Embaixador João Carlos Souza-Gomes, 69, tem histórico de acusações
(Folha de S.Paulo, 05/03/2018 – acesse no site de origem)
O embaixador João Carlos de Souza-Gomes, 69, acusado de assédio sexual e moral por vários funcionários e alvo de processo disciplinar, poderá reassumir seu cargo no dia 9 de março.
Souza-Gomes, chefe da delegação do Brasil junto à FAO (braço da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), em Roma, foi afastado preventivamente para evitar que houvesse constrangimento das testemunhas que o acusavam de assédio sexual e moral.
Reintegrado ao cargo, voltará a chefiar algumas das pessoas que o denunciaram. Ele assistiu aos depoimentos das testemunhas, então sabe quem o denunciou.
A investigação das denúncias foi iniciada no dia 9 de novembro. Segundo relatos, ele frequentemente saía do banheiro com as calças abaixadas ou a braguilha aberta. E fazia piadas: “Você viu, né? Você gostou, né?”.
Uma subordinada relatou que o diplomata exigia que ela o ajudasse a se vestir: a funcionária tinha de se ajoelhar, colocar as meias nele, abotoar suas calças e fechar sua camisa. Ele também é acusado de se referir a subordinados usando termos racistas e discriminatórios.
O prazo para conclusão da investigação acaba no dia 8 de março, mas o inquérito corre lentamente, e a comissão disciplinar nem acabou de ouvir as testemunhas.
O embaixador foi afastado por 60 dias, prorrogados por mais 60, que vencem no dia 8 de março. Com isso, pode ser reintegrado ao cargo no dia 9 de março.
A investigação atrasou porque, no meio do processo disciplinar, o embaixador tirou férias e licença médica. Como ele tem o direito de participar das oitivas das testemunhas, o processo ficou paralisado.
Durante esse período, o diplomata continuou recebendo vencimentos integrais e teve o aluguel da residência oficial em Roma (cerca de R$ 50 mil) pago. O salário bruto do embaixador é de US$ 14.120 (R$ 45 mil), menos o chamado “abate teto”, de R$ 9.100.
Em ofício, o presidente do Sinditamaraty, Ernando Neves, afirmou estar preocupado com o andamento da apuração das denúncias.
“Com o término do afastamento preventivo do servidor, previsto para dia 8 de março, os servidores e auxiliares (da embaixada) têm procurado o Sinditamaraty para manifestar inquietação com relação a seu ambiente de trabalho, permeado de pressões, dúvidas e medo”, escreveu Neves.
Pablo Paiva, advogado do embaixador, confirmou que o diplomata deve voltar a suas funções nesta semana. “O motivo para o afastamento preventivo, evitar constrangimento de testemunhas, não existe mais, porque elas já foram ouvidas”, diz.
Segundo ele, não há porque prorrogar o afastamento. “Essas denúncias foram deflagradas depois que o embaixador passou a pedir averiguações sobre irregularidades cometidas no posto.”
Após todas as testemunhas deporem, o acusado será ouvido. Depois, a comissão analisará o caso. Caso seja considerado culpado, a pena varia de uma advertência até demissão.
“Nenhuma denúncia contra o embaixador foi comprovada, confiamos na imparcialidade da comissão e arquivamento da denúncia por falta de provas”, diz Paiva.
Ao longo de 44 anos de carreira diplomática, Souza-Gomes chefiou as embaixadas do Brasil na Venezuela e no Uruguai, e a missão junto à Unesco, em Paris.
Em 2011, após acusações de que Souza-Gomes assediou moralmente outro diplomata, um corregedor foi mandado a Montevidéu para adverti-lo de que o comportamento era inaceitável. O embaixador, porém, foi mantido no posto.
O Itamaraty não quis se pronunciar.
Patrícia Campos Mello