A violência contra mulher segue sendo um grave problema nacional. Estupros, violência física e moral, assédios de toda ordem são fatos que seguem presentes no cotidiano das mulheres brasileiras e os seus efeitos espalham-se em vários campos da vida social sem que haja sobre o tema uma comoção correspondente à gravidade dos fatos. Nas últimas semanas, foram as universidades que serviram de espaço para diferentes manifestações desta violência.
(Justificando, 25/11/2016 – acesse no site de origem)
Os ataques misóginos contra Sinara Gumieri, advogada e militante feminista, após uma palestra sobre gênero proferida na Universidade Federal de Rondônia (UNIR); a história da estudante de biologia da Universidade de Brasília, Louise Ribeiro, morta dentro do campus em março deste ano por um ex-companheiro e também aluno da instituição, ou ainda a tragédia envolvendo a jovem Ariadne Wojcik, ex-estudante Direito da UnB, que suicidou no dia 09 de novembro após declarar ter sido assediada por um professor são apenas exemplos de como tem sido difícil para as mulheres viver no espaço acadêmico em meio as tantas formas de agressão.
As respostas públicas aos episódios seguem uma mesma tônica geral. Fala-se sobre “apurar e punir os responsáveis”, sobre a necessidade de que fatos como estes não se repitam, mas, por outro lado, deixa-se escapar que somos nós – os homens – que autorizamos e nos beneficiamos desta realidade de violência.
Trata-se de uma incapacidade de pensar gênero como uma relação que faz com que todos nós – inclusive homens supostamente progressistas – sigamos acionando um forte sentido de autoproteção em que parece que não é conosco que está se falando.
As mulheres têm reagido e buscado formas de auto-organização e de denúncia pública da violência. No caso das Universidades, especificamente, as estudantes de direito da UnB paralisaram por um dia as suas atividades para falar sobre o problema e organizar a luta política por direitos; em Rondônia, uma forte articulação de mulheres garantiu o afastamento do professor que atacou a pesquisadora Sinara e, em vários outros espaços, crescem as ações de mulheres para debater a violência e buscar formas de superação. No entanto, nós homens seguimos – por nossa própria vontade – fora da equação como se nada tivéssemos a ver com o problema.
Não há posição neutra diante da violência. É preciso dizer com clareza que a ação dos homens é que tem sido decisiva para autorizar a violência contra mulher. A piada perversa na mesa do bar, a foto da companheira nua exposta como um troféu aos amigos, a repetição violenta de frases jocosas dirigidas às mulheres que se colocam no espaço da produção acadêmica são formas pelas quais nos inserimos nesta lógica da violência e da reprodução acrítica dos privilégios.
Não basta não bater na namorada, não ter crises públicas de ciúmes ou mesmo não agredir verbalmente as mulheres, estas são as condutas elementares. Mas, é preciso bem mais que isso para superar a violência contra mulher. O retardo de um pronunciamento masculino sobre estes casos (retardo meu inclusive) é sinal de como nós estamos efetivamente envolvidos por numa masculinidade violenta e opressiva e quanto a nosso compromisso está implicado à manutenção dos nossos lugares e vantagens sociais.
Sem dúvida, a luta pelo fim da violência contra as mulheres é longa e feita de muitas estratégias, mas, é óbvio que a postura conivente dos homens é parte da dimensão mais perversa de toda esta realidade.
Felipe da Silva Freitas é doutorando em direito pela Universidade de Brasília (UnB) e pesquisador do Grupo de Pesquisa em Criminologia da Universidade Estadual de Feira de Santana (GPCRIM UEFS).