela transfobia”, afirma.

Bárbara Aires, estudante de 25 anos que há 13 socializa como mulher, deu entrada recentemente com a documentação para sua mudança de identidade. Ela lamenta a demora e as decisões que decidem pela troca de nome, mas não pela de sexo.

“Já ouvi casos de meninas que conseguiram o nome, mas não a mudança de sexo e o juiz disse que depois da operação de redesignação sexual elas conseguiriam. Não adianta, né, você fica com o mesmo constrangimento no final”, diz ela.

Preconceito e legislação atrapalham processo

A professora de Direito de família Giowana Cabrone é transexual e, há três anos, teve seu sexo e nome alterados legalmente. Hoje, ela, advogada, ajuda outras pessoas que estão passando pelo processo de requalificação. Atualmente, por meio de um projeto em uma faculdade, ela toca 18 processos.

“A grande dificuldade é que não existe legislação específica para isso, isso depende do processo judicial, a gente pega uma brecha na lei. Por não existir uma legislação, vai do entendimento do juiz, do Ministério Público”, opina.

“Além disso, é claro que existe preconceito. O preconceito é estrutural, existe em toda a sociedade, não é porque a pessoa é juiza ou advogada que você vai esperar que ela esteja livre de preconceitos”, diz.

Nome social valendo

Desde quinta-feira (13), a Coordenadoria Especial da Diversidade Sexual (CEDS) e a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) lançaram a campanha “Nome social: Um direito do cidadão e cidadã”, para divulgar o direito ao uso do nome social por travestis e transexuais em todos os órgãos municipais.

Elisa de Souza; Sob supervisão de João Ricardo Gonçalves

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