(Profissão Repórter, 27/07/2016) Cinquenta e quatro por cento das vítimas são meninas entre 4 e 11 anos. A pedofilia é uma doença sem cura, mas há tratamento para os sintomas.
Denúncia
A prisão de Fernando Caetano dos Santos aconteceu após uma série de denúncias. A delegada decretou a prisão temporária dele depois de ouvir o depoimento de uma jovem de 23 anos de idade. Ela conta ter sido abusada durante nove anos quando tinha aulas de informática na casa do suspeito.
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Quatro vítimas, que foram à delegacia, disseram que a mulher do homem acusado de pedofilia sempre estava em casa durante os abusos. O casal usava códigos, como acender uma luz ou tocar uma campainha, para determinar quando a esposa podia ou não entrar no quarto onde aconteciam os abusos.
Na internet, o acusado mostra fotos com crianças e adolescentes no quarto onde ficava o computador. A jovem que fez a denúncia aparece em várias delas, quando ainda era menor de idade. “Ela começou a ter aula lá a partir dos oito anos, ela e alguns amigos. A partir dos 10 anos ele começou a molestar, a manipular a vagina, apertar os peitos, tudo por cima da roupa. Não houve penetração, mas chegaram até a efetuar sexo oral, ele solicitava, e isso foi durante anos. Ela foi abusada dos 10 aos 19. Fora isso vieram também mais dois meninos, que na época começaram junto com ela, mesma faixa etária. O abuso começou com 10, mas com os meninos foi até os 14 anos. A esposa ficou muito surpresa, ela não esperava”, conta a delegada Giovanna Valenti Clemente.
Em média 50 crianças foram abusadas por dia no Brasil, no ano passado. Cinquenta e quatro por cento das vítimas eram meninas entre quatro e 11 anos de idade. Este número é só das denúncias que chegaram pelo Disque 100, para denúncias de abuso sexual.
Traumas
Os presos condenados por abuso sexual de crianças são separados de outros presos em um único pavilhão. A divisão é feita para garantir a segurança dos detentos.
Um deles foi condenado a 21 anos de prisão, mas só começou a cumprir a pena quase dez anos depois do crime. No dia em que a família descobriu tudo, ele fugiu. Durante o tempo em que ficou foragido, ele adotou um nome falso e se casou.
A ex-mulher procurou o Conselho Tutelar depois que o filho mais novo do casal denunciou agressões cometidas pelo pai. “Fomos ao hospital, onde foi constatado o estupro da mais velha. Isso fazia três anos que ocorria”, conta ela. O ex-marido ameaçava a enteada com um facão. Os estupros começaram a acontecer quando a menina tinha oito anos.
Essa violência praticada por quem deveria cuidar tem consequências graves ainda hoje, onze anos depois. “Há quem diga que meus relacionamentos não duram por eu ter medo de seguir em frente. Eu acredito que seja, por eu ser conservadora com relação ao ato sexual em si. Confiar nas pessoas é mais difícil e se eu vejo que um homem está olhando para uma criança diferente, já acho que aquele cara é pedófilo. Eu tenho muito ódio, lembro do que eu passei e eu fico bem triste”, conta a vítima.
Doença
O hábito criminoso de assistir na internet vídeos pornográficos com crianças fez um homem ficar um ano na cadeia. Depois que saiu da prisão, ele procurou ajuda médica e recebeu o diagnóstico de pedofilia. “Quando saí da prisão, foi a parte mais difícil. Foi um dos momentos mais difíceis da minha vida. Voltar ao convívio na sociedade foi muito difícil. Eu me sinto muito mal, me sinto com muita culpa. Eu sinto muita culpa. Eu não gosto de ser o que eu sou. Eu não gostaria”, diz o homem, que está em tratamento há três anos.
O Ambulatório de Transtorno da Sexualidade, na Faculdade de Medicina do ABC, é um ambulatório de referência, que trata essas pessoas desde 2003. O local recebe uma média de 50 pacientes por mês, 30 diagnosticados como portadores de pedofilia. Todos são atendidos de graça.
Quem coordena a equipe do ambulatório é o psiquiatra Danilo Baltieri. “A pedofilia é uma doença devastadora, não vai resolver a pena de prisão apenas, não vai resolver. Nenhum de nós, especialistas do tema, e eu tenho falado isso de forma reiterada, nenhum de nós é contra a pena de prisão, muito pelo contrário, se a lei existe ela tem que ser cumprida. O fato delas não terem tratamento, mesmo depois de presas, pode contribuir para que elas saiam de lá e continuem atuando contra crianças”, explica o psiquiatra.
Um estudo feito nos presídios de São Paulo mostrou que a maior parte dos agressores sexuais não têm o transtorno conhecido como pedofilia. “Nem todo indivíduo que porta pedofilia comete uma ofensa sexual, uma agressão sexual, um abuso sexual a uma criança. Nem todo indivíduo que ofende sexualmente uma criança, que abusa sexualmente de uma criança, é portador da pedofilia. A pedofilia é um transtorno que faz a pessoa fantasiar, ter o desejo por crianças. Antes mesmo dele molestar alguém, abusar. Para receber o diagnóstico dessa doença ele não precisa ter atacado a criança. Ela é considerada incurável, o que os médicos tentam fazer é com esses medicamentos diminuir os sintomas. São medicações que podem controlar o impulso sexualmente desviado dessas pessoas. Desde antidepressivos até medicações que controlam e estabilizam humor até medicações que tem ação antagonista sobre a testosterona”, explica o psiquiatra Danilo Baltieri.
Acesse no site de origem: Disque 100 recebe 50 denúncias de abuso sexual de crianças por dia (Profissão Repórter, 27/07/2016)